Só entre o sopé de Belmonte e a Cova da Beira o Zêzere corre tranquilo, enquanto percorre a Meseta. Assim que volta a entrar na Cordilheira Central Ibérica, por alturas da Coutada, a sul do concelho da Covilhã, e até Zaboeira, em Vila de Rei, o vale enche-se de curvas. Os meandros do rio Zêzere adensam-se particularmente entre Janeiro de Cima e Pedrógão Grande, desde o relevo quartzítico da serra do Muradal ao maciço granítico de Pedrógão, que delimitam este traçado tortuoso ao longo de 80 quilómetros.

O levantamento tectónico desta área fez-se ao longo de falhas, como a de Sobreira Formosa e a de Cebola. Estas falhas delimitam imensos blocos de constituição litológica similar, vulgo xistos, uns mais erguidos do que outros, num dominó que se inicia na serra das Corgas, passando por Cabeço Rainha, Vermelha e Açor. O rio Zêzere corre entre blocos tectónicos, naquele que é conhecido como o Fosso Tectónico do Médio Zêzere, com profundidade média de 400 metros relativamente às cumeadas mais próximas.

Em geral, quando se dá o rejuvenescimento do relevo por acção tectónica, os maiores desníveis são vencidos pelos sistemas fluviais por um incremento erosivo nas margens côncavas, tendo como resposta uma erosão mais reduzida e de sedimentação nas margens convexas. Com a evolução do encaixe da drenagem, formam-se curvas de grande amplitude perpendiculares à principal direcção de escorrência (meandros), com vales de perfil assimétrico, de vertente mais inclinada na margem erosiva e de vertente mais suave na margem de sedimentação. Ora, os meandros do Zêzere são distintos.

Gigantescos, com quilómetros de extensão, não são perpendiculares à orientação geral do traçado do rio, não têm dimensões similares, nem formam curvas simétricas. A sua forma é o resultado de um encaixe canalizado por uma fracturação orientada quase norte-sul, herdada da Orogenia Varisca há cerca de 300 milhões de anos. O vale também não mostra um claro perfil assimétrico, com a ausência de terraços escalonados nas vertentes.

Como se o rio Zêzere fosse impassível às variações do nível do mar e levantamentos tectónicos que se deram durante o Quaternário, tendo aberto a sua trincheira serpenteante toda de uma vez.

Este geomonumento, incluído no Geopark Naturtejo Mundial da UNESCO, pode ser visitado percorrendo a Grande Rota do Zêzere, desde a sua nascente (na serra da Estrela) até à foz, em Constância. De carro ou moto, em todo-terreno, ou com mais tempo, a pé, de bicicleta e/ou de canoa ou em prancha stand up paddle, poderá descobrir uma enorme variedade de locais de singular interesse: a montanha da Argemela e as suas riquezas minerais; a paisagem mineira do Cabeço do Pião; as praias fluviais e as Aldeias do Xisto; as gargantas do Zêzere, Almegue e Cabril, esta última com a ponte filipina de Pedrógão Pequeno; a riqueza patrimonial de Álvaro e Dornes; e os numerosos percursos pedestres que partem de aldeias singelas e zonas turísticas para outras pequenas surpresas.