A queda-d’água de 15 metros impressiona nos meses de Inverno e é a principal quebra de desnível no vale do Guadiana, ao longo dos 780 quilómetros do quarto rio mais extenso da Península Ibérica. Em cerca de 40 quilómetros, o vale do Guadiana corre entrincheirado. São 300 metros de terraço rochoso que, a partir do Pulo do Lobo, é sulcado por este rio que actualmente mal corre no Verão, mas que pode ser impetuoso no Inverno, extravasando em muito o canhão fluvial e cobrindo com um manto de água a totalidade do vale submergindo totalmente a queda-d’água, como aconteceu em 2008. Então, neste vale largo e de fundo plano e rochoso, onde não parece pertencer, como se formou o lendário Pulo do Lobo?
O fundo rochoso do Guadiana é um autêntico arquivo da história da Terra: as rochas metamórficas, amarrotadas como um trapo velho de 381 milhões de anos, são um testemunho importante do fim do oceano Rheic. Nestas, contam-se três episódios tectónicos associados à subducção da placa oceânica sob a crusta continental da zona de Ossa-Morena. São histórias geológicas que têm vindo a ser contadas ao longo de uma vida por José Tomás Oliveira, a quem se associou a paleontóloga Zélia Pereira, especialista em encontrar nestas rochas fósseis com menos de 0,2 milímetros.
As rochas e a deformação tectónica que sofreram explicam o percurso do vale mas não a sua forma estranha e a formação do Pulo do Lobo. Recentemente, uma equipa de investigadores espanhóis propôs um modelo paleoclimático para a formação do vale côncavo por onde corre o Guadiana. Este desenvolveu-se há cerca de quatro milhões de anos, quando, num clima subtropical associado a um nível do mar mais alto e estável do que o actual, se deu o alargamento do fundo do vale por erosão das rochas pouco resistentes. Só há 70 mil anos o Guadiana começou a escavar a garganta fluvial, acompanhando a descida do nível do mar até 40km da costa actual, com a extensão das calotas polares durante a última glaciação. Este processo erosivo dá-se a uma taxa média de 0,75 mm por ano, o suficiente para sentenciar o Pulo do Lobo num futuro de milhares de anos, apenas para ver surgir um novo Pulo do Lobo mais a montante. Tal como o foi no passado a Rocha da Galé.
Novíssimos acessos do lado de Serpa permitem descobrir todas estas histórias geológicas decoradas pela riqueza da flora mediterrânea, da salsaparrilha-brava ao bosque de freixos, e pelas mais de 100 espécies de aves que por aqui se podem avistar. O percurso pedestre existente na margem de Mértola, permite percorrer um magnífico trecho do Guadiana. Desde o moinho da Escalda, de arquitectura típica para submersão em períodos de cheias, a vegetação luxuriante, o deslumbramento ocasional da águia-imperial-ibérica, as marmitas-de-gigante que transformaram o Pulo do Lobo num enorme queijo suíço erosivo e o Pego dos Sáveis onde, subitamente no lago de paredes verticais, o Lobo liberta a espuma da Terra. É o domínio do Pulo do Lobo!