O Sol desvanece-se. Qual pérola, a Lua ergue-se. E acontece magia.

Na narrativa de um jardim durante a noite, as personagens do enredo são flores com fragrâncias intensas que desabrocham na escuridão (como o jasmim, a angélica e a gardénia), traças com asas cor de jade e escaravelhos iridescentes como opalas. A Lua, que ilumina este palco, toma o seu brilho emprestado do Sol. A sua luz pálida é reflectida. Um jardim nocturno convida à reflexão. Ao contrário do Sol, a Lua é convidativa para o nosso olhar. Podemos vê-la crescer e enaltecê-la com poesia, vê-la minguar e lamentá-la com melancolia e admirar a maravilha de um mundo ao revés onde as plantas se alongam na direcção não da luz do Sol, mas do brilho ténue projectado sobre a Terra por um diadema de estrelas.

A cor é irrelevante num jardim nocturno. Devido à forma como o olho vê, à luz da Lua minguante, até as mais incendiárias tonalidades de vermelho e laranja se transformam em tons monocromáticos de prateado e cinzento. A retina, o revestimento sensível do interior do olho, possui camadas compostas por células fotorreceptoras denominadas cones e bastonetes. Ao detectarem a intensidade da luz, os bastonetes têm capacidade para captar níveis de iluminação reduzidos. Mas os cones, que distinguem a cor, precisam de um limiar de luz mais elevado do que o fornecido pela palidez do luar. Na ausência desse limiar, a cor desvanece-se.

O perfume das flores durante a noite é ilusório. “Os jardins são mais fragrantes de noite do que de dia porque a maioria dos polinizadores nocturnos tem má visão e serve-se do olfacto para encontrar as flores”, diz John Kress, conservador de botânica no Museu Nacional de História Natural do Instituto Smithsonian. O mundo das flores nocturnas e dos seus polinizadores é um universo alternativo, com ajustes efectuados ao longo de anos de selecção evolutiva. Os polinizadores diurnos como as borboletas, as aves e as abelhas, baseiam-se em indícios visuais telegrafados por cores garridas; os trabalhadores do turno da noite, como os escaravelhos e as traças, dependem da fragrância, da luminescência das pétalas brancas ou, como na ecolocalização dos morcegos, dos contornos esbatidos da forma.

É melhor ficarmo-nos pelo lusco-fusco onírico da imaginação e entrarmos no Pavilhão Onde a Lua Se Encontra com o Vento no Jardim do Mestre das Redes, em Suzhou, na China, ou no Jardim Branco de Vita Sackville-West, em Sissinghurst Castle, Inglaterra, decorado em tons de neve com tulipas brancas, lírios e anémonas, ranúnculos-creme, campânulas brancas-acinzentadas e rosas Iceberg e White Wings. Ou podemos recuar ao passado e invocar os jardins de prazer construídos pelos governantes mongóis, refrescados por pérolas de água caindo de fontes de mármore, à sombra de árvores carregadas de romãs e laranjas e pintadas pelo luar, como o lendário jardim de Xalimar, perto de Caxemira.

Segundo a especialista em história da arquitectura Elizabeth Moynihan, a palavra “paraíso” pode remontar a uma transliteração da palavra persa antiga pairidaeza, um jardim murado. “O Paraíso prometido no Alcorão consiste em vários socalcos de jardins, cada um mais esplêndido do que o anterior”, escreveu. O palácio ao ar livre de um jardim islâmico era, no sentido literal e figurativo, o paraíso sobre a Terra, um local para beber vinho em jarros de prata, comer melões de Cabul e ouvir poesia. “Por mais distante e fechada que a alma do islão permaneça, duvido que alguma vez a tenhamos sentido mais próxima de nós do que naquela noite, entre as fontes e as flores nocturnas do jardim de Xalimar, enquanto a Lua cheia de Agosto, do alto das neves da fronteira tibetana, vertia sobre nós a sua luz nítida”, escreveu o visconde Robert d’Humières, depois de ser recebido no início do século XX pelo irmão do marajá de Jammu e Caxemira.

Se um jardim é uma tentativa de conquista do Éden, então os nossos anseios talvez sejam mais recompensados de noite. A Lua perdoa a degradação posta a nu pelo Sol. A flor ferida, a folha desidratada e o ramo apodrecido são engolidos pelas sombras, deixando apenas uma ilusão de perfeição, prateada pelas estrelas e dourada pelo luar.