Três quartos dos corais do mundo adoeceram entre 2014 e 2017. Muitos ficaram brancos – um processo denominado de branqueamento pelos cientistas – e 30% desses corais branqueados morreram.

O responsável? Os oceanos aquecidos pelas alterações climáticas e um evento El Niño que está a aumentar ainda mais a temperatura em águas já de si quentes. 

Este ano já está a ser “particularmente mau”, diz Doug Marcy, fundador do Caribbean Coral Restoration Center. Os recifes do Panamá conseguem tolerar águas a cerca de 25º C, mas as temperaturas já ultrapassaram os 32° C este ano. Na costa sudoeste da Florida, grandes parcelas do vulnerável sistema de recife de coral da região encontram-se actualmente em águas a 36ºC, uma temperatura recorde, e correm o risco de sofrer branqueamento.

Estas temperaturas extraordinariamente altas, na opinião de Marcy, podem ser “devastadoras” para os corais, que “não são capazes de se adaptarem suficientemente depressa” para lidar com elas e poderão ter dificuldades em reproduzir-se, caso o número de perdas seja demasiado elevado.

Com um ecossistema inteiro em risco, um novo evento El Niño a caminho e o aumento das temperaturas globais, os cientistas estão a recorrer a tecnologia experimental para ajudar os corais a sobreviver, restaurando o seu habitat manualmente e ajustando o ADN dos corais. No entanto, não há certezas que este esforço seja suficiente para ajudar alguns dos corais mais vibrantes do mundo a sobreviverem.

O que acontece aos corais em água quente?

Os corais são animais que vivem em parcerias mutuamente benéficas com uma microalga chamada zooxantela. Esta alga vive dentro do esqueleto do coral e, em troca de abrigo, fornece-lhe grande parte dos seus nutrientes, bem como as suas cores deslumbrantes.

Quando alguma mudança de condições – nomeadamente, alguns graus de aquecimento – stressa os corais, eles expulsam a sua hóspede, tornando-se brancos.

“É como se alguém tivesse pegado uma borracha e apagado todas as cores dos corais”, diz Marcy.

Os corais podem sobreviver a episódios de branqueamento suaves ou de curta duração, mas, se passarem muito tempo sem as suas zooxantelas, morrem de fome. Depois de perderem a cor, ficam mais vulneráveis a contrair doenças, podem ter dificuldades reprodutivas e as populações de peixe que os habitam podem abandoná-los ou morrer.

Todas estas alterações subaquáticas também afectam as pessoas em todo o mundo. Sem recifes de coral que lhes sirvam de berçários seguros, onde os juvenis possam abrigar-se e encontrar alimento, as populações de peixe sofrem e os pescadores têm mais dificuldades em sustentar as suas comunidades.

“As pessoas dependem do nosso oceano e não podemos esquecer-nos disso”, diz Jake Edmiston, investigador de projectos na Blue Marine Foundation.

El Niño — ventos mais fracos, águas mais quentes

O El Niño costuma acontecer a cada dois a sete anos, quando os ventos que atravessam o Equador enfraquecem, fazendo aumentar as temperaturas da superfície das águas do Pacífico.

Neste momento, o planeta já aqueceu 1,2°C e o El Niño deste ano poderá fazer a temperatura média global ultrapassar o limite de aquecimento global de 1,5ºC pela primeira vez, excedendo um limiar que, segundo os cientistas, expõe o mundo a consequências ambientais graves. Mesmo que o mundo limite o aquecimento a 1,5ºC, 70 a 90 por cento dos recifes de coral tropicais poderão desaparecer.

Há alguns anos, Marcy ter-se-ia rido da ideia de ver águas “a um passo de parecerem um jacuzzi” – que tende a borbulhar a entre 32ºC e 40ºC. No entanto, apesar de a água já ter atingido temperaturas “inimagináveis”, superiores a 32ºC, este ano, ele acha que o pior ainda está para vir.

No entanto, nem toda a esperança está perdida. Sofia Regalado, Coordenadora de Ciência e Investigação da Blue Marine Foundation, diz: “Os corais são resilientes. Já enfrentaram muitas ameaças ao longo dos seus 400 milhões de anos de existência” e conseguem recuperar eventualmente.

Corais Indonesia
SHUTTERSTOCK

Foto subaquática de recifes de coral em Gili, Lombok, Nusa Tenggara Barat, Indonésia. 

Recifes artificiais, híbridos e sistemas de som subaquáticos

Outrora desenvolvidos em naufrágios, esculturas, pneus ou estruturas de betão, os recifes artificiais estão agora a ser feitos com impressoras 3D: composições realistas com fendas e recantos para os corais se agarrarem e servirem de lar a vida marinha.

A tecnologia das rochas biológicas (biorock) envia uma pequena corrente eléctrica através de estruturas metálicas, provocando o desenvolvimento de calcário, no qual o coral pode instalar-se. Mais baratas do que as de betão, podem reparar-se a si próprias, tornam-se mais fortes com o passar do tempo e ajudam os recifes danificados a recuperar mais depressa.

A reprodução selectiva também pode ajudar. Alguns investigadores estão a cruzar as espécies de coral mais adaptáveis e resilientes para criar híbridos com maiores probabilidades de sobrevivência. Outros estão a fazer bancos de sementes: restaurando e clonando corais que morreriam sem intervenção e armazenando as suas sementes para o futuro.

O Caribbean Coral Restoration Center está a tentar encorajar os seus corais a “tornarem-se mais resistentes” mantendo a temperatura dos seus tanques a 29,5ºC — normalmente demasiado quente para os corais — para ver quão depressa eles conseguem adaptar-se a temperaturas mais altas.

Os investigadores também têm empreendido novas descobertas que demonstram que “o mundo subaquático não é tão silencioso como Jacques Cousteau pensava”, diz Edmiston. Um estudo publicado na revista Nature em 2019 mostrou que reproduzir os sons de um recife saudávelatravés de altifalantes subaquáticos pode trazer os peixes de volta a ecossistemas de coral degradados. Steve Simpson, autor do estudo e biólogo marinho da Universidade de Bristol, explicou num comunicado de imprensa que “os recifes de coral saudáveis são sítios incrivelmente ruidosos – camarões a estalar e peixes a resmungar que, juntos, formam uma paisagem biológica espectacular”. Atraídas por estes sons, as larvas de peixe têm mais probabilidades de se instalarem num recife ruidoso – e consequentemente saudável.

Reconhecer os sinais de aviso do branqueamento – que podem incluir fluorescência, com os recifes a brilharem como pulseiras de néon – também ajuda os conservacionistas a reagir mais depressa.

A uma escala global, o Allen Coral Atlas está a usar imagens de satélite de alta resolução para monitorizar os recifes, com um excepcional nível de pormenor, e processar dados regionais quinzenalmente em áreas onde a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA (NOAA) tenha identificado temperaturas anormalmente altas.

A inovação não é suficiente para salvar os recifes

Regalado acho que não devemos “depender só da inovação” quando o problema é tão grande. Os corais estão a ser atacados pela poluição, plásticos, pesca excessiva, desenvolvimento costeiro e muito mais. No seu conjunto, estas ameaças podem ser mais do que eles conseguem suportar.

Edmiston concorda que a inovação sustentada pela ciência deve complementar medidas de conservação como as Áreas Marinhas Protegidas (MPAs) que, quando aplicadas, protegem os recifes de factores de stress induzidos pelo ser humano. As MPAs não beneficiam apenas as zonas protegidas, pois a vida marinha não tem consciência das fronteiras de uma MPA e pode “transbordar de uma área para outra”, acrescenta Regalado.

Não devemos já “começar a escrever o obituário do oceano”, diz Edmiston. Ele acredita que conseguiremos alcançar a meta de 30x30, um esforço global para proteger 30 por cento da terra e do mar do planeta até 2030, se todos nos unirmos – mas, para isso, teremos de descarbonizar a economia e reduzir as emissões que estão a acelerar as alterações climáticas. E essas reduções têm de ser rápidas. “A única solução que temos”, diz Marcy, “é comprar tempo”.

Artigo publicado originalmente em inglês em nationalgeographic.com.