A história das primeiras mulheres que voaram é um conto de bravura arrebatadora e de vidas interrompidas demasiado cedo.
No dia 8 de Março de 1910, Raymonde de Laroche, antiga actriz de teatro parisiense, tornou-se a primeira mulher piloto com brevet do mundo. Morreu nove anos mais tarde, quando o avião experimental que pilotava se despenhou.
Harriet Quimby, uma jornalista famosa tornou-se a primeira mulher americana com brevet em 1911. Morreu um ano mais tarde, quando o seu avião caiu no Porto de Boston.
Em 1921, Bessie Coleman foi a primeira mulher negra a conseguir o brevet – teve de viajar até França para encontrar uma academia de voo que a ensinasse. Morreu cinco anos mais tarde, quando uma chave inglesa ficou encravada nos controlos do seu avião, despenhando-se no solo.
Voar era perigoso nos primeiros tempos da aviação. Os aviões eram “dispositivos frágeis feitos de bambu fio e tecido”, dizia a falecida historiadora Eileen Lebow. Não tinham cintos de segurança, nem um tecto para segurar o piloto caso o avião se virasse. No entanto, mulheres como Laroche, Quimby e Coleman estavam dispostas a arriscar a vida pela liberdade que os voos prometiam.
“A aviação era uma nova profissão aparentemente livre das expectativas de género e dos estereótipos sexuais que limitavam as mulheres”, comentou a historiadora Susan Ware na palestra inaugural “Amelia Earhart Lecture in Aviation History” do Museu Nacional do Ar e do Espaço em 2022. “As mulheres começaram a voar desde o início.”
Para muitas mulheres, as emoções de voar eram inebriantes, mas também uma oportunidade de serem avaliadas pelo seu próprio mérito. “Estas mulheres queriam ser julgadas como seres humanos e não como mulheres”, diz Ware.
Para Coleman, em particular, o voo era um caminho rumo a uma maior igualdade entre géneros e etnias. “Eu sabia que não tínhamos aviadores, nem homens nem mulheres, e sabia que a raça precisava de estar representada nesta área tão importante”, disse pouco depois de regressar de França para os Estados Unidos da América, em 1921. “Achei que o meu dever era arriscar a minha vida para aprender a pilotar e encorajar o voo entre mulheres e homens da raça que estavam muito para trás”. Antes de morrer, planeou abrir uma academia de aviação para aviadores afro-americanos.
Muitas das primeiras mulheres piloto partilhavam o sonho de o sucesso nesta área lhes dar mais independência. Como uma jornalista e pilota amadora escreveu em 1930, “uma mulher que encontre a realização pessoal nos céus, nunca mais precisará de viver a sua vida nos tempos livres de um homem.”
Alguma dessa independência derivava da facilidade de viajar prometida pela aviação nos seus primeiros tempos. Muitas pessoas, incluindo Amelia Earhart, acreditaram inicialmente que os aviões se tornariam bens familiares tão comuns como as bicicletas e os automóveis.
Outras mulheres apreciavam a independência financeira que achavam que a nova área lhes poderia oferecer. Neta Snook, cujo primeiro voo a solo foi num avião por si reconstruído, ganhava a vida disponibilizando-o para publicidade aérea, testes de voo experimental, passeios aéreos pagos e formação de pilotos novatos, incluindo Earhart. Gladys Roy, por outro lado, ganhava bem como pilota de acrobacias, dançando o Charleston e jogando ténis nas asas a meio dos voos, perante os espectadores deslumbrados dos seus espectáculos aéreos. (Snook reformou se da aviação quando ficou grávida, aos 20 e tal anos, e viveu até aos 95. Roy morreu com 25 anos, apanhada acidentalmente por uma hélice.)
As irmãs Katherine e Marjorie Stinson optaram por uma abordagem de mais longo prazo e abriram uma academia de aviação no Texas com a mãe e o irmão, onde deram formação a pilotos canadianos, entre outros, às vésperas da Primeira Guerra Mundial. Quando os EUA. entraram na guerra, a aviação civil do país – incluindo a Academia de Voo Stinson School — foi encerrada. Katherine foi para a Europa trabalhar como motorista de ambulâncias e Marjorie tornou-se projectista aeronáutica da Marinha.
A guerra e o desenvolvimento da aviação comercial conspiraram para atenuar as esperanças de igualdade no ar. Mulheres pilotos experientes como LaRoche e Katherine Stinson voluntariaram-se para servir nas forças aéreas emergentes dos seus países durante a Primeira Guerra Mundial. Foram rejeitadas. As forças armadas preferiam treinar homens sem experiência. O mesmo padrão ocorreu na Segunda Guerra Mundial, embora as Mulheres Piloto de Serviço da Força Aérea (WASPs) tenham transportado aviões militares norte americanos e pilotos civis durante o conflito. (A União Soviética, porém, teve três regimentos de combate aéreo femininos.)
O sonho de todas as famílias terem um jacto privado nunca se materializou. A infra-estrutura necessária seria demasiado pesada. Em vez disso, a indústria da aviação comercial desenvolveu-se contratando homens – muitos dos quais tinham sido formados como pilotos pelas forças armadas. Não valia a pena salientar, como Earhart fez, que se as mulheres tivessem acesso à formação e aos equipamentos que os homens tinham os seus resultados seriam certamente tão bons”.
Helen Richey tornou-se a primeira mulher piloto comercial em 1934, mas foi perseguida até se afastar do seu trabalho. O Departamento do Comércio dos EUA., sob pressão do Sindicato dos Pilotos, inteiramente masculino, decretou que as mulheres não podiam pilotar voos com más condições meteorológicas (anteriormente já tinham considerado “manter as mulheres piloto em terra nove dias por mês durante a menstruação”, segundo Ware).
Não houve mais mulheres piloto em voos comerciais até 1973, quando Emily Howell Warner foi contratada pela Frontier.