Para alguns viajantes, uma viagem de catamarã ao largo de Oahu, no Hawai, ou um passeio de camelo no deserto de Marrocos não são experiências de férias invejáveis. São encontros com náuseas, tonturas e suores frios.

O enjoo por movimento pode acontecer a quase qualquer um, incluindo crianças e cães. Estudos sugerem que mais de metade de todas as pessoas que andam de automóvel sofrem de enjoo por movimento. Inquéritos recentemente realizados a membros da Marinha indiana, pescadores da Islândia e biólogos marinhos da Carolina do Sul indicam que até 80% dos indivíduos que trabalham em barcos sofrem, por vezes, de enjoos.

“Até já há ciberenjoos em pessoas que olham para o telefone enquanto viajam de automóvel ou usam óculos para ver um filme 3D”, diz Andrea Bubka, professora de psicologia na Saint Peter’s University, em Nova Jérsia, que estudou profundamente a cinetose.

Saiba por que o enjoo por movimento acontece e o que os viajantes podem fazer para preveni-lo.

O que o causa

Os cientistas não sabem a razão exacta por que algumas pessoas sentem náuseas assim que põem o pé num barco enquanto outras podem ler longos romances no banco de trás de um automóvel. Existem, no entanto, algumas teorias.

Muitos académicos creem que a cinetose é causada por um conflito sensorial: uma discrepância entre aquilo que as pessoas vêem e aquilo que os seus corpos experienciam. “Os seres humanos não evoluíram para viajar em vaivéns espaciais ou jogar videojogos de realidade virtual”, diz Marcello Cherchi, neurologista da Faculdade de Medicina Feiberg, da Northwestern University.

O conflito sensorial ocorre quando o nosso organismo sente os abanões de um ferry ou as sacudidelas de um autocarro percorrendo estradas de montanha serpenteantes e os nossos olhos, ouvidos e outros sentidos não conseguem acompanhar o movimento. Isto causa sintomas como boca seca, tonturas, dores de estômago ou dores de cabeça fortes.

No entanto, outros cientistas acreditam que as pessoas sofrem de enjoo por movimento por não saberem mudar, instintivamente, a forma como se sentam, permanecem em pé ou caminham num meio de transporte em movimento. Essa dissociação pode provocar mau estar.

Um dos maiores defensores desta “teoria da estabilidade postural” é Tom Stoffregen, professor de cinesiologia na universidade do Minnesota. “Num barco, ou num avião, temos de aprender a deslocar-nos de maneira diferente – como os marinheiros, que ficam com ‘pernas de mar’ ao fim de alguns dias”, afirma. “O segredo é o controlo físico do nosso corpo e alguns indivíduos adaptam-se mais depressa do que outros.”

enjoo por movimento

Patricia Cowings (em pé), psicopatologista norte-americana que estudou exaustivamente a cinetose, trabalha com um sujeito de teste. Fotografia de Hum Images, Universal Images Group/Getty Images.

A genética também pode desempenhar o seu papel. Um estudo realizado em 2015, com 480.000 clientes da empresa de testes de ADN 23andme, identificou 413 marcadores genéticos – muitos dos quais relacionados com o equilíbrio, o desenvolvimento dos olhos, dos ouvidos e do cérebro – que podem tornar os indivíduos predispostos a enjoo por movimento.

Evitando o enjoo por movimento

A forma mais fácil de combater o enjoo por movimento é impedi-lo de acontecer. Hidrate-se e mantenha-se fresco durante as viagens, seja sentando-se junto a uma janela no automóvel, ligando a ventoinha em cima de si no avião ou indo para o convés num navio de cruzeiros.

“E tenha cuidado com o que come quando viaja”, diz Bubka. Tudo o que transtorne o seu estômago em terra firme – comer demais (ou de menos), ingerir quantidades excessivas de álcool ou cafeína - pode ser amplificado pelo movimento.

“Faça tudo o que puder para assegurar que a sua visão não está obstruída”, diz Natacha Tuznik, médica especializada em medicina de viagens na Universidade da Califórnia, Davis. “Olhe para o horizonte quando estiver no mar e sente-se no banco da frente do carro, onde consegue ver a estrada e aquilo que se aproxima.” Observar bem aquilo que se aproxima ajuda os nossos olhos e o ouvido interior a sincronizarem-se mais depressa com outras funções do organismo.

Evitando os gatilhos e treinando o organismo contra a náusea

Alguns estudos sugerem que fazer exercícios físicos ou mentais pode ajudar os seres humanos a treinarem-se para sofrerem menos enjoos. O “Método Puma”, desenvolvido por um cirurgião aéreo para ajudar pilotos com cinetose, usa alongamentos semelhantes aos do yoga e movimentos angulares para desenvolver resistência contra as náuseas. Um estudo de 2020 da Universidade de Warwick, em Inglaterra, concluiu que, depois de fazerem exercícios de treino visuoespacial (encontrar objetos escondidos em puzzles, dobrar papel) 15 minutos, muitos sujeitos deixaram de ficar enjoados em viagens de automóvel.

“A vantagem é que estas abordagens não requerem medicação", diz Cherchi. “A desvantagem é que podem causar um desconforto considerável, pelo menos no início”.

enjoo por movimento

Pessoas deslocam-se numa estação de metro na cidade de Nova Iorque em 2017. Qualquer meio de transporte — desde comboios a aviões e barcos — pode induzir enjoo por movimento nos seres humanos. Fotografia de John Taggart, Redux.

As pessoas propensas a enjoo por movimento também podem treinar “evitamento de gatilhos”, mantendo-se afastadas de actividades que lhes causem mau estar. Se uma viagem longa de autocarro lhe causar aginia, alugue um carro e sente-se no banco da frente ou conduza-o. As pessoas propensas a enjoos marítimos devem fazer cruzeiros em rios de águas calmas ou escolher navios oceânicos maiores, a bordo dos quais a viagem é mais tranquila.

A medicação – ou os gadgets – pode ajudar

Outra forma de combater a náusea relacionada com viagens? Tome um remédio de venda livre para o enjoo (como o Vomidrine) ou aplique um adesivo prescrito de escopolamina (geralmente colocado atrás da orelha). Ambos são anticolinérgicos, bloqueando e inibindo o sistema nervoso central para criar um efeito calmante nos músculos do estômago e do intestino.

No entanto, estes medicamentos só funcionam quando tomados pouco antes de embarcar naquele navio ou avião. Estes fármacos também podem causar tonturas e muitas pessoas têm problemas de saúde que as impedem de usá-los. Stoffregen aconselha os viajantes que não querem tomar comprimidos a experimentarem pastilhas ou rebuçados de gengibre.

“Existem provas bem documentadas de que um pouco de gengibre pode reduzir significativamente as náuseas”, afirma.

Diversos gadgets prometem melhorar o enjoo por movimento. Existem várias braceletes de acupressão, desde modelos baratos e básicos a caros e de alta tecnologia. Uns óculos anti-náuseas de aspecto bizarro chegaram ao mercado há cerca de dois anos, com os aros cheios de líquido e quatro lentes redondas sem vidro. O princípio é que o líquido dos óculos desloca-se juntamente com o utilizador, criando um horizonte artificial.

Embora muitos utilizadores tenham afirmado sentirem-se melhor quando usam estes dispositivos a bordo de aviões, comboios e automóveis, os estudos ainda não comprovaram a sua eficácia. “Mas não me interessa se é efeito placebo. Se não ficarmos enjoados, não quero saber da ciência”, diz Stoffregen. “É dinheiro bem gasto.”

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