As Highlands (Terras Altas, em português) que ocupam o Norte da Escócia encarnam a quinta-essência de uma nação fascinante, com espaços naturais onde mal se percebe a mão do Homem, um litoral repleto de ilhas e do romantismo de castelos que encerram um legado histórico turbulento. Estas terras indómitas, onde se fala o gaélico escocês e se praticam jogos ancestrais, são o berço de símbolos tão distintivos como os quadrados do tartã. Além disso, o catálogo de imagens de postal de natureza selvagem é enorme e convive com alguns dos enclaves turísticos mais famosos da Escócia. O Loch Ness não é a sua única estrela: é apenas um dos iscos da sua lenda. Estes são os sítios de visita obrigatória para qualquer viagem às Highlands escocesas.

1. INVERNESS, CAPITAL DAS HIGHLANDS DA ESCóCIA 

Situada na margem do icónico lago, Inverness assume-se, sem complexos, como capital das Terras Altas, completamente alheia a comparações com a histórica Edimburgo ou o halo modernista de Glasgow, as suas irmãs das terras baixas, caracterizando-se pela simplicidade despretensiosa característica dos Highlanders. Esta cidade engalanada de flores e com aspecto de grande metrópole é o grande nó de comunicações da região e um centro estratégico para conhecê-la, rumo aos quatro pontos cardeais e de costa a costa.

Na sua condição de única cidade das Terras Altas e foco turístico, Inverness costuma ser muito movimentada, sobretudo nas ruas pedonais e no mercado vitoriano coberto, o coração da sua actividade comercial. Tal como manda a tradição, a pequena urbe conta com o seu próprio castelo, uma edificação muito “recente” para os parâmetros do património histórico escocês, pois data do século XIX, embora apresente um perfil charmoso, esculpido em arenito rosado, dotado de um miradouro sobre a cidade e, sobretudo, esse fenómeno que é o Lago (loch) Ness.

CASTELO DE URQUHART
SHUTTERSTOCK

2. O CASTELO DE URQUHART 

A fábula sobre um monstro que vive sob a sua superfície entranhou-se nas profundezas do imaginário popular e alimentou a fama mundial do maior loch do Reino Unido em termos de volume de água – quase o dobro de todos os lagos de Inglaterra e do país de Gales juntos. Animal marinho pré-histórico, enguia gigante ou mero protagonista de um conto – as interpretações variam –, a criatura Nessie esconde a sua suposta casa sob o castelo de Urquhart, a imagem mais fotogénica e procurada da margem do lago. Aquilo que as máquinas fotográficas ou os telemóveis dos visitantes focam são as ruínas de uma fortaleza medieval acossada pelos embates de numerosos conflitos ao longo de oito séculos, não apenas entre escoceses e ingleses como entre os próprios clãs das Highlands, que dividiam a sociedade em tribos sob o comando de chefes autocratas.

As sucessivas reconstruções empreendidas sobre as cicatrizes de Urquhart preservaram até hoje a sua grande torre do século XV, virada para o decorativo entorno de Great Glen (Grande Vale). As suas vistas abrem o apetite para uma aventura rumo a Oeste, ao longo de uma das grandes rotas panorâmicas escocesas: o Canal da Caledónia, uma via navegável acompanhada por um caminho de sirga, que encadeia quatro lochs ao longo de cem quilómetros de comprimento no Great Glen.

BEN NEVIS
GETTY IMAGES

3. BEN NEVIS, O PONTO MAIS ALTO DAS HIGHLANDS

O canal segue por intervalos escarpados e colinas cobertas de urze, desde o porto de Inverness até ao Fort William, a Sul. Estrategicamente, liga a costa do Mar do Norte ao Oceano Atlântico e, do ponto de vista turístico, propõe cruzeiros fluviais até à localidade de Fort William, situada quase no sopé de Ben Nevis, o pico mais alto das ilhas britânicas. Os 1.343 metros de altura do Ben Nevis sublinham a orografia montanhosa das Highlands, coroando esta montanha (ben, em gaélico escocês) soberana de uma área nacional estriada por desfiladeiros que albergam cascatas tão impressionantes como Steall Falls.

GLENFINNAN
GETTY IMAGES

4. GLENFINNAN, O VIADUTO FERROVIÁRIO DE HARRY POTTER

É fácil perder-se dias a fio imaginando excursões entre o repertório interminável de vales que se estendem até Glen Coe. Quando as forças começam a enfraquecer, porém, o ideal é desfrutar do passeio comodamente sentado no comboio que atravessa maravilhoso viaduto arqueado de Glenfinnan. Durante a temporada de Verão, a linha ferroviária entre Fort William e Mallaig é percorrida pelo comboio a vapor The Jacobite Steam Train, que milhões de crianças (e não só) identificariam imediatamente como o Hogwarts Express da saga Harry Potter, felizmente recuperado nos últimos anos graças ao sucesso dos filmes do jovem feiticeiro imaginado por J.K. Rowling.

ALDEIA ONDE GEORGE ORWELL ESCREVEU 1984
SHUTTERSTOCK

5. OBAN E A ALDEIA ONDE GEORGE ORWELL ESCREVEU 1984

A fase ocidental das Highlands, virada para o Oceano Atlântico, é dominada pelo magnetismo especial do pôr-do-sol: um cenário que pode contemplar a partir de qualquer aldeia do litoral. Os aventureiros da costa talvez descubram pelo caminho algum embarcadouro recôndito, a partir do qual poderão deslocar-se – por vezes, a bordo de uma simples barcaça – até uma das ilhas que se avistam no horizonte.

No entanto, o acesso mais fácil e natural para o arquipélago das Hébridas é feito através da localidade de Oban e do seu terminal de ferries. As deliciosas sanduíches de salada de gambas servidas nas bancas de peixe dos arredores ajudam a passar o tempo enquanto espera para embarcar até ao microcosmos de ilhas, cada uma com o seu sabor particular, desde as cores vivas das casinhas de Tobermory, a minúscula capital portuária da ilha de Mull, às poéticas paragens agrestes e praticamente desabitadas de Jura, para onde George Orwell se retirou para escrever o seu mítico e distópico romance "1984".

CASTELO DE EILEAN DONAN
ISTOCK

6. O CASTELO DE EILEAN DONAN

A cereja em cima do bolo é a ilha de Skye, à qual se acede por uma ponte construída em 1995 com uma maravilhosa antecâmara: o castelo de Eilean Donan, imediatamente reconhecível por figurar nas imagens mais reproduzidas em calendários, canecas e todo o tipo de recordações turísticas. Erguida sobre um promontório na confluência de três lagos marinhos, esta imponente fortificação é, na verdade, a quarta versão do castelo original, do século XIII – embora as suas sucessivas reconstruções não a tenham despojado do sabor dos seus primeiros tempos.

A travessia pela ponte de Kyle of Lochalsh conduz à ilha que é, justificadamente, considerada “as Highlands em miniatura”, por reunir um compêndio dos atractivos das Terras Altas. A brumosa Skye aparece esculpida no sopé de cume rochosos, ribeiros e lochs, juntamente com uma costa delineada por baías e falésias onde, por vezes, se avista, solitária, uma das suas casinhas brancas.

MONTANHOSA ILHA DE SKYE
SHUTTERSTOCK

7. A IMPRESIONANTE E MONTANHOSA ILHA DE SKYE

O centro da ilha é dominado pela bela cordilheira ocidental das Cuillins – com efeito, são duas, Black Cuillin e Red Cuillin, separadas pelo vale Glen Sligachan –, cuja extensão de 77 quilómetros nos recorda que as Highlands apresentam a maior concentração de cumes do país. Aqui, imperam sobre um poderoso universo verde no qual se encontram espalhadas quintas isoladas, com os seus crofts ou parcelas de cultivo, rebanhos de ovelhas e as famosas vacas peludas das Terras Altas, caracterizadas pelos seus longos cornos e uma franja que lhes cobre os olhos.

Os ilhéus costumam falar a língua gaélica escocesa entre si, embora se dirijam sempre aos estrangeiros em inglês. Estão habituados a receber vagas de turistas que, mais cedo ou mais tarde, acabam por fazer uma pausa diante de um prato de salmão num dos restaurantes de Portree, o porto natural e capital da ilha. A honestidade escocesa obriga a identificar no menu se o peixe rosado provém de alto-mar ou se foi criado nas explorações da aquicultura das suas orlas costeiras.

DUNVEGAN
GETTY IMAGES

8. DUNVEGAN, CULTURA e PASsADO na ilhA DE SKYE

Skye é também sinónimo da história do povo escocês e dos seus clãs ancestrais, que detinham um enorme poder nas mãos dos chamados "Senhores das Ilhas". No castelo de Dunvegan, sede no Oeste da ilha do clã MacLeod durante 700 anos, revive-se o confronto entre eles e os seus eternos rivais, o clã MacDonald. Ironicamente, a decisão destes e de outros chefes – cujos apelidos designavam o seu corpo de guerreiros – de se unirem numa frente comum contra a coroa inglesa acabaria por aniquilá-los. Foi este o erro táctico dos clãs ao alinharem com os jacobitas (católicos das Highlands) e com o seu pretendente ao trono, Charles Edward Stuart, que resultou na sua derrota final na Batalha de Culloden, em 16 de Abril de 1746.

O cenário dessa batalha pode ser visitado em Inverness, num campo próximo, onde um centro de informação explica por que razão foi uma tragédia nacional. As terras dos clãs foram expropriadas pelos ingleses e, durante mais de um século, todos os sinais da cultura das Terras Altas foram suprimidos, incluindo o xadrez de lã (tartã) que os homens das Terras Altas usavam à volta da cintura, como um kilt.

CASTELO DE CAWDOR
SHUTTERSTOCK

9. O CASTELO DE CAWDOR

Continuando a desenrolar o fio da história, o castelo de Cawdor, situado nas proximidades, exibe as suas formas originais do século XIV – perfeitamente reabilitadas, onde a família herdeira da propriedade coabita com a habitual legião de visitantes. O local fascina com as suas ligações literárias com um William Shakespeare, cujo Macbeth é definido como “senhor de Cawdor”, embora o fosse apenas na ficção, pois a obra homónima foi escrita três séculos antes da construção do nobre edifício.

SPEYSIDE, distelaria
MACALLAN

10. SPEYSIDE: A ROTA PELAS MELHORES DESTILARIAS DE uísque DA ESCÓCIA

O Castelo de Cawdor faz parte de uma das rotas panorâmicas mais clássicas das Highlands que, no seu percurso desde Leste, ao longo da margem do rio Spey, conduz à terra natal das marcas de whisky mais famosas internacionalmente (Glenfiddich, Glenlivet, Macallan...). Dizem que seria possível atravessar todo o território das Highlands e as suas ilhas viajando de destilaria em destilaria, mas esta pequena área conhecida como Speyside conta com a maior densidade de todo o país. Até os abstémios podem ser seduzidos pela visita a uma das instalações que mostram em pormenor o processo de elaboração dos maltes, cujo sabor dependerá da turfa e da água mineral utilizadas, do processo de destilação e também do barril no qual repousará o líquido cor de âmbar.

CASTELO DE BALMORAL

11. DO CASTELO DE BALMORAL AO PARQUE NACIONAL DE CAIRNGORMS

A Rainha Vitória decidiu estabelecer uma das suas residências reais junto ao curso do rio Dee em 1852 e a sua tetraneta, Isabel II, seguiu a tradição, passando todos os Verões no castelo de Balmoral. Embora a grande casa de estilo baronial escocês só esteja aberta ao público entre Abril e Julho, as paragens desta zona, conhecida como Royal Deeside e salpicada por pequenas aldeias, têm oferta de sobra para os visitantes ao longo de todo o ano. São o domínio de cervos de tons avermelhados e armações majestosas, espaço para longos passeios junto à margem de um Dee infestado de salmões saltitantes e uma oportunidade de fazer um desvio rumo a rotas ousadas por entre as montanhas do Parque Nacional de Cairngorms.

O encontro anual ao qual o soberano britânico não pode faltar é os Highlands Games, que se celebram em relatório escocês entre Maio e Setembro. A rainha Isabel II e o seu filho escolhiam os “jogos” da localidade de Braeman, tal como a Rainha Vitória fez no seu tempo, devido à sua proximidade de Balmoral e porque Isabel II era sua patrona. Os escoceses dividem-se entre a multiplicidade de locais que celebram, ao ar livre, este grande conjunto de disciplinas atléticas, lançamento de pedras e troncos, concursos de gaita de foles e danças regionais. Um autêntico hino à cultura escocesa e celta, cuja finalidade histórica era recrutar os homens mais fortes e capazes de cada clã.

ILHA DE LEWIS
GETTY IMAGES

12. A LENDÁRIA ISLA DE LEWIS

As depressões suaves e férteis do Sudoeste das Highlands têm o seu verso no Noroeste distante, um território de vales perdidos, montanhas desnudas e lagos de águas escuras e revolvidas pelo vento. Até há poucos anos, o seu difícil acesso desencorajava uma exploração plena. Os visitantes ficavam-se por Ullapool, a principal localidade da região, em busca do ferry para a ilha de Lewis (Hébridas Exteriores) ou dos seus muitos trilhos de caminhada, terminando as noites em pubs com música ao vivo. Em 2015 foi inaugurada a estrada North Coast 500 para tentar os viajantes a aventurarem-se no último recanto das indómitas Terras Altas.

A ESTRADA 66 DA ESCÓCIA
ISTOCK

13. NORTH COAST 500, A "ROUT 66" DA ESCÓCIA

Desde o seu ponto de partida, no castelo de Inverness, esta estrada com 800 quilómetros (500 milhas) e uma única via, une as estradas que já existiam num único caminho que se estende ao longo da épica panorâmica da costa Oeste e o lado oriental, menos agreste. No sentido dos ponteiros do relógio, ao longo do arco da chamada NC500, sucedem-se a península de Applecross, algumas encantadoras e sinuosas portelas montanhosas, grutas que perfuram o litoral rochoso – a gruta de Smoo e a sua cascata interior são fenomenais – e as vertiginosas falésias de Cape Wrath, que marcam o ponto não-insular mais a Noroeste do país.

No troço setentrional da estrada, ladeado pelas povoações de Durness e John O’Groats, uma costa mais linear oferece praias de todos os tamanhos, que atraem os surfistas mais atrevidos com o seu clima muitas vezes inclemente. Se fosse preciso escolher apenas uma, a praia de Sinclair’s Bay, já no lado oriental deste marco marinho, impor-se-ia certamente, comas suas dunas de areia branca. Terra adentro, a paisagem é dominada por charnecas, turfeiras e intermináveis terras de cultivo. Aqui é mais do que normal encontrar ovelhas perdidas – ou rebanhos inteiros – acompanhadas por um dos escassos habitantes de aldeias insignificantes e pequenas quintas isoladas.

A paisagem em constante mutação do território mais recôndito da Escócia é agora um eixo turístico que os Highlanders caracterizam, sem pudores, como “a resposta escocesa à Route 66”, numa alusão à histórica estrada com quase 4.000 quilómetros que liga Chicago a Los Angeles, nos EUA. A North Coast 500 tem, evidentemente, muito menor magnitude, mas em contrapartida, aconchega uma das maiores áreas de natureza selvagem da Europa, argumentam orgulhosamente os escoceses.