Certa vez, dois pescadores retiraram do pego do Almourão um carrinho, todo de ouro, com dois bois, também de ouro. A encosta é íngreme e o carrinho era muito pesado, pelo que os afortunados foram pedindo a ajuda divina à medida que o empurraravam. E tanto puxaram e empurraram que, finalmente, o carrinho chegou inteiro ao cimo da serra”, diz a lenda. “Finalmente conseguimos! Quer Deus queira quer não queira, o carrinho já daqui não sai! De repente, o carrinho deu um salto, virou-se para a encosta e começou a descê-la vertiginosamente até desaparecer no rio onde, segundo reza, ainda se encontra.”

A lenda do carro de ouro procura uma explicação moral para a ocorrência do tão desejado metal nas aluviões do rio Ocreza. Na história documental, os poetas romanos elogiaram a riqueza aurífera do rio Tejo, conhecido como Aurifer Tagus. A sua cobiça deixou marcas por toda a bacia hidrográfica. Quem diria que as vagas feitas de calhaus e blocos que se sucedem, de um revolto Tejo que já não o é, são afinal rejeitados de uma antiga mina? O Conhal do Arneiro é um dos bons exemplos.

As evidências de mineração na Antiguidade estão ainda patentes nas margens do Ocreza, ao longo da Rota das Conheiras, com maior expressão nos terraços da Foz do Cobrão e de Sobral Fernando. Já referia Frei João Baptista, em 1758, que “este rio tem alguns cachões nos limites desta freguesia e, no tempo do Verão, vão algumas pessoas tirar ouro para as sua arcas”. São de Foz do Cobrão alguns dos últimos gandaieiros de ouro da Beira Baixa, que partilharam até recentemente o seu conhecimento.

Na década de 1980, o Grupo dos Amigos da Foz do Cobrão realizou a primeira pesquisa de ouro nas margens do Ocreza. Em 2007, juntou-se-lhe a Associação de Estudos do Alto Tejo e a Naturtejo para promover a memória do ouro.

As actividades de garimpo de ouro à bateia ocorrem nos meses da Primavera e do Verão, quando as águas dos afluentes mais auríferos do Tejo, os rios Ocreza e Erges, abandonam o leito de cheia. Os participantes são divididos em pequenos grupos que aprendem a detectar as armadilhas geológicas que propiciam a acumulação preferencial do denso metal, ocorrendo em pequenas pastanas ou pepitas entre outros minerais metálicos. O sedimento é então carregado a balde e concentrado nas caleiras de madeira, cujo fundo apresenta uma grade onde os minerais mais densos vão ficando retidos à medida que se procede a constantes lavagens. O concentrado é passado então para as bateias onde os participantes, de calça arregaçada, entram nas águas do rio num rodopio ritmado, até que se ouvem as primeiras exclamações de entusiasmo pela descoberta dos pequenos grãos de amarelo intenso: “Há ouro na Foz!”

Geopark Naturtejo