Desde passeios em pranchas de paddle sobre águas cristalinas a festivais de pirilampos cintilantes, há entusiastas da natureza que viajam pelo globo para ver a bioluminescência. Contudo, este fenómeno apelativo, mais prevalente no Verão, não é o único espectáculo hipnotizante de luzes proporcionado pelo reino animal.

Alguns viajantes estão a descobrir o vasto – e muitas vezes secreto – mundo da biofluorescência do oceano, uma paisagem marinha onde os peixes brilham em tons de verde-limão, os corais revelam tons de néon e os cavalos-marinhos iridescentes podem ser confundidos com seres extraterrestres.

Qual é porta de entrada? O mergulho fluorescente, uma actividade que outrora estava reservada para os biólogos marinhos. “É como se estivéssemos num planeta diferente”, diz Alisha Postma, mergulhadora de longa data e cofundadora do blog de mergulho Dive Buddies 4 Life.

David Gruber, Explorador da National Geographic, descobre uma tartaruga marinha biofluorescente perto das Ilhas Salomão em 2015.

Tal como acontece com muitos fenómenos marinhos, a biofluorescência também pode ser algo de um planeta diferente. Mais de 80% do oceano nunca foi explorado e, de acordo com a NASA, sabemos mais sobre a superfície lunar do que sobre o fundo dos nossos oceanos. Mas estamos apenas a dar os primeiros passos na compreensão de tópicos como a biofluorescência oceânica.

Os cientistas começaram a ficar mais atentos a este fenómeno na última década, diz David Gruber, biólogo marinho e Explorador da National Geographic. David Gruber tem liderado vários esforços sobre este tema, incluindo um estudo feito em 2019 que descobriu como é que os animais criam estes efeitos brilhantes através de moléculas que antigamente eram desconhecidas da ciência. David também trabalhou num estudo em 2014 que revelou que a biofluorescência é generalizada entre mais de 200 espécies de peixes. A sua investigação também mostra que alguns tubarões e até répteis, incluindo tartarugas marinhas, conseguem brilhar no escuro – uma descoberta revolucionária que foi considerada pela National Geographic uma das 20 principais descobertas da década de 2010.

coral com biofluroscência

Sem um filtro amarelo para bloquear a luz azul, os humanos não conseguem ver as cores néon deste coral no Mar Vermelho.

De acordo com David Gruber, os mergulhos fluorescentes e de snorkel fazem com que até os recifes e pontos de mergulho mais familiares pareçam lugares novos. “As pessoas que pensam que viram o oceano e que o conhecem bem, ficam de repente encantadas”, diz David, sublinhado que este vislumbre, com as suas cores fantásticas, não serve apenas para saciar a nossa curiosidade. “Estes animais estão a partilhar um segredo connosco”, diz David Gruber, e que é da nossa responsabilidade usar este conhecimento para os proteger.

O que é biofluorescência?

A logística de um mergulho nocturno é bastante simples: “Colocamos uma máscara amarela, depois acendemos a nossa luz azul e, de repente, sobretudo num recife de coral, a luz acende-se por completo”, diz David Gruber. Mas as razões para isto acontecer são um pouco mais complexas.

Tal como os animais ouvem o mundo de formas diferentes – por exemplo os morcegos, que comunicam através de frequências que vão para além do nosso alcance auditivo – também veem o mundo de maneira diferente.

No caso da biofluorescência, os comprimentos de onda azuis da luz atingem a superfície de um animal e são emitidos com uma cor diferente, geralmente verde, laranja e vermelho. Isto é diferente da bioluminescência, onde criaturas como medusas e pirilampos geram a sua própria luz através de uma reação química.

biofluroscência

O biólogo marinho David Gruber reparou pela primeira vez na biofluorescência em peixes quando uma enguia verde (semelhante à da fotografia) apareceu nas imagens que David e os seus colegas estavam a captar de corais biofluorescentes.

O oceano adiciona outra camada de complexidade a este fenómeno. Os humanos conseguem ver a luz em tons de vermelho, verde e azul, mas a nossa visão vacila debaixo de água. À medida que nos aprofundamos no oceano, alguns comprimentos de onda de cor no espectro de luz visível são filtrados. Por volta dos 6 metros de profundidade, o vermelho desaparece. Aos 30 metros, fica praticamente tudo azul e verde até atingirmos a “zona da meia-noite” sem luz, a cerca de 900 metros de profundidade.

Mais perto do fundo do mar, muitos animais marinhos evoluíram para ter filtros amarelos nos olhos que os ajudam a detetar biofluorescência noutros peixes. Os humanos, porém, precisam de equipamentos especiais, como filtros amarelos para as máscaras e luzes azuis de mergulho, para ver estas criaturas a brilhar em cores caleidoscópicas debaixo de água.

Descubra este mundo secreto

O chamado mergulho fluorescente pode parecer uma expedição exótica, mas está cada vez mais disponível nos centros de mergulho pelo mundo inteiro, de acordo com Eric Albinsson, da Associação Profissional de Instrutores de Mergulho (PADI), a autoridade global de mergulho. Eric Albinsson diz que qualquer lugar com “mares tropicais e corais saudáveis” é o ideal. Ao contrário da bioluminescência, que é mais prevalente no Verão, os viajantes podem ver a biofluorescência durante o ano inteiro.

O único requisito para fazer mergulho fluorescente é a certificação padrão da PADI para águas abertas, e o curso de especialização em mergulho nocturno desta organização confere uma segurança adicional na escuridão. No mínimo, é aconselhável experimentar primeiro alguns mergulhos nocturnos com as habituais luzes brilhantes da tocha (tanto para fins de segurança como para proteger as espécies mais frágeis). “Não queremos andar para cima e para baixo a perturbar o fundo [do oceano]”, diz Alisha Postma, que fez várias viagens de mergulho fluorescente em Bonaire, uma ilha nas Caraíbas.

biofluroscência

Um peixe-caracol, a primeira espécie biofluorescente encontrada no Ártico, brilha em tons de verde e vermelho, um exemplo raro de várias cores fluorescentes num animal.

A ilha de Bonaire, mais conhecida pelos seus recifes impressionantemente saudáveis (mas cada vez mais ameaçados), tem ficado famosa como um ponto de mergulho fluorescente. Este foi um dos primeiros destinos a oferecer este tipo de experiência aos mergulhadores amadores, segundo a PADI. Lars Bosman, do Buddy Dive Resort, organização sediada em Bonaire, diz que esta actividade permite aos mergulhadores ver criaturas que, de outra forma, seriam impossíveis de ver durante o dia, como anémonas ou peixes que se escondem na areia no fundo do oceano. Um estudo feito na Austrália mostra que as espécies bem camufladas do oceano, conhecidas por “peixes crípticos”, têm até 70 vezes mais propensão para brilhar do que as criaturas mais visíveis.

Nos últimos anos, destinos como a Tailândia e as Maldivas têm disponibilizado esta experiência colorida para as pessoas que não praticam mergulho através do chamado snorkeling fluorescente. “Alguns recifes nas Maldivas são bastante rasos, portanto o mergulho snorkel fluorescente pode ser tão agradável quanto o mergulho fluorescente”, diz Ahmed Mujthaba, proprietário da Mujavaz Scuba and Travels. Ahmed Mujthaba diz que a distância da poluição luminosa torna os tons biofluorescentes mais vibrantes.

Explore e depois proteja

Quer seja um mergulhador fluorescente que faz a sua primeira expedição ou um biólogo marinho experiente, certamente vai sair desta experiências com novas perguntas sobre o oceano. “É como um romance de mistério que fica cada vez mais complexo”, diz David Gruber.

David Gruber reparou pela primeira vez na biofluorescência em peixes quando uma enguia verde foi vista na sua pesquisa fotográfica de corais biofluorescentes. Na última década, os cientistas encontraram evidências de biofluorescência em mais de 200 espécies de peixes, incluindo em duas espécies de tubarão-gato e tartarugas marinhas. Contudo, como tem sido feita pouca investigação sobre as razões que levam estes animais marinhos a brilhar, os cientistas têm mais perguntas do que respostas. As teorias prováveis para os usos da biofluorescência incluem a comunicação entre espécies, encontrar parceiros, camuflagem de predadores e caçar presas.

Para desvendar estes mistérios e compreender melhor como é que a luz os afeta, David Gruber e a sua equipa desenvolveram câmaras que imitam os olhos de animais marinhos biofluorescentes, para ver o mundo do ponto de vista destes animais. Quando descobriram a biofluorescência num tubarão-gato, criaram uma câmara equipada com filtros especiais para simular a forma como a luz atinge os seus olhos. Este processo revelou duas informações importantes: os tubarões-gato veem a biofluorescência verde que eles próprios emitem e conseguem aumentar o contraste dos seus padrões fluorescentes.

Esta investigação não é apenas importante para a ciência; também está a pavimentar o caminho para práticas de conservação mais inteligentes. Afinal de contas, quanto mais soubermos sobre a vida marinha, melhor a conseguimos proteger.

Alguns lugares de mergulho para ver a biofluorescência no oceano

Flórida:
A loja de mergulho Pura Vida Divers, perto de West Palm Beach, oferece mergulhos nocturnos temáticos, incluindo mergulhos fluorescentes, durante o ano inteiro.

Bonaire: Mergulhe na fluorescência alucinante de Bonaire através de uma visita com a Buddy Dive Shop, que organiza viagens durante todo o ano.

Tailândia: A Blue Horizon Divers organiza sessões de mergulho fluorescente e passeios de snorkel a partir Ko Pha-Ngan, uma ilha no Golfo da Tailândia.

Maldivas: Ahmed Mujthaba coordena expedições de mergulho, incluindo mergulhos fluorescentes, nas Maldivas através da Mujavaz Scuba and Travels. A Blue Journeys, no Park Hyatt Maldives, oferece mergulhos fluorescentes e passeios de snorkel ao longo do recife da propriedade.

 

A National Geographic Society, comprometida em iluminar e proteger as maravilhas do nosso mundo, financiou o trabalho de David Gruber.

Stephanie Vermillion é jornalista de viagens e actividades ao ar livre, cineasta e fotógrafa. Pode acompanhar as suas aventuras no Twitter e Instagram.


Este artigo foi publicado originalmente em inglês no site nationalgeographic.com

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