“Era como se o Outono tivesse chegado em Julho. Caminhando durante o Verão em qualquer trilho nas florestas suíças ou alemãs, era possível ver como o clima seco e quente da Europa central estava, literalmente, a afectar as árvores”. Foi com estas palavras que Mauro Hermann, doutorando de dinâmica atmosférica da Escola Politécnica Federal de Zurique (ETH Zurich), descreveu uma situação cada vez mais habitual nas florestas do velho continente.
Herman referia-se ao Verão de 2018: os abetos e as faias murchavam prematuramente. As suas folhas e agulhas tornavam-se castanhas, deixando entrever florestas inteiras sob um estado de stress constante que tem ocorrido em grande escala na região mediterrânica – e em diversas ocasiões – desde 2003.
Desde então, os investigadores da ETH Zürich, cujos resultados foram publicados na revista “Biogeosciences”, decidiram examinar os eventos de escurecimento que têm vindo a ocorrer nas florestas temperadas e mediterrânicas da Europa ao longo dos últimos 21 anos.
Nos seus esforços para estudar o escurecimento das florestas em toda a Europa, os investigadores utilizaram dados de satélite de alta resolução para identificar eventos de redução de grande escala do verdor estival das florestas. A redução do verdor é um sinal de stress e diminuição da vitalidade nas florestas e, por conseguinte, um indicador da sua morte gradual.
As suas conclusões sublinham observações e hipóteses surgidas anteriormente: o escurecimento estival estendeu-se por toda a Europa. Todas as florestas temperadas da Europa Central sofreram um escurecimento particularmente intenso nos últimos anos, algo que a região mediterrânea já experienciava desde o início do século.
Na sua análise, os investigadores também descobriram que, no Verão de 2022, o mais quente de que há registo, as florestas europeias sofreram o maior escurecimento ocorrido até à data, que abrangeu 37 por cento das regiões florestais temperadas e mediterrâneas – muito mais do que qualquer outro evento das duas últimas décadas.
AP
As árvores europeias estão a escurecer cada vez mais cedo a cada ano que passa.
Porque estão as florestas a escurecer e a morrer?
“Queríamos perceber como o clima afecta as florestas numa área extensa e ao longo de várias estações”, afirma Heini Wernli, professor de física atmosférica do ETH e autor principal do estudo. “O papel central da seca era evidente, mas a ligação entre as florestas e o clima é muito mais complexa do que parece à primeira vista.”
“Nem todos os períodos secos, mesmo os intensos e persistentes, fazem com que as florestas fiquem imediatamente castanhas”, acrescenta Hermann, referindo-se ao “efeito herdado”, que tem sido observado nas nossas florestas ao longo de vários anos. A forma como as árvores sobrevivem ao calor e à seca não depende apenas das condições climáticas actuais, mas também das verificadas nos meses ou anos anteriores.
Esta foi uma das razões pelos quais os investigadores estavam particularmente interessados em investigar a história meteorológica dos eventos de pouco verdor: o seu objectivo era identificar padrões climáticos característicos que dessem sentido aos múltiplos eventos investigados.

Com efeito, os investigadores encontraram sinais climáticos característicos, ocorridos muito antes do fenómeno. Descobriram que esta redução do verdor das florestas poderia estar relacionada com períodos relativamente invulgares de falta de chuva, que se prolongaram durante mais de dois anos na Europa e até três anos na zona mediterrânica, e com outros indicadores como períodos frequentes de temperaturas altas, durante, no mínimo, dois anos na zona temperada. “Observámos que estes eventos de redução do verdor eram geralmente precedidos de um mínimo de dois Verões quentes e secos consecutivos. Isto resulta no chamado “efeito herdado”, segundo o qual um único Verão quente e seco não provoca, geralmente, uma redução imediata do verdor da floresta, mas pode contribuir para futuros eventos de maneira tardia.”
Tendo em conta estes dados, é pertinente perguntar se os cientistas poderão prever o stress causado pela seca e pelo escurecimento das florestas no futuro, uma questão perante a qual se mostram cautelosos: “Analisámos os eventos em retrospectiva, mas não examinámos a sua previsibilidade”, explica Hermann. “O facto de o stress causado pela seca também fomentar directamente as infestações de escolitídeos e fungos, bem como os incêndios florestais, dificulta muito a previsão de eventos futuros.
Thomas Wohlgemuth, outro dos co-autores do trabalho, defende que esta melhor compreensão do processo conduzirá à criação de melhores modelos florestais e ajudará a desenvolver medidas de gestão preventivas. Por enquanto, os satélites continuam apontados para a Europa, num Verão que se prevê novamente quente e seco.