Lá vêm eles, batendo as asas numa pulsação desenfreada. Os corpos formam manchas pretas e brancas, com pinceladas cor de laranja dos seus bicos exageradamente grandes, como que saídos de um desenho animado. Vazias e escuras durante meses, as falésias são perturbadas por grande alvoroço no início de Abril com a chegada do bizarro e adorável papagaio-do-mar.

É a mais pequena das quatro espécies de papagaios-do-mar e chega em massa para se reproduzir nas ilhas e costas da Grã-Bretanha. Ninguém sabe como e onde a Fratercula arctica (“fradinho do Árctico” numa tradução literal, assim denominado devido ao carapuço negro, de aspecto monástico) passa o resto do ano. Os animais andam algures nos vastos mares do Norte, solitários, raramente avistados, enquanto voam, comem e flutuam.

A reprodução é o único pretexto destas aves marinhas para ir a terra. Tornam-se intensamente sociais, cortejando, acasalando, lutando. O tamanho dos bandos varia entre algumas centenas de casais, no Maine (EUA), a dezenas de milhares na Islândia. As Ilhas Britânicas, onde o fotógrafo Danny Green trabalhou, atraem cerca de 10% de um total estimado de vinte milhões de papagaios-do-mar. Embora ninguém conheça o número exacto da população, estima-se que a Islândia albergue quase metade.

Os papagaios-do-mar mudam de roupa durante a época de acasalamento. Os bicos ficam mais grossos e brilhantes, penas brancas substituem as pretas e os olhos ficam enfeitados. Depois de emparelharem, frequentemente com o mesmo parceiro de anos anteriores, os papagaios-do-mar utilizam o bico e as patas com membranas para escavar um ninho no solo macio. Noutros locais, nidificam entre rochas e pedregulhos. As fêmeas põem ovos que são incubados, por turnos, sob as asas do macho e da fêmea. Eles também partilham os deveres relacionados com a alimentação: a fêmea faz a maioria das viagens, correndo até à água e regressando com o bico cheio de peixes, determinada a evitar gaivotas, mandriões-grandes e outros piratas do ar.

Uma colónia de papagaios-do-mar é quase sempre silenciosa. Nas Ilhas Britânicas, onde não são caçadas há um século (a caça ainda é legal na Islândia), as aves podem ser incrivelmente dóceis, tolerando visitantes humanos. 
Segundo Iain Morrison, que acompanha ornitólogos amadores às ilhas escocesas de Treshnish, é óbvio que “o convívio com papagaios-do-mar torna os humanos felizes. Chamo-lhe a terapia do papagaio”.

A maioria das populações tem vindo a diminuir na última década. Em alguns anos, certas colónias da Islândia e da Noruega quase não geraram juvenis. Os pequenos peixes preferidos pelos papagaios-do-mar, como galeotas, espadilhas e arenques, estão a escassear e o tamanho das capturas tem vindo a diminuir. O aquecimento da água parece afectar a cadeia alimentar.

Mike Harris estuda a colónia da ilha de May (Escócia) e crê que “os papagaios-do-mar estão com dificuldades em criar pintos.” Vivendo em média até aos 30 anos, os papagaios-do-mar “podem dar-se ao luxo de interromper o ciclo de reprodução durante alguns anos, até as condições melhorarem. Contudo, a longa duração deste período vai afectar toda a população”.

Entretanto, existem motivos para comemorar, como na ilha de Skomer, no País de Gales. Por razões ainda não totalmente conhecidas, o número de papagaios-do-mar está a aumentar. Vários ninhos estão cheios. Com a chegada de Agosto, as crias partem, como sempre, bamboleando-se pelas encostas íngremes abaixo até nadarem e voarem para longe, enfrentando vários meses de frio sozinhos. Conhecem o caminho de volta. E para um papagaio-do-mar, é impossível resistir à atracção de uma multidão na Primavera.

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