Novos dados recolhidos pelo Telescópio Espacial James Webb (JWST), da NASA, aprofundaram o mistério de quão depressa o universo está a expandir-se. A descoberta sugere que poderá ser necessária uma física desconhecida para ajudar a explicar este enigma cósmico.

Desde que nasceu, há cerca de 13.800 milhões de anos, o universo continua a expandir-se em todas as direcções. Analisando a actual taxa de expansão cósmica, conhecida como constante de Hubble, os investigadores podem estimar a idade do universo e possíveis pormenores sobre o seu destino, nomeadamente se continuará a expandir-se para sempre, se colapsará sobre si próprio ou até se irá desfazer-se.

Os investigadores usam duas estratégias principais para medir a constante de Hubble. Uma monitoriza objectos próximos cujas propriedades são bem conhecidas, como supernovas e estrelas pulsantes denominadas estrelas variáveis Cefeidas, para calcular as suas distâncias e quão rapidamente estão a afastar-se de nós. O outro método examina a radiação cósmica de fundo em microondas, a radiação remanescente do Big Bang para estudar as condições iniciais do universo e estimar quão depressa se expandiu desde aqueles tempos primordiais.

Inesperadamente, estes dois métodos geraram dois resultados antagónicos na última década. No entanto, observações fornecidas pela radiação cósmica de fundo realizadas pelo Observatório Espacial Europeu Planck sugerem que o universo está a expandir-se a cerca de 63,4 quilómetros por segundo por megaparsec (uma distância equivalente a 3,26 milhões de anos-luz.) Em contraste, os dados fornecidos por supernovas e cefeidas próximas sugerem uma velocidade muito maior: cerca de 73 quilómetros por segundo por megaparsec.

A resolução desta crise, conhecida como tensão de Hubble, poderá esclarecer-nos sobre a evolução e o destino do cosmos. Uma das possibilidades é simplesmente que um ou mais dos métodos utilizados para estimar este valor estejam errados.

“Havia esperanças de que esta discrepância desaparecesse, de que fosse apenas um erro de nas medições”, diz Adam Riess, astrofísico do Instituto Científico do Telescópio Espacial em Baltimore, que ganhou o Prémio Nobel da Física em 2011 por ter ajudado a descobrir que a expansão do universo estava a acelerar.

No novo estudo, Riess e os seus colegas aproveitaram a alta resolução do Webb e analisaram mais de 320 cefeidas em duas galáxias – a NGC 4258, situada a cerca de 23 milhões de anos-luz, e a NGC 5584, a cerca de 100 milhões de anos-luz.

Os investigadores descobriram que o Webb proporcionava aproximadamente três vezes mais precisão do que o Telescópio Espacial Hubble. “Eu ficaria satisfeito com 20 por cento, por isso, o triplo é algo realmente espectacular”, diz Riess.

Em termos gerais, as novas observações coincidiram com as estimativas de distância prévias fornecidas pelo Hubble. “Os primeiros resultados passaram no teste do JWST”, diz John Blakeslee, um astrónomo do National Optical-Infrared Astronomy Research Laboratory, em Tucson, no estado de Arizona, que não participou neste estudo.

“A dada altura, temos de admitir que não se trata de um erro de medição e, assim sendo, está a dizer-nos algo muito interessante sobre o universo”, diz Riess. “É um enigma muito profundo, mas é um bom enigma.” 

O funcionamento desconhecido do cosmos

Estas novas descobertas sugerem que a tensão de Hubble poderá dever-se a algo mais fundamental do que uma imprecisão. Se ambos os valores estiverem certos, então está a faltar-nos alguma informação sobre a forma como o universo cresceu.

Os dados fornecidos por supernovas e cefeidas próximas indicam que a expansão está a acelerar mais depressa do que previsto com base nas condições existentes quando o universo era novo, que se reflectem na radiação cósmica de fundo. Esta aceleração é ainda maior do que os investigadores conseguem actualmente explicar através da energia escura: a força misteriosa que, segundo os teóricos, impulsiona a crescente expansão do universo.

“Temos uma clara divergência entre as observações e o modelo dominante do universo”, diz Pierre Kervella, astrónomo do Observatório de Paris, que não participou no estudo. “É agora mais provável que o problema se encontre no modelo do universo do que nas observações, que são bastante sólidas.”

Uma possível explicação é que “poderá haver um problema na teoria gravitacional que estamos a usar – a relatividade geral”, diz Kervella. A constante derivada da radiação cósmica de fundo depende de um modelo baseado na relatividade geral, explica Kervella.

Outra possibilidade é a existência de uma forma insuspeita de energia escura no universo primitivo, observa Riess. Ou de a energia escura ter mudado ao longo do tempo, desde quando o universo era muito jovem e compacto até se tornar mais velho e mais amplo.

“Há milhentas ideias e todas têm os seus prós e contras”, diz Riess. “De momento, o sapatinho da Cinderela não serve a ninguém”.

Pistas adicionais

Recentemente, os cientistas desenvolveram outra técnica para medir a constante de Hubble, que poderá ajudar a esclarecer este mistério. Baseia-se em ondas gravitacionais, deformações no tecido do espaço-tempo causadas pela aceleração da massa.

Em 2017, os cientistas detectaram ondas gravitacionais geradas pela colisão de estrelas de neutrões. Teoricamente, estas ondas podem ser utilizadas para averiguar a distância a que estes choques ocorreram, enquanto a luz emitida pelos impactos pode revelar a velocidade com que estão a deslocar-se em relação à Terra. Os investigadores podem utilizar ambos os conjuntos de dados para calcular a constante de Hubble.

Conclusões preliminares obtidas através deste método sugerem um valor de quase 70 quilómetros por segundo por megaparsec para a constante de Hubble – mesmo no meio dos outros dois métodos. Analisar colisões entre cerca de 50 pares de estrelas de neutrões ao longo dos próximos cinco a dez anos poderá fornecer-nos dados suficientes para alcançarmos resultados mais conclusivos. 

Entretanto, o JWST continuará a medir as distâncias das cefeidas noutras dezenas de galáxias, diz Blakeslee: um teste ainda mais sólido das medições no universo próximo.

No entanto, até alguém conseguir descobrir a peça que falta neste puzzle cosmológico, a tensão de Hubble não vai a lado nenhum.