O Verão é a época dos mercados de produtores locais e os supermercados estão cheios de produtos da estação quente, chocando-nos com os preços exorbitantes das alternativas biológicas. Isto levanta a questão: serão os frutos e legumes biológicos mais ricos em nutrientes do que os seus parentes convencionais? A resposta mais curta é sim – mas a mais comprida é mais complexa do que poderia pensar.

Embora possa parecer contra-intuitivo, os regulamentos para os alimentos biológicos do Departamento de Agricultura dos EUA não se focam nos benefícios para a saúde da pessoa que saboreia aquele pimento ou aquele pêssego. Em vez disso, a ênfase está na forma como os produtos biológicos são cultivados – sobretudo, protegendo o solo através do uso de compostos e estrumes e evitando químicos sintéticos (embora o uso de pesticidas possa ser permitido se as pragas de insectos não puderem ser controladas de forma natural).

Contudo, um dos principais atractivos para os consumidores é a ideia de serem mais saudáveis, por isso é importante os cientistas compreenderem se isso é verdade, diz Julia Baudry, que estudou essa questão no independente Instituto Nacional de Investigação da Agricultura, Alimentação e Ambiente, em França.

Décadas de estudos tornaram a resposta mais complicada. Alguns, sobretudo os primeiros, encontraram poucas diferenças nutricionais entre os alimentos biológicos e os convencionais. Outros declararam que as vantagens eram inúmeras. Esta disparidade reflecte, provavelmente, variações nas práticas de cultivo das explorações biológicas e, talvez mais importante, na forma como a nutrição é definida, diz David Montgomery, cientistas especializado em solo da Universidade de Washington. “Existem diferenças naquilo que estamos efectivamente a medir e a comparar”, afirma.

De um modo geral, após realizar uma análise para a revista científica "Frontiers" e o seu livro "What Your Food Ate" — e sim, as plantas também comem, diz ele, Montgomery determinou que os alimentos cultivados biologicamente e em solos saudáveis têm menos resíduos de pesticidas e maiores quantidades de fitoquímicos ricos em antioxidantes como flavonóides e carotenóides.

“É discutível se as diferenças serão suficientes para serem um motivo de preocupação, mas, da minha perspectiva, o melhor nível de pesticidas na minha comida é nenhum e o melhor nível de fitoquímicos é mais”, comenta.

É claro que o consumo de qualquer fruto ou legume é benéfico. Consumir grandes quantidades de produtos frescos está associado a tudo, desde a condição cardíaca à redução do risco de cancro. O americano médio consome apenas dez por cento da dose diária recomendada de legumes e 12 por cento de fruta.

Organico
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Menor incidência de cancro e outras doenças

Os produtos biológicos certificados estão apenas amplamente disponíveis apenas há cerca de duas décadas, diz Dave Chapman, agricultor biológico de longa data em Vermont. As vendas anuais de todos os produtos alimentares orgânicos (verdes e leite, entre outros) atingiram agora o valor de 2.000 milhões de dólares, quase o dobro de há uma década, mas representam apenas cerca de seis por cento do mercado alimentar dos EUA. Os alimentos biológicos custam, geralmente, cerca de mais 20 por cento do que os convencionais, em parte por o seu cultivo ser mais dispendioso.

Os estudos iniciais, que causaram confusão sobre os dividendos para a saúde, limitaram a sua análise a vitaminas, minerais e macronutrientes (como hidratos de carbono e proteínas). Contudo, segundo Montgomery, foram assim realizados por que o governo definiu doses diárias recomendadas para o seu consumo.

Uma revisão de 200 estudos realizada em 2012 confirmou que os níveis de vitaminas, como A e C, e minerais, incluindo cálcio e ferro, não são significativamente diferentes entre as ofertas biológicas e as convencionais.

Esses estudos não se debruçaram tanto sobre a questão dos fitoquímicos – os compostos que abundam nos produtos frescos e que reduzem a inflamação, fortalecem o sistema imunitário e promovem a saúde em geral – pois não existe uma dose diária recomendada o seu consumo.

Quando os investigadores se concentraram especificamente nestes compostos, descobriram que os alimentos biológicos são 12 por cento mais ricos e têm níveis mais elevados de carotenóides. E as pessoas que consumiram alimentos convencionais durante três semanas e, posteriormente, alimentos orgânicos durante outras três semanas, apresentaram níveis mais altos de flavonóides na sua urina após as refeições biológicas.

Para Montgomery, isso faz sentido por que as plantas aumentam os níveis desses compostos para se protegerem de insectos e doenças. Os alimentos cultivados convencionalmente não precisam de o fazer, pois estão protegidos pelos químicos sintéticos.

Fotoquímicos

A quantidade superior de fitoquímicos poderá ser uma das razões para os estudos observacionais de Baudry terem constatado taxas de incidências mais baixas de cancro da mama, entre outros, e diabetes tipo 2 em pessoas que consomem mais alimentos biológicos. Alguns cientistas dizem que os estudos observacionais podem apresentar falhas porque as pessoas que consomem regularmente alimentos biológicos diferem de muitas formas das pessoas que não o fazem: costumam ser mais ricas e ter uma formação académica mais avançada, por exemplo, e tendem a melhorar a sua saúde com a prática regular de exercício físico.

Baudry diz que ela e as suas colegas tiveram o cuidado de levar tudo isso em consideração. “Estamos muito confiantes de que estamos a controlar a quantidade certa de factores neste estudo”, afirma. Mesmo assim, estes estudos não conseguem apontar causas. Como os investigadores declararam no resumo do seu artigo na plataforma "SienceDirect", para se poder afirmar que o consumo de alimentos biológicos diminui a incidência de doenças, seria necessário realizar experiências directas.

O facto de os sujeitos examinados pelo estudo de Baudry serem mais saudáveis pode também ser consequência daquilo que os alimentos biológicos não contêm: adubos sintéticos e pesticidas. A revisão realizada em 2012 concluiu que os resíduos de pesticidas nos produtos convencionais era mais de 30 por cento superior do que nos alimentos biológicos. Outros investigadores mediram um valor de 48 por cento mais elevado do metal cádmio – uma toxina existente em alguns adubos que pode acumular-se no fígado e nos rins humanos.

A maioria dos estudos sobre os riscos destes químicos foram realizados com trabalhadores agrícolas, uma vez que estes estão muito mais expostos. Um relatório de 2022 documentou diversos problemas de saúde, desde dificuldades de concentração e sintomas neurológicos e dores no peito, em agricultores que utilizavam químicos à base de organofosfatos. Com efeito, a Organização Mundial da Saúde diz que alguns destes insecticidas são, provavelmente, carcinogénicos. Apesar disso, os níveis de químicos presentes no cultivo convencional costumam situar-se abaixo dos limites de segurança.

Para além do biológico: a agricultura regenerativa

Quando em busca dos alimentos mais saudáveis, as pessoas devem olhar para além daquilo que está rotulado como biológico e aprender como o alimento foi cultivado, diz Tim LaSalle, co-fundador do Centro de Agricultura Regenerativa e Sistemas Resilientes da California State University, em Chico.

Devemos ter em conta que a legislação e os regulamentos que controlam os alimentos biológicos se focam na qualidade do solo. Chapman, co-director executivo do Real Organic Project, compara a diversidade dos microrganismos em solos saudáveis com a variedade existente nos nossos intestinos. “Se o nosso microbioma não for saudável, nós não seremos saudáveis”, diz. “O mesmo se aplica ao solo.”

É por isso que Chapman acha errado que a USDA permita que plantas de cultivo hidropónico – ou seja, sem solo – sejam consideradas biológicas. As plantas hidropónicas são alimentadas artificialmente, tipicamente com azoto. “As plantas estão suspensas no ar e os nutrientes chegam-lhes essencialmente através de um tubo IV”, explica. “Isto não tem nada a ver com a horta do avô.” Chapman lamenta o grande número de grandes empresas do ramo alimentar cujos produtos biológicos são cultivados desta forma.

Agricultura regenerativa

Os consumidores que procuram alimentos cultivados no melhor solo possível devem estar atentos aos produtos de agricultura regenerativa, diz LaSalle, sejam estes certificados como biológicos ou não. Este movimento sublinha a qualidade do solo: embora não exija ausência de pesticidas e herbicidas, é um tipo de ecossistema que costuma reduzir a necessidade de recorrer a estes produtos químicos, explica.

Os agricultores que praticam agricultura regenerativa seguem três princípios básicos: não lavram o solo antes do plantio, porque isso mata os organismos que vivem junto à superfície; utilizam várias espécies de culturas de cobertura entre épocas de cultivo, pois as suas raízes nutrem o solo com diversos compostos; e mantêm as plantas na terra durante o máximo de tempo possível em vez de a deixarem em pousio entre culturas.

Estas estratégias aumentam a rede de fungos e o número de minhocas e outros organismos abaixo da superfície, que fornecem nutrientes adicionais às plantas. Legumes como brócolos e couve-flor cultivados em campos com solo melhorado desta forma poderão conter dez vezes mais fitoquímicos, segundo um artigo publicado na "European Journal of Nutrition".

REGENERATIVO VS BIOLÓGICO

No entanto, o termo regenerativo não se encontra regulado, por isso as pessoas podem rotular (e fazem-no) alimentos que não se qualificam como tal, lamenta Chapman. (Biológico é um termo legal, embora Chapman diga que a aplicação da lei deixa muito a desejar, sobretudo nos cereais importados.)

Para encontrar os alimentos mais saudáveis e mais saborosos neste Verão, LaSalle aconselha uma visita aos mercados locais de produtores, onde poderá perguntar aos agricultores não só se eles evitam pesticidas, como se lavram a terra e o que fazem entre estações de cultivo.

Contudo, Britt Burton-Freeman, director do Centro de Investigação em Nutrição do Illinois Institute of Technology, teme que o foco nos produtos biológicos possa estar a impedir as pessoas de consumirem fruta e legumes suficientes. No inquérito que realizou a 510 consumidores com baixos rendimentos – a maioria dos quais disse preferir alimentos biológicos, mas não ter dinheiro para os comprar – a referência a pesticidas tornava algumas pessoas menos propensas a quererem comprar quaisquer produtos. “O negócio alimentar precisa de compreender melhor como as suas mensagens podem influenciar o consumo”, diz.

As pessoas que podem comprar alimentos biológicos bem cultivados precisam de decidir sozinhas se estes valem o dinheiro extra, diz Montgomery. “Mas se quiser comer da forma mais saudável possível, deve preferir uma dieta rica em alimentos frescos e integrais cultivados em solos saudáveis e férteis”.