No interior do Alentejo, o Verão é sempre quente e seco e é no Inverno que se concentra a cada vez mais escassa precipitação. As albufeiras, açudes e ribeiras são ímanes que atraem patos ou aves limícolas de outras latitudes, bem como garças, mergulhões, corvos-marinhos e mamíferos que para ali convergem à procura de água ou alimento. Foi rodeado por esta paisagem de planícies e montados que cresceu Ricardo Lourenço.
Na faculdade, interessou-se pela fotografia e adquiriu a sua primeira câmara numa promoção de supermercado. Fotografava tudo – os amigos, a arquitectura e, claro, a natureza que o rodeava. Em pouco tempo esgotou o potencial daquela câmara. Os animais selvagens foram-se tornando o seu tema de eleição. No início, motivava-se por coleccionar “cromos” do maior número de espécies possível, mas, à medida que acumulava conhecimento sobre os hábitos e a ecologia das espécies, passou a focar-se nos comportamentos e nas composições originais e esteticamente apelativas. Fez as primeiras experiências com um esconderijo e, apesar do enorme potencial que este revelou, aborrecia-o o desconforto da posição e a impossibilidade de variar os pontos de vista.
Descobriu por essa altura que noutras paragens alguns fotógrafos utilizavam esconderijos flutuantes. Deitou mãos à obra e construiu o seu primeiro protótipo. Foi como “se num jogo de computador tivesse encontrado uma chave que me deu acesso a outro nível”, diz. Com a experiência, introduziu melhorias nos esconderijos (já vai no quinto). O esconderijo flutuante foi uma escola que o ensinou a reconhecer e a antecipar os comportamentos dos animais, a ser paciente e a perseverar em condições adversas. Estes ensinamentos foram inestimáveis no seu mais ambicioso projecto de fotografar em absoluta liberdade e cobrindo todo o ciclo de vida daquele que é provavelmente o mais esquivo animal da nossa fauna – o lince-ibérico.
Por ora, os patos estão a chegar e o esconderijo flutuante estará em breve de novo na água.
No início, o fotógrafo navegava com o seu esconderijo utilizando botas altas de borracha, mas, depois de apanhar um susto numa zona sem pé, optou pelo fato de neoprene. Hoje, tem três fatos diferentes para as várias estações do ano.