"Stranger fruit” quer exercer pressão sobre si, leitor. Sobre isso não há dúvida. As fotografias de mães e filhos, de corpos negros inteiros e sem ferimentos, mas semelhantes a Cristo na morte, não pretendem ser delicadas na sua interpelação dos espectadores, tal como as pessoas que se manifestam na rua não se limitam a pedir à polícia que mude. São mães negras, sentadas, em pé, ajoelhadas, com os filhos sem vida nos braços, olhando directamente para a lente, directamente para o espectador, directamente para o país, exigindo atenção. E custa-nos muito vê-las. Mas custa mais desviar o olhar.

“Aquilo por que passamos agora revive os traumas da comunidade afro-americana”, diz Jon Henry, um artista sediado em Brooklyn. A sua exposição “Stranger Fruit” tem como ponto de partida os homicídios de pessoas negras pela polícia. Inspira-se na música “Strange Fruit”, a interpretação de Nina Simone do requiem de Billie Holiday em homenagem aos corpos linchados, “abanando ao sabor da brisa do Sul, os frutos estranhos pendurados em choupos”. Obriga-nos a pensar no sofrimento das famílias e comunidades que foram abandonadas e estão a tentar recuperar. “É difícil continuar a reviver estes momentos, mas os homicídios continuam a acontecer”, diz Henry.

As imagens de mães reais com os filhos reais não retratam a morte real, mas captam a omnipresença desse medo que as mães negras nunca deixam de sentir. Implicam a admissão de que a polícia pode matar pela ofensa mais insignificante ou, como diz Henry, “por absolutamente nada”.

Vemos as mães com os filhos, de várias idades, na pose clássica da pietà, de Maria em sofrimento segurando o corpo morto de Cristo. As imagens foram captadas em cidades onde é possível ver um corpo negro inerte, sem traumas visíveis, criando a ilusão de que o indivíduo fotografado está morto. Henry, que foi sacristão em Queens durante 15 anos, conta que este projecto foi inspirado na iconografia cristã e nas memórias da preocupação constante da sua mãe enquanto ele crescia. Sempre que ele saía, ela exortava o seu único filho para ter cuidado, para se manter seguro, para voltar para casa.

Jon Henry pediu às mães que fotografou que reflectissem sobre estas cenas e os seus filhos. “Sinto-me triste, tão triste por as mães terem de passar por isto… O meu filho conseguiu levantar-se e voltar a vestir-se. Há outros que não conseguem.”

Henry começou a fotografar para este projecto em 2014. As suas origens remontam a 2006, quando agentes da polícia de Nova Iorque alvejaram e mataram Sean Bell no dia do seu casamento. No rescaldo da morte de George Floyd, as imagens de Henry parecem premonitórias. Mas é assim sempre que viajamos ao passado e rasgamos as gigantescas cicatrizes da América, que parece resignar-se à convicção de que os corpos negros são descartáveis e que as vidas negras só são importantes para as mães.

Henry enviou as imagens às mães por correio electrónico, juntamente com um questionário sobre o que pensavam antes e depois de as fotografias serem captadas e como abordam o tema da morte com os seus filhos. Algumas respostas anónimas integraram o projecto:

Olho para os meus filhos e fico agradada com os adultos em que se tornaram. Percebo o amor que lhes tenho e como me sinto entusiasmada com o seu futuro. Mas sinto-me preocupada com o futuro que temos diante de nós, em geral.

São as mães negras que conhecem os Estados Unidos através dos corpos dos filhos que seguram nos braços. Aqui fica o olhar da mãe negra que envolve a nação e que lhe exige que mude. 

“À medida que era gradualmente incorporada no cenário e me falavam sobre a pose, vieram-me à cabeça os pensamentos diários que tenho em relação ao meu filho. Tenho pensamentos de amor, mudança, determinação, crescimento e incentivo. Também me preocupo com a sua saúde e segurança... As pessoas precisam de prestar atenção para travar a morte de homens negros e o sofrimento das suas mães.”

Nota: Esta reportagem foi produzida em parceria com “The Undefeated”, uma página de Internet da ESPN que explora as intersecções entre etnia, cultura e desporto.