A silhueta inconfundível de Edimburgo, capital administrativa e cultural do país, está dominada pela colina vulcânica onde se apoia o velho Castelo. Esta impressionante fortaleza contém no interior vestígios do passado histórico e sentimental da Escócia: a Capela de Santa Margarida (século XII), o Memorial Nacional da Guerra, as jóias da Coroa escocesa ou a famosa Pedra do Destino, um bloco de arenito colocado sob o trono dos reis da Escócia quando estes eram coroados e que, depois de 700 anos na Abadia de Westminster, regressou à sua terra natal em 1996.
A praça em frente do Castelo acolhe todos os meses de Agosto o Military Tatoo, o desfile de tropas ao som de tambores e gaitas-de-foles que dá início ao famoso Festival Internacional de Edimburgo. Durante todo o mês, as ruas de Edimburgo enchem-se de música, dança e teatro, com concertos e representações em espaços formais mas também em plena rua, ampliando uma oferta que só por si já é suficiente para satisfazer todos os gostos.
Do castelo desce-se a Royal Mile, a artéria que atravessa a cidade velha de um extremo ao outro até ao palácio real de Holyrood. A caminhada por esta avenida de 1.800 metros equivale a fazer um passeio pela história de Edimburgo, desde a Idade Média ao século XIX.
E também pela literatura, se visitar a casa de Robert Louis Stevenson e as tabernas que Robert Burns frequentava em busca de “inspiração”, ou se tomar um café numa mesa do Elephant House, onde J.K. Rowling idealizou Harry Potter.
Um ponto misterioso, de melancólica beleza, envolve os cemitérios de Edimburgo, onde jazem personalidades como o filósofo David Hume, no cemitério de Canton, ou Adam Smith, pai conceptual do capitalismo ocidental.
Termina-se a viagem impregnado da paisagem e da história das Highlands, levando para casa um pedaço do seu carácter livre e indomável.
O túmulo deste último, peregrinação obrigatória para todos os economistas do mundo, encontra-se no cemitério de Canongate, célebre para além disso por ter inspirado Charles Dickens no seu conhecido Conto de Natal.
A Edimburgo obscura sobrevive nos wynds e nos closes, calçadas cobertas com edifícios de cinco ou seis pisos nos quais se aglomeravam os habitantes da cidade que deslumbrava os visitantes como uma Manhattan do Velho Mundo. Hoje, quer as ghost tours quer as visitas guiadas a Mary King’s Close transferem o viajante para essa época e explicam como se vivia e morria, especialmente durante a praga de peste de 1644. Edimburgo começou verdadeiramente a respirar no século XIX, depois de secar os pântanos que limitavam a expansão da cidade para norte. Desses anos data a construção do bairro georgiano de New Town, actual centro de comércio e de lazer da capital escocesa.
Edimburgo é uma porta directa para as Highlands desde os tempos do império romano. Corria o ano 140 d.C. quando o imperador Antonino Pio considerou que a Bretanha estava a salvo dos bárbaros do Norte. Assim, a muralha de Adriano (construída vinte anos antes) foi abandonada e ergue-se outra divisória no estuário de Forth e no golfo de Clyde, ou seja, entre Edimburgo e Glasgow. Duas décadas mais tarde, os romanos corriam novamente para a muralha de Adriano, deixando as Highlands para os seus indomáveis habitantes, os pictos, que desciam das montanhas aos gritos, homens e mulheres nus com o corpo pintado de azul, empunhando lanças e espadas de ferro.
Os romanos nunca conseguiram dominar a região. E embora os pictos tenham desaparecido, integrados nos povos de tradição céltica, gaélica e germânica, que deram origem à Alba (Escócia) do século X, o espírito guerreiro das Highlands permaneceu inalterado.
Quando se atravessam os montes Grampian pela estrada que liga Edimburgo a Inverness, é fácil imaginar uma investida desses guerreiros que aterrorizaram os romanos há quase dois milénios. O único factor que nos vincula ao presente é a faixa negra de asfalto.
De súbito, emerge o Great Glen, essa formação que os deuses cravaram no meio da Escócia dividindo o país, e que a natureza preencheu com lochs navegáveis. Entre eles o celebérrimo lago Ness. Sair à procura do monstro já se transformou numa actividade quase vintage, mas permite conhecer aldeias e monumentos com uma enorme carga histórica, como o castelo de Urquart, praça--forte contra as invasões inglesas nos tempos de William Wallace e de Robert de Bruce (século XIV).
Inverness é a base de operações ideal para explorar a fundo a região. A cidade possui poucos vestígios do passado. O próprio castelo é do século XIX. Compensa-o com uma beleza tipicamente escocesa, esculpida pelo rio Ness e pela presença de dezenas de castelos vizinhos que evocam a época dos clãs, com as suas leis, línguas e costumes.
Formados não só por parentes, mas também por vizinhos, arrendatários e protegidos que adoptavam o apelido, o sistema de clãs das Highlands estruturou uma vida feudal até ao levantamento jacobita de 1745, no qual os escoceses apoiaram as pretensões de Carlos Eduardo Stuart ao trono britânico.
No dia 16 de Abril daquele ano, um exército de clãs foi imprudentemente dirigido por Bonnie Prince Charlie pelos pântanos de Culloden Moor, a dez quilómetros de Inverness. Desorganizados, foram massacrados pelos ingleses comandados pelo duque de Cumberland, William Augustus, filho mais novo do rei Jorge II de Hanôver.
A crueldade da vitória e as medidas de repressão tomadas mais tarde ajudariam a celebrizá-lo como o Carniceiro de Cumberland. Milhares de highlanders morreram. Outros tantos foram aprisionados ou escravizados. Erradicou-se o sistema de clãs e foram proibidos os tartans (kilts), a gaita-de-foles e qualquer outro tipo de símbolo nacional. A população foi reduzida ou expulsa à força. No entanto, para completar o extermínio, seria preciso arrancar estas comunidades das suas montanhas. E isso nunca foi concretizado em nenhum momento da história.
O whisky é o protagonista da etapa seguinte da viagem por Speyside, o vale do rio Spey, que é o segundo curso fluvial mais longo e rápido da Escócia. As populações dedicam-se à produção de whisky há séculos, tal como demonstram as suas inúmeras destilarias. Se só houver tempo para visitar uma, a de Dallas Dhu é a mais recomendável. Menos conhecida do que as restantes, garante uma visita mais calma e íntima para descobrir o processo de elaboração da uisge beatha («água da vida» em gaélico), à base de malte de cevada. Esta destilaria transformada num museu tem um ponto nostálgico encantador: inaugurada em 1898, em pleno boom da exportação de whisky, fechou e reabriu em diversas ocasiões ao longo do século XX até ao seu encerramento em 1983. Como curiosidade, a sua loja vende garrafas de whisky Dallas Dhu, mas também de uma mistura chamada Roderick Dhu, feita com meia parte do original. Estas garrafas são o que resta da produção que permaneceu por vender: no dia em que for levada a última, ninguém mais poderá conhecer o sabor de um Dallas Dhu.
A partir desta região chega-se ao Parque Nacional Cairngorms, destino ideal para um dia de caminhada, observação de fauna e inclusivamente para esquiar durante o Inverno. Neste planalto, elevam-se cinco das seis montanhas mais altas da Escócia, lideradas pelo Ben Macdhui, com 1.309 metros. É uma zona fria também no Verão. Já aqui foram registadas as temperaturas mais baixas da história do Reino Unido. Um dos maiores valores naturais deste parque nacional é a sua floresta prístina, constituída por uma das últimas manchas de pinheiros caledónios que povoaram a ilha depois da última glaciação. Este tesouro florestal alberga lontras, lebres, castores, veados, renas, gatos selvagens e dezenas de espécies de aves, como a águia-real, o lagópode-branco e o tetraz-grande.
A rota rumo ao mar do Norte antecipa inúmeros locais de interesse paisagístico, arquitectónico e histórico. Como o pequeno povoado costeiro de Nairn: nas suas praias foram treinados os soldados britânicos para o desembarque da Normandia, e nos seus campos descansou William Augustus de Cumberland antes da vitória em Culloden.
As solenes ruínas da Catedral de Elgin (século XIII) renascem no Verão durante os recitais e concertos que acolhe ao ar livre. As suas colunas e pedras gravadas narram histórias medievais de clãs, bispos e reis.
A pouca distância dali, a cidade de Huntly oferece uma visita interessante ao castelo, morada ancestral do laird ou chefe do clã Gordon. Na costeira Banff, a arquitectura georgiana do século XVIII da cidade alta contrasta com o velho porto. Nos arredores, ergue-se a Duff House, uma mansão repleta de pinturas e objectos decorativos.
A ondulação e o vento do mar do Norte parecem dar tréguas a esta costa nos meses estivais. O grande centro urbano, cultural e de lazer da zona é Aberdeen, a Cidade de Granito. No Verão, o sol arranca lampejos prateados das suas casas, mas quando o céu se cobre de nuvens baixas é difícil distinguir onde acaba um edifício e começa a nuvem, criando assim um efeito de mistério.
O carácter escocês distingue-se no sotaque doric dos seus habitantes e no ambiente do porto. Aberdeen é, além disso, uma cidade com alma artística, com um espírito criativo que se manifesta numa longa lista de festivais musicais e culturais. Também a natureza ocupa um lugar destacado entre as suas atracções, graças à proximidade de vários ícones culturais. Para além do Parque Nacional das Cairngorms, 30 quilómetros a sul encontra-se a reserva naturalpu de Saint Cyrus, em cujas falésias e dunas cobertas de matagais e flores silvestres nidificam numerosas espécies de aves.
De regresso a Inverness, é recomendável descer pela estrada que rodeia o Great Glen, até Fort William, conhecido como um grande centro de desportos ao ar livre pela sua proximidade com o Ben Nevis. Com 1.344 metros, é a montanha mais alta da Grã-Bretanha. Depois de dedicar uns dias a caminhar pelo tecto da Escócia, pode regressar à muralha de Antonino, continuar até Glasgow e procurar um ambiente buliçoso e industrial, ou regressar a Edimburgo por Stirling, cenário da vitória de William Wallace sobre os ingleses de Eduardo I em 1297. Qualquer opção permite terminar a viagem impregnado da paisagem e da história das Highlands, levando para casa um pedaço do seu carácter livre e indomável.