Por vezes, fazer uma investigação implica caminhar até locais distantes, enfrentar animais selvagens e sobreviver a condições meteorológicas traiçoeiras. Outras vezes, podemos dar por nós a pentear delicadamente o pêlo de várias centenas de doninhas mortas. “As coisas que fazemos pela ciência, não é?”, diz Ted Stankowich, ecologista especializado em comportamento evolutivo da California State University, Long Beach.
Stankowich estuda o aposematismo, ou colorações de aviso, como as cores garridas que adornam as cobras-coral e as rãs venenosas da família Dendrobatidae. As doninhas-fedorentas, nativas de grande parte da América do Norte, têm uma das colorações mais reconhecíveis do planeta, com uma pelagem negra com riscas brancas que se estende desde a cabeça até à cauda. “Serve para avisar os predadores que têm defesa poderosa e fedorenta”, afirma.
No entanto, Stankowich e outros repararam em algo curioso nas doninhas-fedorentas: podem ter diferentes padrões, desde uma pequena mancha branca na cabeça a riscas brancas que se fundem num padrão semelhante a uma capa ou até ser completamente brancas ou completamente negras. Isto é estranho uma vez que, “quanto mais coerente for o sinal, mais o predador retém a imagem na sua cabeça” – e quer evitar-nos, diz.
Agora, um estudo publicado por Stankowich e os seus colegas na revista Evolution pode explicar a razão pela qual estes padrões variam – e como os seres humanos podem estar a influenciá-los.
Uma mudança nas riscas
Armadas com glândulas odoríferas capazes de esguichar secreções sulfúricas para os olhos de um predador, as doninhas têm a sorte de não ter tantos predadores naturais como outros mamíferos de tamanhos semelhantes.
Os seus inimigos costumam incluir leões-da-montanha, coiotes, jaguares e linces com fome suficiente para arriscarem os esguichos ou que encontram uma doninha com marcas que não comunicam devidamente a ameaça que representam. (Curiosamente, o bufo-da-Virgínia não tem o odor muito desenvolvido, diz Stankowich, e talvez essa seja uma das razões pelas quais abate mais doninhas do que a maioria dos outros predadores.)
Ao fotografar 749 doninhas-fedorentas em museus de todo o continente, Stankowich e os seus colegas tomaram nota de factores como o comprimento das riscas e a simetria dos padrões, comparando-os posteriormente com outras variáveis, como os ambientes onde os animais viviam e os seus potenciais predadores. No final, confirmaram um palpite.
“Em zonas onde existe um elevado risco de predadores, sejam aves ou mamíferos, encontramos um animal muito mais coerente, tradicionalmente negro com duas riscas brancas compridas no corpo”, diz Stankowich.
“Mas a coisa mais interessante que queríamos descobrir – e que efectivamente descobrimos – foi que, à medida que o risco de predadores diminui, começa a haver muito mais variações nas riscas das doninhas”, diz. Isto faz sentido porque, se não houver tantos predadores, há menos probabilidades de as proeminentes riscas de aviso serem transmitidas às gerações vindouras.
“Esses animais com padrões menos frequentes podem transmitir mais cópias dos seus genes menos frequentes à próxima geração, obtendo-se assim uma variação cada vez maior nos padrões das riscas”, diz Stankowich.
Jim Barnett, ecologista comportamental da universidade de Trinity College Dublin, na Irlanda, diz que os estudos sobre as cores de aviso dos animais incidem frequentemente em pequenas áreas geográficas ou na forma como predadores específicos interagem com presas específicas. É por isso que está impressionado com o alcance continental do novo estudo.
“Estudos como este transmitem-nos a ideia de que temos um mosaico de pressões de selecção na América do Norte”, diz Barnett, que não participou no estudo.
COREY ARNOLD, COREY, NAT GEO IMAGE COLLECTION
Uma doninha entra pelo buraco de uma vedação entre uma floresta e um campo de golfe.
Os seres humanos não estão a ajudar
Desde que se começou a caçarou eliminar predadores dos EUA, desde leões-da-montanha a lobos, é lógico perguntar se os seres humanos serão os responsáveis por as doninhas começarem a parecer-se menos com doninhas. “Não quero chegar ao ponto de dizer que os seres humanos são a causa desta variação devido à eliminação de predadores”, diz Stankowich, “mas não estamos certamente a ajudar”.
O ecologista diz, por exemplo, que o estudo avançou uma ligação entre a existência de menos predadores e a variação de riscas nas doninhas – não uma relação de causalidade. E como os espécimenes conservados em museu representam apenas doninhas dos últimos 100 anos, é difícil chegar a quaisquer conclusões sobre padrões no longo prazo. “Existe uma história complexa de grandes mega predadores na América do Norte que já não existem”, diz Stankowich. “Por isso, é difícil saber como era a paisagem dos predadores há mil anos e como isso poderá ter afectado a forma como as doninhas são hoje.”