Quando a população mundial ultrapassar nove mil milhões de habitantes em meados deste século, as nossas necessidades alimentares aumentarão 50%. Como poderemos satisfazê-las sem arrasar mais florestas e sem expandir a indústria alimentar, dois dos principais responsáveis pelas alterações climáticas? Como conseguiremos manter a saúde do nosso solo para que as nossas culturas possam prosperar?
Estas perguntas empurram-nos para terrenos lamacentos. Activistas como LinYee Yuan, editora da revista Mold, que se dedicam ao tema do futuro da alimentação, não têm dúvidas: “Para alimentarmos nove mil milhões de pessoas, vamos precisar de usar todas as cartas do baralho.”
É provável que muitas dessas cartas impliquem tentativas de descobrir novas formas de produzir proteína, à medida que os danos ambientais provocados pela criação de animais se tornarem cada vez mais insustentáveis. A criação de gado representa cerca de um sétimo de todas as emissões de gases com efeito de estufa gerados pelos seres humanos. A produção de carne de bovino em instalações altamente confinadas exige, por norma, quase oito vezes mais água e 160 vezes mais terra por caloria do que o cultivo de legumes ou cereais. Não admira, portanto, que funcionários das Nações Unidas venham lançando apelos no sentido de se reduzir o consumo de carne de vaca. Novas empresas do ramo alimentar estão a levar esse apelo a sério.
Outras empresas andam à procura de soluções para industrializar a produção de carne de modo a dispensar a necessidade de animais. Os líderes da indústria comparam a produção de carne em laboratório à produção de cerveja, mas trabalhando células animais em enormes recipientes de cultura em vez de fermentarem cereais. “Vai parecer-se muito com uma cervejeira”, diz Bruce Friedrich, director executivo do Good Food Institute, um grupo industrial. E, tal como a cerveja é servida por uma torneira, diz Friedrich, “se for carne picada, não vai ser muito diferente.”
Entretanto, os insectos comestíveis começam a conquistar espaço no mercado norte-americano. Não são ainda como os petiscos que se comem no Tailândia e no México, mas têm sido usados como ração animal de elevado teor proteico e como ingrediente para alimentos transformados. O seu valor ambiental, sobretudo dos grilos, é evidente. Os grilos oferecem mais proteína e micronutrientes por quilograma do que a carne de vaca. Prosperam em locais escuros e densamente povoados, permitindo a sua criação em unidades fabris com uma pegada ecológica minúscula. A Aspire, sediada no Texas, gere a maior unidade de produção de grilos com qualidade alimentar dos EUA e tem um negócio em crescimento, baseado essencialmente em pó de grilo usado no fabrico de pastelaria, barras energéticas e batidos. A sua produção dos próximos dois anos já está vendida.
As empresas do sector alimentar também estão a descobrir novos tipos de gordura. Cientistas empreendedores começaram por colher algas na seiva de um castanheiro da Índia, alteraram-nas para produzir maiores quantidades de óleo mais nutritivo e alimentaram-nas com cana-de-açúcar brasileira em recipientes de fermentação da altura de um edifício de seis pisos. De seguida, comprimiram-na, criando óleo de alga – um óleo alimentar ligeiro e de sabor neutro, com gordura monoinsaturada e com uma temperatura de degradação elevada, actualmente à venda sob a marca Thrive.
A ideia, dizem os promotores, é criar uma alternativa eficiente e consciente a gorduras como o óleo de palma, cuja produção tem causado devastação ambiental e social.
Há ainda outras soluções que se inspiram na natureza. Desde a década de 1980 que se desenvolvem esforços no sentido de obter um cereal perene que suplante culturas anuais como o trigo e o milho, tradicionalmente dependentes da movimentação anual da terra – o que retira nutrientes ao solo, aumenta a erosão e contribui para o escoamento de adubos. No início da década de 2000, os funcionários do Land Institute, um grupo de investigação agrícola com preocupações ecológicas do Kansas, estavam a fazer criação selectiva de um cereal conhecido como erva-de-trigo intermédia, ambicionando obter uma variedade com melhor rendimento, sementes de bom tamanho e resistência a doenças.
O resultado actual, chamado kernza, está a crescer em duzentos hectares nos EUA. Diversos produtores alimentares têm vindo a testá-la para a comercialização, incluindo uma rede de padarias em Nova Iorque, que já fez pão com este cereal, e uma empresa de Portland, que vende cerveja clara de kernza. A esperança é que um cereal mais resiliente possa contribuir para uma agricultura mais resiliente.
Sejam quais forem as nossas refeições daqui a 50 anos, as alterações climáticas poderão obrigar-nos a fazer melhor uso daquilo que já temos, resume Raj Patel, especialista em alimentação global. “O século XXI está a reconhecer que recursos previamente menosprezados como ervas daninhas e pragas podem ser, afinal, alimentos.”