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2010 A Sagrada Família ergue-se acima das avenidas de Barcelona, definindo a linha do horizonte na baixa da cidade.

“O meu cliente não tem pressa”, costumava dizer Antoni Gaudí, referindo-se a Deus. O arquitecto justificava assim a demora na construção da Igreja da Sagrada Família. Quase um século depois, o templo continua a ser um local de construção, um sonho de pináculos e fachadas ornamentadas erguido a 170 metros em Barcelona, atraindo dois milhões de visitantes por ano. Em Novembro deste ano, Bento XVI consagrou-o como basílica. As previsões de conclusão para 2026 parecem exequíveis. Será então o momento de reavaliar a empreitada épica de Gaudí e as ideias prescientes que lhe estão subjacentes.

sagrada família

A Sagrada Família sempre foi venerada e vilipendiada. Os surrealistas dizem que Gaudí é um dos seus, enquanto George Orwell apelidou a igreja de “um dos edifícios mais hediondos do mundo”. Tão idiossincrática como o próprio Gaudí, ela é uma visão inspirada pela crença religiosa do arquitecto e pelo seu amor pela natureza. Ele compreendia que o mundo natural é feito de formas curvas e não de linhas rectas. E reparou que a construção natural tende a favorecer os materiais robustos como a madeira, o músculo e os tendões. Com estes modelos orgânicos em mente, Gaudí baseou os seus edifícios numa premissa simples: se a natureza é a obra de Deus e se as formas arquitecturais derivam da natureza, a melhor maneira de honrar Deus é desenhar edifícios baseados na Sua obra. 


Segundo o especialista Joan Bassegoda Nonell, “a famosa frase de Gaudí, ‘a originalidade é regressar à origem’, significa que a origem de todas as coisas é a natureza, criada por Deus”. Mais do que a fé, foi a crença de Gaudí na beleza da eficiência da engenharia natural que antecipou a ciência contemporânea do biomimetismo.

Nascido em 1852 junto à vila de Reus, Gaudí cresceu fascinado com a geometria e as maravilhas naturais do espaço rural catalão. Após concluir a faculdade de arquitectura, Gaudí criou o seu próprio estilo, uma síntese de elementos neogóticos, orientais e arte nova. Para Gaudí, a forma e a função eram inseparáveis. A beleza estética só era alcançável depois da eficiência estrutural, que domina o mundo natural.

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2000 A nave central é concluída. O avanço tecnológico acelerou o progresso desde então.

Em 1883, Gaudí herdou a Sagrada Família de outro arquitecto, que estabelecera uma base neogótica tradicional. Gaudí imaginou uma narrativa visual da vida de Cristo, mas sabia que o projecto não seria concluído no seu tempo de vida. Durante mais de 12 anos, até à sua morte, em 1926, Gaudí concebeu modelos geométricos tridimensionais em vez de desenhos convencionais. Embora muitos tenham sido destruídos durante a guerra civil espanhola, estes modelos foram essenciais para os sucessores de Gaudí porque “contêm o DNA estrutural do edifício”, explica Mark Burry, um arquitecto que trabalhou 31 anos sobre a Sagrada Família, recorrendo a desenhos e aplicações informáticas para tornar os desenhos de Gaudí compreensíveis para os artesãos actuais. “Os modelos são a forma como Gaudí agarrou numa ideia complexa e a explicou de modo a que os outros pudessem entendê-la e a continuassem após a sua morte”.

Adrian Bejan afirma que as fachadas da Sagrada Família são baseadas na proporção divina, a relação geométrica “por detrás de toda a arte esteticamente agradável”. Adrian é professor de engenharia mecânica na Universidade de Duke e definiu a “Lei Constructal”, afirmando que o desenho da natureza é um fenómeno universal da física. Adrian reconhece Gaudí como antepassado e “equilibrista na fronteira que separa a arte da ciência”. Ele compreendia que a natureza é regida pelas leis da matemática. O que é mais forte é inerentemente mais leve e mais eficiente e, consequentemente, mais belo”.

No centro do projecto de Gaudí, encontra-se uma verdade intemporal. “Olhando para o futuro, a lição de Gaudí não é copiar as suas soluções, mas procurar inspiração na natureza… A natureza nunca passa de moda”, resume Joan Bassegoda Nonell.