Há duas maneiras de entrar no velho Teatro Anatómico (hoje parte do Instituto de Anatomia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa) dirigido por António Gonçalves Ferreira e onde trabalham todos os dias Pedro Henriques e Ana Henriques. Uma é como aluno ou turista interessado em algum dos milhares de materiais orgânicos ali musealizados; a outra é inerte, como material de estudo. Idealmente, o leitor fará parte do primeiro grupo!
“[ O cirurgião ] José Lourenço da Luz conseguiu a organização de um gabinete de frenologia na Escola médico-cirúrgica e para ali fez depositar os crânios de Diogo Alves e Mattos Lobo. ” — revista occidente, 1882
Pioneiros como o cirurgião José Lourenço da Luz cedo perceberam, em meados do século XIX, a importância de criar colecções de referência de patologias, mas também de órgãos e tecidos humanos para que os futuros médicos pudessem assimilar a matéria com que passariam a trabalhar. Por isso, a colecção hoje mantida no Hospital de Santa Maria tem aumentado desde os tempos da Escola Médico-Cirúrgica, reflectindo a evolução da medicina e da doença.
Há réplicas de órgãos e de ossos (ainda particularmente úteis para o treino cirúrgico). Exemplos de patologias e tecidos anormalmente dilatados.
DIOGO ALVES (1810 - 1841). A cabeça do assassino Diogo Alves é seguramente a peça mais famosa. Foi colhida por médicos da Escola Cirúrgica logo após a execução, na esperança de encontrarem nela indícios do desvio comportamental que conduzia ao crime.
Tatuagens realizadas na monarquia e na Primeira República, com os correspondentes ícones da época. Uma vasta colecção de desenhos anatómicos, alguns dos quais com elevado valor artístico, como as pinturas que Vieira da Silva realizou no início da carreira. As peças mais enigmáticas são, porém, as que contam a história do crime: durante décadas, pensou-se que o crime correspondia a um desvio codificado na configuração do crânio do criminoso. Há por isso um armário repleto de vestígios dessa proveniência.
Exótica e diversificada, a colecção continua a ser indispensável para os alunos, mesmo agora, quando as impressoras 3D já conseguem replicar na perfeição a morfologia de um órgão.