Marco Úlpio Trajano é, entre os imperadores romanos, o mais exaltado não apenas pelos seus contemporâneos, mas também por cronistas e historiadores de todos os tempos.

Os textos de Plínio, o Jovem, (61-112) e do historiador Dião Cássio (155-235) são, quando se referem a Trajano, especialmente laudatórios. Chamam-no general magnífico e hábil administrador; qualificam-no como estóico; realçam que era disciplinado, sereno e justo, tolerante e paciente, e afirmam que exerceu o poder ao serviço da comunidade num momento da história de Roma, a passagem do século I para o II, que é considerado o seu período de maior esplendor. Efectivamente, foi nessa altura que o Império Romano, no qual viviam entre sessenta e cem milhões de pessoas, chegou a crescer ao ponto de ocupar um território de mais de seis milhões de quilómetros quadrados. Toda a costa do mar Mediterrâneo, que a partir de então seria chamado de Mare Nostrum, era romana, e as suas fronteiras estendiam-se desde a Bretanha, Hispânia ou Mauritânia até ao mar Cáspio e Babilónia ou Susa, o que foi possível graças à política expansionista de Trajano, o primeiro imperador hispânico da sua história e o fundador de uma nova dinastia, a chamada Antonina, mais recentemente denominada Úlpia-Élia.


O pai, com o mesmo nome, foi o primeiro da sua família a fazer carreira ao serviço do império e, depois de enviar uma legião ao lado de Vespasiano na guerra contra os judeus entre os anos 67 e 68, foi recompensado no ano 70 com um consulado. Foi também membro do Senado, como integrante do aristocrático grupo dos patrícios e, mais tarde, entre os anos 73 e 77, governador da Síria e depois da Bética e da Ásia. Desta forma, o filho, que nasceu em 53, tinha a quem imitar, pelo que Trajano cedo seguiu os seus passos, cumprindo, uma por uma, todas as etapas do cursus honorum. Serviu durante dez anos como tribuno no exército e foi questor, pretor e legado, o que o levou a comandar uma legião na Hispânia em 89. Tinha então 36 anos e, apenas dois anos mais tarde, depois de ter mobilizado as suas tropas até à Germânia para tentar travar uma revolta contra o imperador Domiciano, foi nomeado cônsul.

trajano

O Fórum de Trajano, em Roma, foi construído graças ao saque obtido na Dácia.

Trajano tinha 43 anos e uma grande experiência política e militar quando,  sendo  governador da Germânia Inferior, Domiciano foi assassinado em 96. Sucedeu-lhe um já idoso Nerva, que, como reacção ao autocrático governo de Domiciano, voltou a instaurar a cooperação entre o imperador e o Senado, o que, sem dúvida, influenciou o facto de ter adoptado Trajano como seu sucessor. Era o Verão do ano 97. Em Janeiro do ano seguinte, quando Nerva morreu, Trajano encontrava-se na Germânia.

busto de trajano

Busto do imperador, oriundo de um achado ibero-romano em Córdova.

Conta-se que quem lhe deu a notícia foi o seu sobrinho Públio Élio Adriano – que lhe sucederia como imperador –, mas Trajano não teve pressa em dirigir-se para Roma. Tanto o Senado como o exército estavam com ele, e, em primeiro lugar, garantiu que as terras ganhas para o império na margem direita do Reno ficariam pacificadas e a salvo.

Optimus princeps 

“Os vastos territórios do Império Romano foram governados, então, por um único poder, guiado pela virtude e pela sabedoria.” A frase, pertencente à obra História do Declínio e Queda do Império Romano (1776), do britânico Edward Emily Gibbon (um dos historiadores mais infiuentes de todos os tempos), define bem o período do governo de Trajano, que durou dezanove anos. Quando entrou em Roma, cerca de doze meses após a sua nomeação, o povo, o Senado e o exército aclamaram-no como um herói e o imperador propôs-se – e conseguiu – governar atendendo às necessidades destas três classes sociais. Consagrou a liberdade pública e o respeito pelas leis, proibiu as acusações anónimas, não se deixou corromper e, embora tenha mantido ao longo de toda a sua vida um férreo controlo do governo, devolveu ao Senado o seu papel na administração pública do Estado. Premiou também as legiões romanas e os seus oficiais, mandou edificar colégios para os filhos ilegítimos e os órfãos dos seus soldados, favoreceu a colonização e o repovoamento de terras de cultivo, tomou medidas para uma melhor distribuição pública dos cereais, concedeu privilégios aos artesãos e transportadores, mandou queimar os registos das dívidas dos cidadãos, reduziu a carga fiscal e instituiu as doações em dinheiro para celebrar os sucessos de Roma. Assim aconteceu em 98, 102 e 107. Nos primeiros dois casos foram distribuídos setenta e cinco denários por pessoa, e no terceiro chegaram a ser quinhentos para cada cidadão.

marco

O imperador Marco Úlpio Trajano foi, segundo insistem todas as fontes da época, o mais admirado e amado da história do Império Romano, e o que governou Roma durante o seu período de maior esplendor. Em cima, estátua de Trajano conservada no Museu do Louvre, em Paris.

Se a sua política interna foi importante e proveitosa, não o foram menos as suas campanhas militares, que lhe proporcionariam, além de glória, importantíssimos recursos financeiros.

A primeira delas teve lugar em Dácia – na actual Roménia – uma região que provocara a Roma, durante mais de uma década, sérias dores de cabeça. O imperador Domiciano já a tentara submeter durante as suas incursões nos anos 86 e 87, mas as suas legiões tinham sido derrotadas pelas tropas do rei dácio Decébalo, que, em 89, conseguira que Roma assinasse um tratado muito favorável aos seus interesses, o que obrigava o império a desembolsar grandes quantias de dinheiro para comprar uma paz que foi sempre instável. Assim, na Primavera de 101, Trajano, à frente de duas legiões, fez-se ao caminho para se juntar  às  nove que já se encontravam junto ao Danúbio, com o que conseguiu formar um exército com cerca de cem mil homens. Ali chegado, atravessou as chamadas  Portas de Ferro – um desfiladeiro no rio que, actualmente, faz parte da fronteira entre a Sérvia e a Roménia – e no caminho para a capital, Sarmizegetusa, enfrentou o seu inimigo, embora tenha sofrido grandes perdas que o obrigaram a reagrupar-se. Passado o Inverno, e depois de alguns fugazes, embora vitoriosos, confrontos, as legiões romanas aproximaram-se o  suficiente  da  capital para forçar Decébalo a submeter-se. Trajano deixou em Dácia um importante contingente militar e regressou a Roma, onde encarregou Apolodoro de Damasco – um magnífico arquitecto de origem síria, autor da maior parte das obras então erguidas e incansável colaborador do imperador – da construção de uma ponte de pedra sobre o Danúbio.

A máxima expansão

No final de Dezembro de 102, Trajano celebrou em Roma o seu triunfo e recebeu os títulos de Dacico e de Optimus princeps (“o melhor príncipe”, ou “o melhor dos primeiros cidadãos”), mas, apenas três anos depois, em 105, Decébalo voltou a atacar, investindo agora sobre as províncias fronteiriças de Roma, com o apoio de algumas tribos dácias do Norte. Trajano pôs-se novamente em marcha e, desta vez, o exército romano não perdoou os inssurrectos.

Com a ponte de pedra de Apolodoro já construída, que media 1.135 metros de comprimento, atravessou, uma vez mais, o Danúbio com poderosas máquinas de guerra e de cerco e doze legiões com as quais atacaram a capital, que tomou e arrasou por completo, e derrotou os seus inimigos, obrigando Decébalo a suicidar-se. Em 106, conquistou toda a Dácia, assumindo o controlo das riquíssimas minas de ouro e de sal da província e obtendo um fabuloso saque, o tesouro de Decébalo que, segundo algumas fontes clássicas, ascendia a mais de cem toneladas de ouro e o dobro em prata, um tesouro que serviu para pagar muitas das impressionantes obras arquitectónicas que Roma empreendeu nos anos seguintes, como a célebre Coluna de Trajano, erguida em frente ao fórum para celebrar a vitória.

Coluna de trajano

A glória de Trajano foi escrita em pedra. Termas, um aqueduto e um impressionante complexo arquitectónico, o Fórum, ergueram-se em Roma para glorificar a grandeza do imperador. Para construir este último, foram escavadas as encostas do Quirinal e a colina Capitolina. Incluía uma grande praça porticada de 200 por 120 metros, um mercado semicircular com vários pisos de altura e, a norte, a Basílica Úlpia, um edifício com cinco naves e de monumentais dimensões, junto ao qual se erguia a célebre Coluna de Trajano (na imagem).

1 A EMBAIXADA. O imperador recebe uma comitiva dácia, que transporta oferendas para o ritual dos sacrifícios na Suovetaurilia.

3 OS REFORÇOS. As tropas romanas embarcam no Danúbio para socorrer o exército sitiado na Mésia Superior.

2 BATALHA NOCTURNA. À esquerda, um confronto nocturno entre as tropas auxiliares romanas e os dácios (na actual Roménia).

4 AS VITÓRIAS. Depois da decisiva vitória de Tapa, Trajano inspecciona as defesas inimigas e contempla a fuga dos dácios.

De regresso à capital em 107, após aniquilar quase por completo a população indígena da Dácia – quase ao ponto de um genocídio, pois aquela província seria mais tarde conhecida como Rumania, terra de romanos –, Trajano celebrou um novo triunfo pelas ruas de Roma e ofereceu aos seus cidadãos uns espectaculares jogos, que, segundo Dião Cássio, duraram cento e vinte e três dias. Neles participaram dez mil gladiadores, tiveram lugar corridas de quadrigas e representações de batalhas, e sacrificaram-se mais de onze mil feras. Mas não foi só a conquista de Dácia que se celebrou. Também a do  reino  dos  nabateus, um antigo povo aramaico, estabelecido entre as actuais Palestina e Jordânia, cuja capital, Petra foi tomada entre os anos 105 e 106. O reino, que se tornou na província romana de Arábia Pétrea, serviria a Trajano como uma excelente plataforma para as suas futuras campanhas orientais.

A última dessas campanhas foi realizada por Trajano contra o Império Parta, rival de Roma no domínio do Mediterrâneo oriental, que se estendia pelo Norte e Oeste do actual Irão e, tal como as anteriores, constituiu um completo sucesso militar. O imperador viajou em 114 para Antioquia e, a partir daí, as suas legiões iniciaram a ofensiva contra a Arménia, que na Primavera do mesmo ano era já uma província romana. Continuaram, em seguida, invadindo a Assíria e a Mesopotâmia, que apenas dois anos mais tarde, em 116, fora já totalmente ganha por Roma. As suas principais cidades, como Babilónia, Selêucia e a capital parta, Ctesifonte, caíram uma após a outra, nas mãos das suas legiões, que, indo cada vez mais em direcção a sul, chegaram às costas do golfo Pérsico, alcançando, assim, o Império Romano a sua máxima expansão. No entanto, muitas delas tiveram de se retirar para combater uma nova rebelião na Judeia, que Trajano deixou nas mãos do seu general Lusio Quieto.

Pouco depois, o imperador Trajano adoeceu e iniciou o seu regresso a Roma, embora nunca tenha conseguido chegar à cidade. Morreu em Agosto de 117, com quase 64 anos, quando se encontrava na cidade de Selinus de Cilicia (Selinunte), no golfo de Antália, na actual Turquia. Apenas alguns dias antes, nomeara sucessor o também hispânico Adriano, o  único  varão  que era familiar directo de Trajano, com quem continuou a sua dinastia.