Em Fevereiro, a jornalista Asun Luján descreveu para a edição espanhola da “Viagens National Geographic” seis exemplos de arquitectura religiosa portuguesa que são hoje Património da Humanidade. No Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, recorde que conventos e mosteiros fascinaram a nuestra hermana em Tomar, Mafra, Porto, Batalha, Lisboa e Alcobaça.

Num tempo em que os monarcas da Europa Central estavam fixados no seu próprio umbigo e competiam entre si construindo palácios, castelos e catedrais descomunais, com o objectivo de consolidarem a sua grandeza e o seu poder, os reis de Portugal centravam os seus esforços em erigir mosteiros monumentais para louvar a ajuda divina recebida nas suas vitórias bélicas e feitos marítimos e, nalguns casos, como exaltação ao amor. Essa “moda” lusa durou do século XIII ao XVIII, fazendo com que Portugal possua um destacado legado monástico cuja relevância artística foi catalogada e protegida como Património da Humanidade pela UNESCO. Além disso, quatro monumentos deste artigo também se encontram entre as Sete Maravilhas de Portugal, uma selecção promovida pelo Ministério da Cultura do país.

1. MOSTEIRO DOS JERÓNIMOS, EM LISBOA

O Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, é a obra-prima do estilo manuelino português, um refinamento do gótico sóbrio que imperava na Europa quando começou a ser edificado. Situa-se no bairro de Belém, à entrada do porto lisboeta, um pouco afastado do centro, mas com óptimas ligações de transportes públicos. Nas suas paredes e nos tesouros que alberga no seu interior, o grande monumento relata vários episódios da história da expansão marítima portuguesa. As obras do mosteiro começaram em 1502, tendo sido concluídas um ano mais tarde. Foram financiadas em grande parte pelo chamado “imposto da pimenta”, que incidia sobre as importações de especiarias e de ouro chegadas da Ásia e de África.

Contemplando-o a partir do exterior, destaca-se a imponente fachada com mais de trezentos metros de comprimento. Lá dentro, inicia-se um desfile de personagens ilustres da história portuguesa diante do visitante. A Capela Maior acolhe as arcas funerárias de Manuel I e dos seus descendentes. Também é possível ver os túmulos de Vasco da Gama, o cenotáfio do poeta Luís de Camões e a lápide do historiador Alexandre Herculano. No Cruzeiro, o mais surpreendente é a arca do rei Sebastião I, que se encontra vazia, pois os seus restos perderam-se em Marrocos, onde tombou no campo de batalha de Alcácer Quibir, em 1578.

O Claustro dos Jerónimos foi construído em 1544 e é composto por dois níveis, com varandas decoradas com belíssimas arcadas lavradas vista sobre um pátio e esculturas que evocam a época da expansão marítima. Uma capela contígua ao claustro guarda o túmulo de Fernando Pessoa, um simples monólito através do qual os portugueses prestam homenagem ao seu “rei escritor”.

A visita aos Jerónimos deve terminar na margem do rio Tejo, na vizinha Torre de Belém, que começou por pertencer a uma linha defensiva da qual também fazia parte o Forte de Cascais e o Forte de São Sebastião da Caparica, e acabou por se transformar numa alegoria em pedra dedicada aos exploradores portugueses. Actualmente, aloja um museu e é um dos monumentos mais visitados de Lisboa. Em 1983, o Mosteiro dos Jerónimos e a Torre de Belém foram declarados em conjunto Património da Humanidade, e hoje são parte das Sete Maravilhas de Portugal.

2. MOSTEIRO DE SANTA MARIA DA VITÓRIA, NA BATALHA

Mosteiro da Batalha

Fotografia de Istock.

O Mosteiro de Santa Maria da Vitória foi erigido na Batalha para comemorar a vitória dos portugueses sobre os castelhanos na Batalha de Aljubarrota, em 1385. É um dos exemplos do, então incipiente, estilo manuelino, próprio de Portugal. As obras começaram em 1388, a poucos quilómetros do local da batalha, e foram concluídas em 1402, com todo o recinto definido, excepto os sectores mais altos e os claustros.

A igreja foi a primeira edificação, erigida sobre três naves: a central tem dois níveis e cinco capelas na cabeceira. O interior do templo destaca-se pela sua altura, alcançando trinta e dois metros na cúpula, quase ausência de apoios. Uma lenda diz que, após finalizá-la, o seu construtor insistiu em permanecer sentado sozinho no interior da igreja, saindo dias mais tarde e afirmando: “a abóboda não caiu, a abóboda não cairá”.

O portal de acesso a Santa Maria da Vitória é o único totalmente esculpido de Portugal, recordando a essência do Pórtico da Glória compostelano. Junto à entrada, desdobra-se a Capela do Fundador, mandada erigir por João I de Portugal para ser o seu panteão. De um dos lados do altar maior destacam-se as capelas imperfeitas (século XV), as quais albergam, a céu aberto, os túmulos de Duarte I e outros membros da realeza.

O Mosteiro da Batalha conta com dois claustros. O dedicado a Afonso V é o mais ornamentado. Possui dois níveis e está rodeado por dependências que, no tempo dos monges, alojavam a enfermaria, o notário, a biblioteca, a despensa e o armazém da lenha. O claustro real possui galerias abobadadas e um pátio, no qual desembocavam a adega, a cozinha e o refeitório anexo. O antigo refeitório alberga actualmente o Museu de Oferendas ao Soldado Desconhecido. O recinto foi declarado Património da Humanidade em 1983 e é outra das Sete Maravilhas de Portugal.

3. REAL MOSTEIRO DE SANTA MARIA DE ALCOBAÇA

mosteiro de alcobaça

Fotografia de Istock.

Devido às suas dimensões, à pureza do seu estilo e aos materiais utilizados na sua construção, Santa Maria de Alcobaça é considerado o expoente máximo da arquitectura cisterciense em Portugal. A ordem religiosa de Cister fixou-se no território português no ano 1138. A igreja foi o núcleo original de todo o recinto, tendo sido fundada no século XII pelo rei Afonso I de Portugal, que, por aquela altura, estava em plena Reconquista aos muçulmanos e cumpriu a sua promessa de ceder terras à Ordem se fosse vitorioso.

Os monges começaram a construir o mosteiro em 1178. Aquilo que nasceu como uma pequena igreja foi crescendo em estilo gótico, com a sua planta em cruz latina, três naves laterais e abóbadas de cruzaria. O recinto acabou por incluir a magnífica abadia e três claustros (de Dionísio I, do Cardeal e de Rachadouro), ladeados por inúmeras celas monacais. Atrás da sua imponente fachada, actualmente barroca devido às remodelações posteriores, abre-se um austero interior que carece de decoração e imagens ornamentais, conforme ditado pela Ordem de Cister.

Muitos membros da monarquia portuguesa jazem neste mosteiro, sobretudo no Cruzeiro, no claustro e no panteão real. Devido à sua beleza artística e significado, destacam-se o túmulo de Dom Pedro I de Portugal e Dona Inês de Castro, que repousam juntos, sozinhos, na enorme nave central. Ambos viveram um amor proibido no século XIV, que os levou a casarem-se em segredo, e resultou no assassinato de Dona Inês. Os seus sarcófagos, jóias da escultura gótica portuguesa, estão-se diante um do outro para que os amantes se reencontrem na hora do Juízo Final. Numa inscrição gravada no caixão de Dom Pedro é possível ler: “até ao fim do mundo”. O Real Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça está na lista da UNESCO como Património da Humanidade desde 1989 e também é uma das Sete Maravilhas de Portugal.

4. BASÍLICA DO PALÁCIO NACIONAL DE MAFRA

mafra

Fotografia de Istock.

O Palácio Nacional de Mafra foi uma promessa de fé e de amor. O rei Dom João V de Portugal, apelidado de “o Magnânimo”, mandou construí-lo no século XVIII como demonstração de afecto pela sua esposa, Ana Maria da Áustria, e de agradecimento a Deus por lhe ter dado um herdeiro. A jovem rainha demorou anos a engravidar e os monarcas recorreram a mil estratégias, até que o rei prometeu construir um recinto esplêndido se tivesse um filho. Quando, aos vinte e oito anos, a rainha deu à luz o primeiro dos seus sete filhos, Dom João V de Portugal cumpriu a sua promessa.

Para edificar o enorme recinto que inclui a imponente basílica, o rei mandou mobilizar mais de 50.000 pessoas que, ao longo de duas décadas, ergueram este memorial ao amor e à riqueza, uma vez que foi financiado pelo ouro vindo do Brasil para Portugal. Este recinto palaciano onde predominam as linhas barrocas tem 1.200 divisões, 156 escadas, 29 pátios ajardinados e uma biblioteca, que contém mais de 40.000 volumes e é uma das mais notáveis de Portugal.

Contudo, o mais importante do Palácio de Mafra, Património da Humanidade desde 2019, é a sua magnífica basílica, na qual se entra pela fachada principal do palácio: uma entrada presidida por um frontão triangular de estilo clássico. A igreja está coroada por uma imponente cúpula renascentista que, além do seu valor artístico, contribui para a acústica do templo e alberga dois carrilhões com noventa e dois sinos. O amplo interior conta com uma decoração em mármores polícromos e alberga um único órgão, formado por seis tubos sonoros.

A basílica é complementada por um claustro com 40 metros x 33 metros, ladeado por arcos que lhe conferem um aspecto imponente. A partir deste espaço, acede-se ao convento, originalmente concebido para uma dezena de frades, mas que, aquando da conclusão das obras do palácio, ocupava 40.000 metros quadrados e acolhia 300 religiosos. A Sala dos Frades e as células dos monges são visitáveis.

5. MOSTEIRO DA SERRA DO PILAR, NO PORTO

serra do pilar

Fotografia de Shutterstock.

Em frente ao Porto, na outra margem do rio Douro, encontra-se Vila Nova de Gaia. Ambas as cidades estão unidas por pontes emblemáticas e uma história partilhada de produção e exportação de vinhos. No bairro histórico de Santa Maria e São Pedro da Afurada, em Vila Nova de Gaia, encontra-se, no alto de um monte com vista para a emblemática ponte Luís I, o singular Mosteiro da Serra do Pilar, uma pequena igreja renascentista do século XVI, que se destaca, além do seu claustro, pela sua planta circular: o único exemplar existente em Portugal. A construção do recinto começou em 1527 para albergar os monges do mosteiro de Grijó, que foram obrigados a abandoná-lo devido à sua deterioração. O recinto monacal rapidamente se revelou insuficiente e foi submetido a uma ampliação no século XVI. A igreja e o claustro circulares têm o mesmo diâmetro e estão separados por um coro rectangular no qual se abrem capelas laterais. O interior do templo contém retábulos de talha dourada, colunas salomónicas e esculturas de madeira policromada do século XVIII. A sua localização estratégica fez com que fosse utilizado como fortaleza improvisada desde meados do século XIX. O Mosteiro da Serra do Pilar é Património da Humanidade desde 1996.

6. CONVENTO DE CRISTO, EM TOMAR

convento de cristo

Fotografia de Shutterstock.

Os Cavaleiros de Cristo, a ordem militar portuguesa herdeira dos Templários, transformou Tomar na sua sede no território luso, fundando o Convento de Cristo em 1162 como um pequeno convento de clausura para os seus monges-soldados, rodeado pelas muralhas do castelo de Tomar. O conjunto inclui vários estilos, desde o Românico puro ao primeiro Renascimento, que começou a surgir em Portugal durante o reinado de João III. Actualmente, este monumento, Património da Humanidade desde 1983, é considerado uma jóia excepcional do património religioso português.

Observadas do alto, a beleza, as dimensões e a complexidade arquitectónica deste recinto são surpreendentes. Protegido por um pano de muralhas, inclui um aqueduto através do qual lhe chegava água. No interior do seu perímetro, conserva o Castelo da Alcáçova e o de Almedina, as primeiras estruturas, erigidas a partir do ano 1160, com uma Torre de Menagem românica ainda em pé, que não se encontra adossada a nenhum muro.

Uma das salas mais belas do Convento de Cristo é a Sala do Capítulo, iniciada em estilo manuelino, mas concluída no primeiro Renascimento português. A partir desta sala é possível admirar uma janela manuelina, que é um ícone deste estilo, possivelmente dedicada à época da expansão marítima. A sua decoração é belíssima.

Não restam, porém, dúvidas de que uma das peças mais surpreendentes do recinto de Tomar é a Charola, um exemplo de Românico puro, possivelmente concebida como capela funerária, embora posteriormente ampliada no século XVI. Este legado dos Templários é uma das poucas igrejas de planta centrada poligonal que se conhecem. Mais tarde, foi-lhe acrescentada uma igreja em redor, um arco de triunfo e um magnífico portal.

O recinto monumental inclui nada menos do que sete fabulosos claustros: Principal, dos Corvos, da Micha, de Santa Bárbara, da Hospedaria, da Lavagem e do Cemitério.

Artigo corrigido às 10h42 do dia 18 de Abril de 2023 

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