Apesar de ser um dos maiores e mais duradouros impérios islâmicos da história, as origens do Império Otomano foram humildes e obscuras. Saber como um pequeno estado tribal sobreviveu a vizinhos muito mais poderosos e conseguiu finalmente derrotá-los é algo que intriga os historiadores há décadas, especialmente porque quase toda a informação que possuímos sobre as suas origens fazem parte do mito nacional que foi criado quando já era um império transcontinental.
O aparecimento daquela que seria a maior potência do mundo muçulmano na Época Moderna não se pode atribuir a um único factor, mas à soma de todos eles, nomeadamente a debilidade dos seus vizinhos e umas políticas mais tolerantes do que as de outras potências, entre outros, além da sorte de terem sido favorecidos pela desgraça alheia.

Osman, o primeiro sultão.
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Osman, o primeiro sultão.

Pequenos Sobreviventes

As origens do estado otomano podem situar-se em finais do século XIII, num momento de inflexão no qual as duas potências que disputavam o controlo da Anatólia se encontravam muito debilitadas: a ocidente, o Império Bizantino começava a recuperar da conquista veneziana durante a Quarta Cruzada; a oriente, o sultanato selêucida de Rum concentrara o seu exército na fronteira para resistir à expansão mongol. A coincidência destes dois momentos deu origem a um vazio de poder na Anatólia que foi ocupado por diversos líderes tribais, teoricamente vassalos dos sultões selêucidas, que lhes outorgavam uma vasta autonomia sobre os seus territórios sob o título de beys.
Um destes territórios era dominado por um líder chamado Osman, cujo nome em árabe –  Uthman – daria origem ao nome da sua dinastia, os otomanos. Seguindo uma política de prudência, manteve-se leal ao sultão enquanto empreendia ataques contra os beys vizinhos, apoderando-se das suas fortalezas e ligando-se às suas tribos, sem chegar a proclamar a sua soberania directa. Aquando dos estertores, não havia como impedir o sultanato de Rum de ser definitivamente derrotado pelas hordas tártaras e mongóis. Osman aproveitara esta agonia para se proclamar sultão em 1299, reclamando oficialmente a liderança que já exercia de facto sobre a Anatólia. Foi assim que começou história do Império Otomano, que duraria mais de seis séculos.

Uma ascensão inesperada

Mesmo tendo em conta a debilidade dos seus vizinhos, a ascensão otomana é surpreendente, especialmente no início, quando não era mais do que um reino de base tribal. É difícil destrinçar as razões do seu sucesso, sobretudo porque carecemos de fontes directas: os otomanos só começaram a fixar a sua história por escrito a partir do século XV, quando já eram uma grande potência, e é provável que as crónicas tenham sido embelezadas para dar uma pátina mítica às origens do império.
Vários factores podem ter facilitado a primazia de Osman sobre os beys vizinhos, especialmente sobre os territórios disputados aos bizantinos. Embora nenhum a explique inteiramente, há três motivos que desempenharam seguramente um papel importante. Em primeiro lugar, Osman exercia uma pressão fiscal relativamente baixa, o que faria com que os territórios disputados preferissem ser governados por ele do que pelos bizantinos ou pelos venezianos. O segundo motivo tem a ver com a religião: regra geral, os otomanos eram bastante permissivos para com os povos conquistados e o os dhimmis – súbditos não-muçulmanos – não só eram tolerados, como podiam desempenhar cargos de poder na administração e no exército. O terceiro factor foi o forte impacto exercido pela Peste Negra na Europa, que agravou a crise económica e militar do Império Bizantino, impossibilitando-o de recuperar o controlo sobre a Anatólia.

Não obstante, nem tudo pode ser atribuído à sorte. Uma vez no poder, os sultões otomanos asseguraram-se de que o conservavam. Para tal, implantaram uma administração semelhante à dos Khans mongóis, os quais, por sua vez, a tinham adoptado da China, para transformar o que era uma confederação de tribos num verdadeiro império. Reforçaram também o seu controlo sobre o exército criando uma guarda pessoal, os janíçaros, que respondiam directamente ao soberano, embora com o tempo tenham acabado por controlá-lo.
No século XIV, o incipiente império começou a ganhar forma no panorama europeu como o temível rival que viria a ser ao longo dos séculos seguintes. As primeiras vitórias da Europa de Leste contra a Hungria e os seus vassalos foram um prelúdio da queda de Constantinopla em 1453, momento em que o mundo deveria ter aceitado que o Império Otomano chegara para ficar durante muito tempo.