Ao percorrer a lista de vídeos no TikTok, os seus filhos provavelmente encontram piadas idiotas, vídeos dobrados... e muitas, muitas roupas. Isto porque os chamados vídeos “haul” – vídeos onde um influenciador abre pacotes cheios de roupa nova e exibe-a em frente à câmara – estão por todas as redes sociais.

No TikTok, os vídeos “#haul” já acumularam 13.2 mil milhões de visualizações; no Instagram, esta hashtag aparece em 2.5 milhões de publicações. Qualquer pai ou mãe que já tenha lidado com uma criança a implorar por roupas novas – porque viu nas redes sociais – sabe como pode ser difícil argumentar contra um influenciador.

Mas as crianças provavelmente não estão cientes do impacto ambiental que estes vídeos podem ter. Este tipo de conteúdo geralmente apresenta o que é conhecido por fast fashion: roupa vistosa produzida em massa e de forma barata, com tecidos feitos a uma velocidade vertiginosa por trabalhadores explorados. Na verdade, um relatório da organização Rest of World, uma organização de jornalismo sem fins lucrativos, descobriu que entre Julho e Dezembro de 2021 a empresa de fast fashion Shein adicionou diariamente entre 2.000 e 10.000 novos estilos à sua aplicação.

Os vídeos de moda já são virais no YouTube desde pelo menos 2008, portanto, qual é o problema? Segundo Aja Barber, consultora de sustentabilidade e autora de Consumed, livro que explora o impacto da fast fashion no ambiente, estes tipos de conteúdos incentivam um modelo de consumo que está a afetar o planeta. De facto, uma investigação da empresa de consultoria McKinsey & Company mostra que os consumidores estão a comprar cerca de 60% mais roupa por pessoa do que em 2000 e que os itens são mantidos apenas metade do tempo. A produção acelerada de enormes quantidades de produtos baratos também tem impactos ambientais, desde o cultivo de matéria-prima até ao transporte de mercadorias e incineração de resíduos.

“Vemos vídeos no TikTok em que alguém compra milhares de dólares em mercadoria de uma marca, e vem uma caixa enorme cheia de coisas que provavelmente só vão usar uma vez”, diz Aja Barber. Por outro lado, as crianças também costumam replicar as tendências que veem nas redes sociais, incluindo compras de roupa que impactam o ambiente. Descubra como pode conversar com as crianças sobre os seus feeds (secção principal das redes sociais na qual aparecem as publicações dos outros utilizadores) – e sobre o impacto ambiental que podem estar a guardar nos armários.

O custo ambiental da moda

É difícil descortinar os números exactos em torno da indústria da moda. Mas o Fórum Económico Mundial estima que anualmente são produzidas cerca de 150 mil milhões de novas peças de vestuário, e as Nações Unidas informam que o uso intensivo de energia na produção, embalamento e transporte de todo este vestuário gera quase 10% das emissões globais de dióxido de carbono.

Embora toda a produção de moda tenha algum tipo de impacto ambiental, Aja Barber diz que o ritmo extremamente veloz e a enorme escala da chamada fast fashion exacerbam ainda mais os problemas.

O ciclo de desperdício da fast fashion começa muitas vezes na matéria-prima. Um estudo publicado na revista Nature descobriu que o poliéster – uma fibra sintética barata feita de petróleo – fazia parte de 51% da produção têxtil de moda em 2018, sendo geralmente o tecido preferido dos fabricantes de fast fashion. Quando são lavadas, as roupas de poliéster libertam centenas de milhares de minúsculas fibras de plástico, que acabam no ambiente através das águas residuais. Investigadores do Instituto de Polímeros, Compósitos e Biomateriais estimam que 35% dos microplásticos presentes no oceano pertencem a roupas sintéticas.

Mover estes materiais através de uma cadeia de abastecimento global que depende de mão de obra barata também tem custos nas emissões. Por exemplo, uma matéria-prima como o algodão pode ser cultivada no Paquistão, enviada para a China para o fabrico dos têxteis e, de seguida, enviada novamente para o Bangladesh para ser costurada em roupa.

Por fim, a roupa é transportada para os consumidores no mundo inteiro. Antigamente, a maioria do vestuário era enviada para as lojas em navios de contentores, mas como a fast fashion depende da criação de novas tendências o mais depressa possível, os envios de carga aérea estão a tornar-se cada vez mais comuns. Um relatório do grupo de consultoria ambiental Quantis estima que a passagem de apenas 1% dos transportes de roupa dos navios para os aviões pode aumentar a pegada de carbono desta indústria em 35%.

Como este tipo de moda é projetado para ser descartado após algumas utilizações – não só porque a roupa é feita de materiais menos resistentes, mas também porque sai rapidamente de moda – grande parte deste vestuário acaba incinerado ou em aterros sanitários. Nos Estados Unidos, em 2018, mais de 9 milhões de toneladas de roupa e calçado acabaram em aterros sanitários, contrastando com os 1.3 milhões de toneladas registadas em 1960, de acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos EUA. E as roupas fast fashion que são doadas a instituições de caridade são normalmente enviadas para países de baixo ou médio rendimento, onde acabam por ser colocadas em aterros ou incineradas, de acordo com informações avançadas pela ABC.

Como fazer com que as crianças se importem com a roupa e o planeta

Os membros da Geração Z e Alfa (com idades entre os 12 e os 26 anos e crianças com 11 anos ou menos, respectivamente) são conhecidamente apaixonados pelas questões ambientais, participando em ações que vão desde greves escolares climáticas à instauração de processos legais ambientais. Assim sendo, porque é que não podem abdicar da chamada cultura fast fashion?

Aja Barber acredita que as crianças e os adolescentes ainda não conseguem compreender na totalidade o impacto que a moda tem no ambiente. “Creio que um jovem não percebe que, por exemplo, o poliéster é plástico e que vem dos combustíveis fósseis. Quando falamos em resíduos plásticos, as pessoas pensam em embalagens para alimentos, não pensam em moda.”

E é difícil resistir à tentação de todas aquelas roupas baratas que são usadas pelo influenciador que está mais na berra – mesmo para as crianças que gostam e respeitam o meio ambiente. Os vídeos divertidos no TikTok e no YouTube não mostram os impactos da criação destas roupas. Mas os pais podem tomar medidas para assegurar que os jovens compreendem o seu impacto no ambiente e desencorajar o consumo excessivo. Descubra como pode começar.

  • Faça do meio ambiente parte da compra. Uma criança pode pensar que está a ter em consideração o orçamento da família quando pede roupas baratas, mas os pais podem ajudar a mudar a sua mentalidade para se concentrarem nos impactos ecológicos das suas compras. Antes de concordar em clicar em “comprar”, peça às crianças para descobrir onde é que determinado item foi feito, quantos quilómetros teria de voar e as emissões de carbono produzidas por esse voo. (Esta calculadora pode ajudar a colocar as coisas em perspectiva.) Depois, tente perceber se as crianças preferem encontrar uma opção local mais sustentável.
  • Exponha os influenciadores. Se o seu filho lhe mostrar um vídeo de fast fashion e pedir para comprar uma nova peça de roupa, Michelle Nelson, professora do Departamento de Publicidade Charles H. Sandage da Universidade de Illinois Urbana-Champaign, recomenda aos pais para fazerem perguntas directas, para que as crianças compreendam que estes vídeos são geralmente anúncios publicitários. Por exemplo, os pais podem perguntar: Porque é que esta pessoa está a exibir uma determinada marca em particular? Será que foram pagos para fazer isto? Quanto é que o transporte destas roupas iria custar a uma pessoa que não recebe estes itens de graça?

“Se não sabemos que estamos a ser persuadidos, não vamos ser tão críticos em relação à mensagem”, diz Michelle Nelson. “Por exemplo, as crianças gostam muito de um determinado influenciador e sabem que os seus amigos também gostam dele, mas se não sabem o que é publicidade, ficam apenas mais susceptíveis.”

  • Compre menos, compre melhor. Se o seu filho pedir para comprar uma peça de roupa não essencial, diga-lhe para pedir novamente dentro de uma ou duas semanas. Por vezes, perder tempo a pensar numa compra pode ser tudo o que uma criança precisa para perder o interesse. Se o seu filho continuar a pedir, procure uma roupa de qualidade feita de materiais de menor impacto (pense em linhos à base de plantas ou lã).
  • Seja ponderado com as compras. Ajude as crianças a criar hábitos de compra saudáveis, estabelecendo algumas das coisas que devem e não devem fazer em relação à moda. Por exemplo, limite as compras de roupa a um item por mês. Também pode dar uma mesada fixa aos seus filhos, para que pensem nas compras com mais cuidado e comecem a aprender o que são orçamentos.
  • Compre roupa em segunda mão. “Percebo que é difícil dizer para não comprar algumas coisas”, diz Aja Barber, que se reúne com grupos escolares no Reino Unido para falar sobre fast fashion e consumismo. Em vez disso, Aja Barber incentiva as crianças a considerarem a compra de roupa em segunda mão, para diminuir o seu impacto no ambiente – e nas suas carteiras. Sites como Depop, Poshmark, e threadUP são bons lugares para começar, mas lembre-se de que apoiar uma loja local é uma óptima forma de reduzir o desperdício e as emissões envolvidas no envio.
  • Cuidado com o “greenwashing. Algumas marcas de fast fashion lançaram iniciativas de sustentabilidade para diminuir o impacto ambiental das suas roupas, mas alguns grupos de defesa do consumidor dizem que estas alegações podem ser enganadoras. As empresas não são realmente obrigadas a divulgar as suas práticas sociais e ambientais ou informações sobre as suas cadeias de abastecimento, pelo que os pais podem colaborar com os filhos para fazer alguma investigação extra. O site Fashion Revolution classifica as 250 maiores marcas de moda do mundo com base na transparência das suas práticas sociais e ambientais; os pais também podem pesquisar marcas de roupa através do site Rank a Brand.
  • Use bem as redes sociais. Os influenciadores de moda geralmente concentram-se na aparência, diz Rachel Rodgers, professora-adjunta do Programa de Psicologia Aplicada da Faculdade Bouvé de Ciências da Saúde da Universidade Northeastern. Rachel Rodgers diz que os pais devem dar mais importância a outras coisas na vida dos seus filhos. “Por exemplo, [elogie] uma criança pelos seus feitos e qualidades, não pela roupa que usa.” Rachel Rodgers também sugere que os pais devem incentivar os filhos a preencher os seus feeds de redes sociais com conteúdos que reflitam os seus interesses, em vez de vídeos “#haul”. Quer seja culinária, dança ou artesanato, um conteúdo que se alinhe com quem as crianças são pode tornar os seus feeds nas redes sociais em algo menos consumista e mais objectivo.

Este artigo foi publicado originalmente em inglês no sitenationalgeographic.com

 

 

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