Conhecem-se poucos animais que atirem coisas. Um número ainda mais pequeno – que agora inclui o Octopus tetricus – atiram-nas contra outros animais.
O polvo Octopus tetricus tem uma forma singular de defender as suas fronteiras. Se outra criatura se aproximar demasiado, este polvo reage atirando coisas, afirma um novo estudo publicado recentemente na revista PLOS ONE.
Nativo dos mares subtropicais ao largo da Nova Zelândia e da costa oriental da Austrália, estes cefalópodes foram recentemente capturados em vídeo a arremessarem conchas, sedimentos e algas contra intrusos que se aventuraram demasiado perto dos seus covis – é a primeira vez que um comportamento de arremesso foi relatado entre polvos. Os alvos do O. tetricus incluíam diversos peixes, câmaras subaquáticas e até outros polvos.
Embora os cientistas não tenham a certeza daquilo que motiva este comportamento, poderá ter algo a ver com “o equivalente a espaço pessoal para os polvos”, diz Peter Godfrey-Smith professor da Universidade de Sydney, na Austrália, e autor principal do estudo.
Agressão a curta distância
Godfrey-Smith e os seus colegas reuniram dezenas de horas de filmagens de polvos junto aos seus covis na Baía de Jervis, na Austrália e, entre 2015 e 2016, observaram mais de cem ocasiões em que os cefalópodes atiraram conchas e limo. Como os polvos são abundantes, mas o espaço é limitado na Baía de Jervis, estes animais normalmente solitários são obrigados a viverem perto uns dos outros, diz Godfrey-Smith: “Neste local vemos muitos toques com os tentáculos, apalpação, algumas lutas e coisas assim.”
Cerca de metade dos ataques de arremesso captados em vídeo por Godfrey-Smith e os seus colegas parecem ser resultado de um polvo invadir o território de outro e 17% destes ataques atingiram o invasor. Embora seja difícil determinar a intenção de um animal, “acho provável que alguns destes golpes sejam deliberados”, diz Godfrey-Smith.
Nos outros casos, os polvos foram observados a fazerem uso das suas capacidades de arremesso para atirarem conchas e restos de comida para fora dos seus covis.
Um arremesso de alta intensidade de um polvo lança uma mistura de limo e algas. Captura de Ecrã de Peter Godfrey-Smith, David Scheel, Stephanie Chancellor, Stefan Linquist, Matthew Lawrence.
Projectéis a jacto
Para fazerem estes arremessos, os polvos agitam os detritos com os seus tentáculos e atiram-nos em direcção ao alvo com um jacto de água potente disparado pelo seu sifão – uma estrutura tubular que usam para bombear água para fora dos corpos. Usando esta técnica, os cefalópodes podem atirar materiais a distâncias equivalentes a vários corpos.
Os polvos podem mudar a cor da sua pele para se camuflarem ou comunicarem, estando as cores escuras geralmente associadas à agressão. Os investigadores observaram que os indivíduos de cores escuras tendem a arremessar objectos com mais força e têm mais probabilidades de atingir outros polvos. Também notaram que os polvos apanhados na linha de fogo reagiam frequentemente esquivando-se ou levantando um tentáculo em direcção ao agressor.
Nos vídeos reunidos pelos investigadores, os polvos pareciam ajustar o seu ângulo de arremesso e grau de força ao atirarem objectos contra membros da própria espécie. E em ataques polvo-a-polvo, a artilharia mais popular era limo.
Clube anti-social
Embora atirar coisas contra os outros possa não ajudar os seres humanos a resolverem os seus problemas, no caso dos polvos este comportamento pode ajudar a gerir interacções sociais quando os indivíduos vivem em grande proximidade”, diz Chelsea Bennice, ecologista marinha da Florida Atlantic University. Arremessar conchas e lançar explosões de limo contra os outros pode ser a forma de estes polvos defenderem o seu território ou avisar potenciais parceiros que não estão interessados.
Por exemplo, os investigadores viram uma fêmea de polvo atingir o seu vizinho macho com limo cinco vezes, ao longo de aproximadamente quatro horas, depois de este ter feito várias tentativas falhadas de acasalar com ela.
Independentemente daquilo que motiva este comportamento, o facto de estes polvos o adoptarem distingue-os da maioria dos animais. Apenas um pequeno número de animais arremessa objectos. Um número ainda mais pequeno – todos eles mamíferos altamente sociais – são conhecidos por escolherem outros animais como alvo quando os arremessam.
De um modo geral, pensava-se que os polvos viviam vidas solitárias. No entanto, a descoberta de que os Octopus tetricus são atiradores subaquáticos é uma de várias revelações recentes sobre a vida social dos polvos e sugere que estas criaturas altamente inteligentes podem ser mais sociais do que se pensava.
“Com o avanço da tecnologia, conseguimos captar mais informação sobre o mundo subaquático e compreender os comportamentos fascinantes do invertebrado mais inteligente”, diz Bennice. “Estou ansiosa por ver o que os próximos vídeos podem revelar”.