Concebidos para a sobrevivência, os ovos de insecto fixam-se e eclodem em qualquer sítio onde os seus progenitores os depositem.

Nota: Os ovos desta reportagem têm 0,7 a 2mm de diâmetro. As imagens foram captadas com um microscópio electrónico de varrimento, que utiliza feixes de electrões para acompanhar a superfície dos objectos. As imagens a preto e branco foram posteriormente coloridas para corresponder ao aspecto natural dos ovos.

Enganamo-nos quase todos os dias. Imaginamos que a Terra é nossa, mas ela pertence-lhes. Mal começámos ainda a contar quantas espécies existem. Mesmo nos quintais urbanos, reviramos um tronco e surgem novas formas de vida. seja qual for a perspectiva através da qual os observemos, somos nós os seres invulgares, estranhos aos seus modos de vida. 

Enquanto os monstros vertebrados apareciam e desapareciam, os insectos continuaram a acasalar e a pôr ovos, povoando pântanos, árvores e solo. Fala-se na era dos dinossauros, na era dos mamíferos; no entanto, desde que o primeiro animal pôs o pé sobre terra, todas as épocas têm sido também eras dos insectos, de acordo com todos os critérios razoáveis. 


 

Sabemos, em parte, o que torna os insectos diferentes. Os primeiros animais tratavam das suas crias, tal como faz a maioria dos seus descendentes, sejam eles aves, répteis ou mamíferos. Levavam-lhes alimento e lutavam para os proteger. A maior parte dos insectos abandonou este comportamento em prol de um estilo de vida mais moderno.

Os insectos desenvolveram ovos endurecidos e, com eles, uma estrutura especial, denominada ovipositor, utilizado por alguns para enterrar os ovos em qualquer superfície. As aves esforçam-se por encontrar bons locais de nidificação, mas os insectos desenvolveram a capacidade de transformar qualquer coisa (madeira, folhas, terra, água e até corpos) em berçário. Se existe uma característica que assegura a diversidade e o sucesso dos insectos é o facto de eles poderem abandonar as crias e elas conseguirem sobreviver, graças àqueles ovos. 

A princípio, eram simples, lisos e redondos. No entanto, ao longo de 300 milhões de anos, os ovos dos insectos tornaram-se tão variados como os locais onde os seus donos reinam. Alguns ovos parecem-se com terra. Outros assemelham-se a plantas. Quando os vemos pela primeira vez, podemos nem saber o que são. Possuem formas invulgares e embelezadas com adornos e apêndices. Alguns ovos respiram através de tubos ascendentes, que emergem da água. Outros balouçam, pendurados em caules sedosos. Outros ainda vagueiam com o vento ou apanham boleia sobre a região dorsal de moscas ou outros insectos. Alguns são tão coloridos como pedras, em tons azul-turquesa, cinzento-escuro e âmbar. É vulgar terem espinhos, manchas, hélices e riscas.

No entanto, o essencial do modo de funcionamento dos ovos de insecto é já conhecido. O ovo desenvolve-se no interior da casca (cório), ainda dentro do corpo da progenitora.
O esperma tem de encontrar e nadar através de uma abertura numa das extremidades do ovo, o micrópilo. Aguarda esta oportunidade no interior da fêmea, esperando por vezes anos. Um espermatozóide bem sucedido fertiliza cada ovo e esta união produz o início indiferenciado de um animal, aninhado dentro de uma membrana parecida com um útero. Aqui, formam-se os olhos, as antenas, as peças bucais e tudo o resto. À medida que isso acontece, a criatura respira utilizando os aerópilos do ovo, através dos quais o oxigénio é captado e se difunde até ao interior e o dióxido de carbono é expelido para o exterior. Tudo isto ocorre numa estrutura geralmente do tamanho de um grão de açúcar mascavado e é tão inacreditável como vulgar. Na verdade, foi assim que a maioria dos animais que já viveu à face da Terra começou a sua existência.

Aquilo que o leitor vê nas páginas desta reportagem são os ovos de alguns pequenos ramos da árvore genealógica dos insectos. Contam-se entre eles os de algumas borboletas que enfrentam desafios extraordinários para se defenderem dos predadores e, por vezes, das plantas sobre as quais são depositados. Algumas flores de maracujá transformam parte das suas folhas em formas que se assemelham a ovos de borboleta. Ao verem os “ovos”, as borboletas progenitoras avançam para outras plantas onde possam depositar as suas futuras crias. Este tipo de mimetismo é imperfeito, mas, felizmente para as plantas, a visão das borboletas também o é.

Os ovos também precisam de evitar que os ovos de outro tipo de insectos, os parasitóides, sejam depositados no seu interior. Os himenópteros e os dípteros parasitóides utilizam longos ovipositores para introduzir os seus ovos dentro dos ovos e dos corpos de outros insectos. Cerca de dez por cento de todas as espécies de insectos são parasitóides. É um estilo de vida que recompensa, atormentado apenas pela existência dos hiperparasitóides, que depositam os seus ovos no interior do corpo dos parasitóides enquanto estes se encontram dentro dos corpos ou dos ovos dos seus próprios hospedeiros. Em virtude deste teatro da vida, muitos ovos e lagartas de borboletas acabam por transformar-se em himenópteros. Até os ovos mortos e preservados, como os destas páginas, podem albergar mistérios. Dentro de alguns, estão jovens borboletas, mas outros podem conter himenópteros ou dípteros que já tenham devorado a sua primeira refeição que terá sido também a última.

De tempos a tempos, um grupo de insectos regride ligeiramente e torna-se activo nos cuidados parentais. Os ovos destes insectos voltam a ser incaracterísticos e redondos e, como tal, tornam-se mais vulneráveis. E, contudo, sobrevivem. Talvez sejam a vanguarda da etapa seguinte, do próximo reino a iniciar a sua ascensão.

Os insectos eclodem dos seus ovos há centenas de milhões de anos. Isso acontece neste preciso instante, por todo o lado, à sua volta. Se estiver atento, quase conseguirá ouvir a casca a rachar enquanto eles, com as suas seis patas minúsculas, fazem a sua entrada neste mundo.