Quando pensamos na Suíça, pensamos em montanhas, chocolate, vacas e, certamente, em cães de São Bernardo. Esta raça é um símbolo da Suíça e tornou-se muito popular, mas é relativamente recente: até ao século XIX não existiam os São Bernardo, mas sim o seu antepassado directo, o mastim dos Alpes, actualmente desaparecido.

A origem dos São Bernardo remonta a um desses mastins: um cão de resgate chamado Barry que viveu no início do século XIX na portela do Grande São Bernardo, que lhe deu o nome. Esta é a história de como um herói canino se transformou no pai de toda uma raça.

BARRY, o Salvador das montanhas

Para encontrar o “pai” da raça de São Bernardo devemos viajar até ao ano 1800, para um albergue de montanha na Portela do Grande São Bernardo, que separa o cantão suíço de Valais da região italiana de Valle de Aosta. Até à chegada dos caminhos de ferro, era por estas portelas montanhosas que se atravessava de um vale para o outro. Era, porém, uma travessia muito perigosa, sobretudo no Inverno, pois o tempo era imprevisível.

Albergue da Portela do Grande São Bernardo
SOUMEI BABA

 

Por esta razão, foram construídos albergues ao longo da rota, habitualmente habitados por monges, nos quais os viajantes podiam refugiar-se, comer e dormir. Também foram criados cães de montanha, os quais, graças ao seu olfacto, conseguiam encontrar os viajantes perdidos. Os preferidos eram os mastins dos Alpes, uma raça hoje desaparecida, caracterizada pela sua grande força, que fazia deles excelentes salvadores.

Um cão especialmente hábil em resgates, chamado Barry, nasceu em 1800 no albergue do Grande São Bernardo. Ao longo de mais de dez anos de serviço, salvou mais de 40 pessoas de morrerem congeladas nas montanhas. Os monges do albergue deram-lhe os apelidos de “Barry, o salvador” e “santo entre os santos” e, desde então, chamam Barry a um cachorro de cada geração em sua homenagem.

 

Aspecto provável de Barry segundo um desenho.
JAMES WATSON

AS Origens DO SÃO BERNARDO contemporâneo

Terminada a sua vida de serviço, aos 12 anos, Barry reformou-se em Berna, entregue aos cuidados de um dos monges do albergue, que decidiu criar os seus descendentes como cães de resgate. Foi assim que nasceu a raça que conhecemos actualmente como São Bernardo. Devemos salientar que Barry não tinha o aspecto dos São Bernardo actuais e era muito mais parecido com um mastim.

Um dos descendentes de Barry, já com diversas características da raça moderna.
CC

Um dos descendentes de Barry, já com diversas características da raça moderna.

Os descendentes de Barry foram cruzados com outras raças para conseguir as características ideais para o resgate nos Alpes: em particular, procurava-se uma pelagem mais densa, que pudesse proteger os viajantes da hipotermia. Como tal, foram cruzados principalmente com fêmeas de cão de água, devido à sua pelagem impermeável, e com raças musculadas e de grande porte – nas raças actuais, os parentes mais próximos dos São Bernardo são possivelmente os Terranova.

Com a introdução dos caminhos-de-ferro e do uso de dinamite para abrir túneis, a perigosa travessia pelas portelas de montanha deixou de ser necessária. Os cães de resgate foram perdendo gradualmente a sua função e o São Bernardo transformou-se num cão guardião e pastor, sendo utilizado sobretudo para vigiar o gado. O objectivo da criação passou a ser obter cães maiores e musculados para intimidarem mais os predadores e os ladrões.

O São Bernardo é um cão de raça gigante, corpo musculado e cabeça grande. Existem
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O São Bernardo é um cão de raça gigante, corpo musculado e cabeça grande. Existem duas variedades: a mais comum, de pêlo comprido, e outras de pêlo mais curto (Stockhaar).

Apesar disso, só na década de 1880 é que o São Bernardo foi oficialmente reconhecido como raça, paralelamente ao declínio do seu antepassado, o mastim dos Alpes. O primeiro cão registado oficialmente como São Bernardo foi um exemplar chamado León, inscrito em 1884 no Clube Suíço do Cão de São Bernardo, fundado nesse mesmo ano em Basileia. O seu sucesso foi tal que, em 1887, foi reconhecido como raça suíça e transformou-se no “cão nacional” do país.

DE cão de trabalho a MASCOTe

Como tantos outros cães criados “para trabalho”, como os Labradores e os Golden Retrievers, o São Bernardo não tardou a transformar-se num animal de estimação muito popular. O seu carácter amigável e manso, por vezes brincalhão, transformou-o num cão de companhia muito apreciado pelas famílias. Além disso, é muito protector, forte e extremamente leal, sendo por isso considerado um excelente “cão ama”.

São Bernardo Cão
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O São Bernardo é um excelente para cão conviver com crianças. Se houver outros cães em casa, deve ter em conta que o São Bernardo costuma ter uma personalidade dominante.

A sua passagem das montanhas para a cidade enfrentava um problema: o seu denso manto de pêlo. Por essa razão, foi desenvolvida uma linhagem paralela de São Bernardo de pêlo curto, ou pelo menos não tão espesso. Ambas as variedades são reconhecidas oficialmente pelos clubes de criação.

Também foram cruzados com outras raças para obter linhagens mistas, não reconhecidas oficialmente, que procuravam resolver alguns problemas de saúde próprios da raça: os São Bernardo são propensos a padecer de problemas de saúde relacionados com o esqueleto, como displasia da anca ou cancro dos ossos, devido ao seu elevado peso e rápido ritmo de crescimento nos primeiros meses de vida.

São Bernardo Cão 2
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Devido ao seu elevado peso e rápido crescimento, o São Bernardo é propenso a padecer de problemas de saúde relacionados com os ossos.

Até 2004, o albergue de Grande San Bernardo, onde Barry nasceu, ainda conservava cerca de 20 cães, embora apenas por nostalgia e como chamariz turístico, pois há décadas que não participavam em resgates. Nesse ano, a Fundação Barry, os criadores oficiais da raça, comprou os que restavam para continuar a criá-los. Hoje em dia, os seus descendentes participam em programas de terapia com animais. De certo modo, podemos dizer que a linhagem de Barry continua a salvar as pessoas, embora de maneira diferente.