DE FISHERMAN’S WHARF A ALCATRAZ. São Francisco possui uma extensa orla marítima composta por diferentes sectores que, por si mesmos, poderão ocupar dias inteiros de visita. 1. Fisherman’s Wharf. É o melhor local para contemplar a baía de São Francisco e também para saborear os pratos de peixe fresco e caranguejo. 2. Alcatraz. Da doca 33 de Fisherman’s Wharf, um navio conduz os visitantes em 15 minutos até esta famosa ilha e antiga prisão. Transformada em museu, permite agora passeios pelas celas de presos célebres como Al Capone. 3. Ponte Golden Gate. O centro de visitantes encontra-se no lado sul, mas goza-se melhor perspectiva a partir da margem norte, no miradouro H. Dana Bowers, também conhecido como Vista Point.
Esta bonita urbe também é abençoada pela natureza. Cercada por 43 colinas, São Francisco estende-se ao longo de uma das baías mais esplendorosas do mundo. É possível imaginar o alvoroço da expedição espanhola na segunda metade do século XVIII ao descobrir o abrigo perfeito para abastecer os navios que regressavam de Manila. E, sobretudo, a emoção dos missionários franciscanos que estabeleceram aqui a sua base a norte da Califórnia, a Missão Dolores.
Oceano agreste, missões evangélicas, ruas vertiginosas, presídios e janelas indiscretas: a urbe nortenha da Califórnia, assim como a rota de Monterrey e Big South, estão imortalizados em imagens de filmes. Dos clássicos de Hitchcock até A Fúria da Razão, o cinema retratou-a de forma diferente de Los Angeles. Artistas e escritores imaginaram-na tanto quanto a viveram. São Francisco trai pelo seu ar de impermanência, de fuga. Descobre-se a cidade nas páginas de Kerouac e Jack London e nas diferentes séries de televisão, como Full House. Dir-se-ia que o mistério da felicidade se esconde nas fachadas de cor pastel e nas ruas íngremes em cujas bermas descansam grandes descapotáveis.
Naturalmente, ao desbravar-se a cidade, percebe-se que aqui tanto se pode ser feliz ou desgraçado como em qualquer outro sítio do mundo. À chegada, porém, a cidade recebe com a promessa de um mundo fascinante. A sua fisionomia entra olhos dentro.
O seu ponto mais alto é agora a nova Torre Salesforce (326m), mas da clássica Coit Tower, rodeada de murais na base, tem-se um deslumbrante panorama da baía e das colinas.
A bordo do ferry de Alcatraz, a cidade ganha uma dimensão mítica. Poucas aglomerações urbanas dão tamanha sensação de liberdade aos seus habitantes. Cada bairro tem a sua atmosfera particular: o passado beatnik e hippie em North Beach e Haight-Ashbury, o mundo gay de Castro, o tecnológico de SoMa e o antigo gueto, hoje bairro da moda e tapete de culturas, o Mission.
O ESPÍRITO INOVADOR DA CALIFÓRNIA. Chamam-lhe a cidade das 43 pontes, dos hippies e da revolução sexual, da geração beat e dos eléctricos, mas São Francisco não pode ser resumida a um único estereótipo ou apenas numa frase. Capaz de acolher, integrar e criar tendências artísticas e chamar a atenção, esta cidade californiana funciona como um caleidoscópio que intensifica as sensações de quem chega disposto a deixar-se seduzir. Andar de eléctrico, perder uma tarde na livraria City Lights, passear pelo Jardim Japonês, admirar os murais do bairro The Mission, deixar-se fascinar pelas obras do MoMA... Não há um dia nem uma noite iguais porque, quando o Sol se põe, São Francisco desperta novamente. Do jantar na colorida Chinatown às provas de caranguejos em Fisherman’s Wharf ou aos concertos no auditório The Warfield, as opções multiplicam-se.
Em Prisioneiro do Passado, Humphrey Bogart, após uma cirurgia plástica, sai para a rua com uma cara nova e vê outra cidade. Ao regressarem a São Francisco, muitos viajantes também descobrem que a cidade mudou. Regressa-se, afinal, a uma das cidades ligadas ao mundo do crime, lar de Dashiel Hammet, o detective e autor de romances inesquecíveis como O Falcão Maltês. E, no fundo, prossegue-se a busca do reflexo do céu nos olhos de Lauren Bacall.
A personagem protagonizada por Bogart já não reconhece as cores das lojas de Chinatown, a silhueta oxidada da ponte suspensa, o bairro adormecido de Presídio onde vive Lauren e local preferido de muitos para pernoitar na cidade.
No entanto, o essencial continua aqui: o nevoeiro suspenso da ponte Golden Gate, o milagre permanente de certos bairros, a fragrância dos bolos acabados de sair do forno competindo com o novo cheiro a enxofre que impregna alguns bairros. Ao caminhar junto da fileira de casas vitorianas de Pacific Heights, parece que se está em perpétua mudança mas viajando em busca do que se mantém igual. E provavelmente não há melhor forma de sentir o poder evocador da cidade do que andando no característico eléctrico. A carreira que trepa Nob Hill é uma excelente proposta. Do topo da colina, divisam-se as docas e a ponte aérea. A brisa do oceano penetra no cable car enquanto desce Hyde St. com o guinchar metálico característico atravessando Lombard, cenário do filme Vertigo de Hitchcock.
Em Fisherman’s Wharf, a urbe expande-se pela baía. O bairro da Marina alberga as casas mais elegantes da cidade e, para comer, há muitos locais para escolher no Ferry Building, um bonito edifício renovado em 2004. À tarde, um programa diferente consiste em avistar a colónia de focas na doca 39. De seguida, pode vaguear por North Beach e apanhar novamente um cable car para regressar a Chinatown, um bairro em permanente mudança.
GOLDEN GATE. Esta ponte com 1.280 metros de comprimento é o símbolo de São Francisco desde a sua inauguração em 1937. Foi pintada de cor de laranja para os navios a conseguirem vislumbrar entre a neblina.
Numa casa de chá de Main Street, barras e bolos feitos de folhas verdes amontoam-se em mesas como se fossem lingotes ou excremento de vaca. A penumbra desenha silhuetas e esconde um mundo exclusivo. Dois homens bebem chá num recanto junto de gaiolas de canários. Se descer a Taylor Street, poderá entrar num das lojas e escolher um chá de entre a vasta gama de chás exóticos da China. Depois de deixar as folhas em infusão um minuto, vem a surpresa: de picos, surgem flores; de pequenas pérolas, nascem jardins aquáticos; e de anéis amarelados, uma tinta azul. O visitante sai a flutuar entre a sonolência e a euforia e Chinatown adquire então um fantástico cariz. Um grupo de mulheres, deitadas em camas, executam exercícios gímnicos como se fossem mecanismos articulados. Um vendedor coloca uma galinha viva num saco e entrega-o à cliente. Rãs enormes são levadas como se fossem pedaços de carne inertes, e peixes dourados movem-se impassíveis em aquários esverdeados.
No Sudeste da urbe, onde o jazz e os antigos hippies convivem, existe outra São Francisco, que penetra em Castro e no antigo bairro latino Mission, polvilhado de bons restaurantes. Depois de uma refeição ligeira em Dirty Water, entre na missão Dolores, que sobreviveu ao terramoto de 1906. As suas torres brancas, desiguais, destacam-se contra o céu azul.
No jardim, ergue-se a estátua do fundador das missões da Califórnia, frei Junípero Serra, nascido em Maiorca, e responsável pelo facto de o mapa da 11.ª economia do mundo estar repleto de nomes de santos.
Ao abandonar São Francisco, a sucessão de colinas oferece bonitas paisagens entre San Mateo e San José. É uma densa região que inclui a Universidade de Stanford e o núcleo high-tech de Palo Alto e Cupertino. Já na autoestrada 1, praias solitárias e motéis acolhedores tornam a rota agradável até Half Moon Beach. Daí até Santa Cruz vêem-se as casas mais luxuosas da costa e o velho farol Pigeon Point. Em San Gregorio, começa a Route 84, que atravessa florestas frondosas e aldeias tranquilas.
Santa Cruz é um bom local para passear nas suas esplêndidas praias e talvez observar baleias numa saída de barco. Vinhedos, montanhas e florestas inesperadas de sequóias desembocam em Pacific Grove, ponto de partida de outra rota cénica de 17 milhas até Carmel.
Para lá de Bird Rock e do cipreste solitário que pende de um penhasco, fica a chamada Spanish Bay, onde Gaspar de Portolá fundeou a frota em 1769, para travar o avanço russo para norte. Monterey fascina com o seu Historic Park, cenário de um famoso festival de jazz. Para conhecer melhor esta zona, nada melhor do que ler, de preferência in situ, o livro Viagens com o Charley de John Steinbeck, que nasceu perto de Monterey, bem como o conto Flight, que narra a fuga de Pepe para as colinas para se transformar em adulto.
Carmel é a pérola da Costa. Stevenson, o autor da Ilha do Tesouro, escreveu que os seus ciprestes contorcidos de copa larga eram “as árvores mais fantásticas”. Carmel foi também o local que Clint Eastwood escolheu para residir durante alguns anos e, em 1986, o actor foi mesmo eleito como presidente da câmara local. Graças a Eastwood, a missão de São Carlos Borromeu é a mais bem conservada do caminho real californiano. Perto da igreja, desemboca o riacho que deu nome à povoação. Não é comum, mas há quem diga já ter visto a passear na praia a silhueta de Dirty Harry.
Depois de Carmel, a rota estende-se por essa estrada de sonho até chegar a Bixby Bridge, suspensa entre dois promontórios do penhasco. É como a filigrana de um trem eléctrico ou o esqueleto de um animal extinto. Há algo em Bixby que faz esquecer a função da ponte. As colinas verdes precipitam-se no oceano espumoso e as ondas chamam, mas só há acessos ao mar. Uma caminhada pelo Parque Julia Pfeiffer conduz à escondida cascata MacWay. Do pitoresco trilho Northway Trail, por vezes avista-se a respiração intermitente dos grupos de baleias-cinzentas ao longe.
Henry Miller viveu no Big South e escreveu sobre as suas personagens no seu estilo directo e ardente. Dizia ele que, neste território de beleza rude, não havia apenas escritores e artistas mas também jogadores de xadrez e ténis-de-mesa. O Inverno era a sua estação preferida. Uma original biblioteca parcialmente oculta pela folhagem tem o seu nome e recorda o visitante que, neste litoral instável, propenso a deslizamentos de terras, entre as colinas que espreitam o mar e o oceano incansável, Miller jogou apaixonadamente ténis-de-mesa durante duas décadas.
O BIG SOUTH, A GRANDE TRAVESSIA DA COSTA DO PACÍFICO. 1.São Francisco: A cidade do Golden Gate, Alcatraz, as ruas íngremes e a cultura hippy merece uma viagem por si só. 2.Santa Cruz: Destino de surf com praias magníficas e águas frequentadas por cetáceos. 3. Monterey: Nesta península, é agradável visitar o Parque Monte Forest e observar os leões-marinhos de Pebble Beach. 4. Carmel: É uma das 21 missões fundadas nesta costa. Em Carmel-by-the-Sea, começa a faixa conhecida como Big South. Próximo dela, situa-se a ponte de Bixby Creek. 5. Parque Julia Pfeiffer: A praia da cascata McWay é o seu ponto mais famoso. 6. Parque Limekiln: Trilhos entre sequóias, antigas pedreiras e praias. 7. Castelo de Hearst: A mansão do magnata que inspirou Citizen Kane de Orson Wells.
A caminho de San Simeon, vale a pena uma paragem no Esalen Institute, que foi hotel hippie na década de 1960, paraíso nudista e de ioga. Aqui Hunter S. Thompson, um dos criadores do New Journalism, chegou a trabalhar como segurança armado. No local, residiram ou inspiraram-se os criadores de várias terapias modernas como a psicologia humanista, o gestaltismo, a PNL ou a respiração holotrópica. Agora, converteu-se num espaço para onde vêm os génios de Sillicon Valley depois de darem conta que, como diz o director Ben Tauber que fugiu da Google, “que tinham revolucionado a conexão global com a Internet sem que isso ajudasse as pessoas a ligarem-se consigo próprias”. Descalços, com o olhar perdido no ventre branco do Pacífico, os génios arrependidos purgam a sua glória nas famosas águas termais de Esalen.
O Parque Limekiln brinda os visitantes com um oásis de calma para um piquenique entre as majestosas sequóias. Desde 1890, as árvores já não alimentam os fornos de cal, utilizados para produzir cimento que abastecia São Francisco e Monterey. Meia hora de agradável passeio conduz às pedreiras de calcário. Antes de terminar o fascinante périplo por esta franja da costa, o viajante não deve deixar de dar um mergulho na baía de Partington. As águas transparentes, quase geladas, do Big South rejuvenescem os que têm coragem de as experimentar.