Os marinheiros gregos e romanos desvendaram os segredos deste labirinto de água e pedra que compõe a costa dálmata. Mais de mil ilhas espalham-se entre Dubrovnik e a península de Ístria.

Esta viagem por mar começa num dos portos mais antigos e emblemáticos do Adriático, o de Stara Luka, que guarda há séculos as muralhas da inexpugnável, impressionante e altiva Dubrovnik. Durante os séculos XV e XVI, esta cidade, antiga República de Ragusa, fazia frente à poderosa República de Veneza e competia com ela pelo controlo marítimo da região. Foi a época dourada em que Dubrovnik alimentou uma das frotas navais mais importantes da Europa e dispunha de consulados de mar em mais de quarenta portos do Mediterrâneo.

Basta atravessar uma das portas de acesso ao centro histórico fortificado para perceber o esplendor do passado: existem palácios góticos, renascentistas e barrocos, igrejas com escadarias e colunas, pavimento branco, fontes públicas esculpidas e um mosteiro franciscano cuja farmácia funciona desde 1317. Aqui elaboram-se óleos, pomadas e unguentos a partir de receitas que remontam ao século XIV, como o creme hidratante de rosas.

O centro de Dubrovnik é hoje um museu ao ar livre, projectando-se do porto velho e da rua central (Placa ou Stradun) até às muralhas que se podem percorrer do topo. A cidade enche-se de visitantes de manhã e perde toda a actividade de noite quando sai o último cruzeiro. É a oportunidade por que esperam os viajantes da embarcação seguinte, que aproveitam então o momento para se deslocarem até à Praça Luza e sentarem-se junto da fonte circular de Onofrio.

O primeiro dia de navegação nesta rota conduz o viajante a Korcula, que em tempos pertenceu à República de Veneza. Os habitantes desta ilha asseguram que o intrépido Marco Polo nasceuaqui em 1254, mas há um manto lendário em torno do navegador que não permite discernir a verdade da fábula.

Enquanto as investigações históricas procuram mais dados sobre a origem do mercador, a ilha não se deteve com minudências e engalanou-se com referências a esta personagem, desde a suposta casa familiar e uma exposição sobre a sua vida até ao vinho que tem o nome de Marco Polo.

Korcula não precisa de ter como concidadão o mítico viajante para motivar uma visita. A típica estrutura dálmata, implantada numa península fortificada, é por si um motivo mais do que suficiente para se maravilhar. A miríade de palácios e igrejas que se apinham, abraçados, por paredes compactas de pedra deslumbra logo à partida, mas os pormenores entre paredes também deixam os visitantes boquiabertos. A Catedral de São Marcos, cuja abóbada foi construída em forma de casco de navio em honra dos pescadores locais, contém uma obra-prima de Jacopo Tintoretto.

Ao circum-navegar a ilha de Korcula, descobre-se uma paisagem de praias pétreas e um interior atapetado com vinhas de uma variedade que só se encontra aqui, o grk. A uva autóctone cresce nas imediações de Lumbarda há milénios e com ela produz-se um vinho branco muito apreciado em todo o país. A outra característica de Korcula é a moreska, uma dança com espadas cuja origem remonta há mais de 400 anos. As suas raízes deverão ser as danças de mouros e cristãos que na época medieval eram representadas em diferentes pontos do Mediterrâneo e que em território croata só persistiram nesta ilha remota.

De Korcula, o viajante pode velejar, por vezes enfrentando o vento norte e lutando com velas e cabos, até Hvar, a ilha que os guias descrevem como hedonista.

costa Dalmáta

Parque Nacional Krka. Bilušića, Brljan, Manojlovac, Rošnjak, Miljacka, Roški e Skradinski são os nomes das sete cascatas pelas quais passa o rio Krkadee a nascente, nas imediações de Knin, até atingir o mar perto de Sibenik. Ao longo do seu curso, o Krka forma também desfiladeiros estreitos, grutas e lagos, como o Brljansko ou o Visovac. Neste último, existe uma ilhota com um mosteiro franciscano de 1445. O parque conta com uma rede de trilhos e ciclovias, assim como percursos lacustres. É também possível visitar a caverna de Ozidana, onde é visível a espantosa geologia cársica do parque. www.np-krka.hr

Provavelmente na raiz do adjectivo, estão os grandes iates atracados no porto. Nos últimos anos, as celebridades do mundo da cultura e da política europeias encontraram neste recanto de arquitectura gótica uma alternativa mais discreta à famosa Côte d’Azur francesa. Apesar da legião de personalidades e da exuberância da sua vida nocturna, Hvar não é de forma alguma um lugar para privilegiados. Para lá dos bares de chill out, dos cocktails e dos navios de recreio, existe uma ilha tranquila e rural que todos os verões se tinge com a cor violeta da lavanda, a planta tradicional.

A capital de Hvar é uma bonita cidade medieval. Os palácios exibem janelas ogivais. As ruas estão pavimentadas  de  branco e uma fortaleza veneziana vigia o conjunto a partir de um ponto superior. Tal como em Korcula, também em Hvar se deve espreitar para dentro de portas para descobrir recantos extraordinários, como o primeiro teatro público da Europa, uma jóia do barroco inaugurada em 1612. Os habitantes locais fundaram então a Hygienic Society of Hvar. Uma das missões da instituição era já… a promoção do turismo.

Este périplo marítimo continua com a navegação junto da rota dos ferries que partem de Stari Grad, o município mais antigo de Hvar, rumo à costa continental. Ao cabo de poucas milhas náuticas, surge no horizonte a silhueta da ilha de Brac, a maior do país e a que possui a praia mais famosa: Zlatni Rat. Também conhecida como Corno de Ouro devido à sua forma, esta praia é uma excepção na costa dálmata: não tem grandes areais, mas as pequenas enseadas pedregosas compensam, com a sua beleza rude, o incómodo de estender a toalha sobre um solo duro.

A ilha de Brac merece uma visita pelas suas célebres praia e enseadas, mas também pelas suas delícias culinárias. Os ilhéus asseguram que os borregos de Brac são os melhores do Adriático e deles aproveita-se tudo: a carne, o leite e também as vísceras, com as quais se elabora o tradicional vitalac, uma espécie de espetada de fígado, pulmão e coração assados na brasa.

A bebida típica, a smutica, é leite de ovelha misturado com vinho tinto, uma beberagem que o médico grego Hipócrates recomendava para o tratamento de certos males. Na manhã seguinte,  o  viajante pode partir rumo à bela Split. Hoje, é uma cidade moderna com quase meio milhão de habitantes, mas tempos houve em que o espaço intramuros era ocupado apenas pelo palácio do imperador romano Diocleciano. Foi construído no ano 300 como uma colossal villa privada do soberano no local escolhido para a sua reforma, depois de ter protagonizado a mais sanguinária perseguição contra os cristãos registada na história.

Já na época medieval, com o colapso do Império Romano e aproveitando as estruturas arquitectónicas existentes, a nova Split encaixou-se como um formigueiro no que foi em tempos o recinto palatino, colonizando o antigo espaço sagrado do imperador e criando novos focos de actividade.

Longe de ser um ponto arqueológico, o Palácio de Diocleciano é hoje a residência de cerca de 3.500 pessoas, que incorporaram na sua rotina o facto de viverem entre colunas romanas. O peristilo converteu-se no coração da vida cultural e Split transformou-se numa praça colossal onde há sempre animação e música ao vivo. Não muito longe dali, ergue-se a Catedral de São Dómnio, que guardou os ossos do imperador até ao saque, no século XVI, quando as relíquias foram levadas para local desconhecido.

Da villa diocleciana, conservam-se quatro portas por onde se entrava e ainda se entra para o quadrilátero composto pela residência imperial. Não são particularmente majestosas mas, ao franqueá-las, o viajante muda radicalmente de época. A Porta Sul, à qual se acede através das antigas adegas subterrâneas, devolve o visitante a Riva, a moderna marginal marítima de Split. Aqui, para lá das palmeiras e das esplanadas dos restaurantes, sobressaem os mastros dos veleiros no porto, agitando-se com impaciência antes do regresso a mar aberto.

Deixando para trás Split, o sonho monumental plantado por Diocleciano nas águas do Adriático, chega a altura de uma paragem no mar para nadar, fazer snorkeling ou petiscar queijo comprado no mercado. Idealmente, chega-se às ilhas de Zadar ao pôr do Sol.

Este denso arquipélago, o maior do Adriático, reúne uma paisagem labiríntica que faz as delícias dos navegadores. A zona mais valorizada está protegida por duas reservas: o Parque Nacional das Ilhas Kornati e o Parque Natural de Telascica, que abarca a baía e a lagoa da ilha Dugi (“larga”).

As Kornati são ilhas nuas, com entardeceres cor de mel e recantos perfeitos para fundear. O prato forte deste arquipélago encontra-se debaixo de água. Os seus fundos são dos melhores pontos do Adriático para mergulhar, devido à biodiversidade marinha aqui concentrada. Existem 353 espécies de algas, 61 de coral, 177 de moluscos e 185 de peixes. É também um habitat permanente de golfinhos e tartarugas marinhas. Fora de água, não se esqueça da boa comida. Se Korcula tinha vinho e Brac os borregos, as pequenas ilhas de Kornati gabam-se de contribuir com os seus próprios produtos mediterrâneos para a lista de delícias croatas: neste caso, mel, azeite e figos secos.

A viagem marítima chega ao fim no porto de Zadar, a antiga Diodora bizantina que os venezianos rebaptizaram como Zara. Aqui pode admirar-se o perfil pré-românico da Igreja de São Donato (século IX) e o seu campanário antes de se despedir do Mediterrâneo e seguir rumo ao interior montanhoso.

Pouco mais de cem quilómetros separam Zadar de outro ponto onde a água também impõe o seu domínio: o Parque Nacional dos Lagos Plitvice. Classificado como Património Mundial, vive da magia de 96 cascatas e 16 lagos de cor turquesa unidos por uma rede de passadiços de madeira.

costa Dalmáta mapa

A melhor época é de Maio a Setembro, quando as temperaturas são mais elevadas e os ventos sopram com menor intensidade. Várias companhias aéreas fazem a ligação (com escalas) entre Lisboa e Dubrovnik, Split e Zadar, onde se pode aceder a um dos 70 portos desportivos da costa croata. É possível alugar veleiros, catamarãs ou barcos a motor de diferentes tipos, com ou sem comandante. Para poder operar com estas embarcações é exigido o International Certificate of Competence (ICC).

A entrada principal do parque dá acesso directo à Grande Cascata e aos Lagos Inferiores. Depois de uma manhã de caminhada, o visitante encaminha-se para a secção superior de Plitvice, a mais selvagem e intimista. As faias que abraçam esta zona acolhem uma fauna variada que foi muito afectada pela guerra que entre 1991 e 1995 extinguiu a antiga Jugoslávia. Muitas espécies tiveram de ser reintroduzidas e actualmente, das 259 espécies recenseadas, quatro estão altamente ameaçadas e contam com um regime de protecção especial : o lince, o lobo-cinzento, a lontra e o urso-pardo.

Depois de uma caminhada pela surpreendente gama de tons verdes de Plitvice, a última noite na Croácia idealmente decorrerá ao sabor de um bom vinho de Korcula enquanto a brisa faz ondular as folhas das árvores deste paraíso natural.