Se tem amor à vida, não tente explicá-lo na vila de Aljubarrota, a cerca de onze quilómetros de um dos campos de batalha mais famosos da história de Portugal, mas a saga da famosa padeira responsável pela morte de sete, oito ou nove castelhanos (consoante as versões mais populares) é provavelmente mitológica e só foi fixada em texto cerca de dois séculos e meio após o confronto de 1385.

Como todos os mitos, este episódio teve diversas funções e foi posto ao serviço de várias ideologias. É provável que, no século XV, a história de uma só figura batendo-se em inferioridade numérica servisse para exaltar o feito do exército comandado por Nuno Álvares Pereira. Talvez até corresse na região anos mais tarde, ganhando pormenores e brilho sempre que a independência do reino parecia estar em causa. É certo, porém, que só foi fixada em texto em 1642 pelo monge Francisco Brandão, que a ouviu na zona de Albujarrota. Alexandre Herculano investigou as origens do mito no século XIX e alimentou-o, embora não desse por provada a realidade do episódio. No século XX, nos manuais de história do Estado Novo, o episódio era contado sem particular espírito crítico, exaltando uma vez mais as virtudes da luta de um exército contra o mundo.

De concreto, sabe-se apenas que existiu, anos depois da batalha, uma padeira em Aljubarrota, de mau feitio e aparência rude. Chamava-se Brites de Almeida e seguramente nunca imaginou que, tantos séculos mais tarde, ainda se falaria do modo como matou à pazada os castelhanos que se esconderam no seu forno.