Sabemos que os adolescentes
correm riscos, mas ficamos
 chocados ao ouvir falar deles.

Numa bela manhã de Maio, o meu filho mais velho, na altura com 17 anos, telefonou-me a dizer que tinha acabado de passar algumas horas numa esquadra de polícia. Aparentemente, fora apanhado a conduzir “um bocadinho depressa”. E o que significa “um bocadinho depressa?”, perguntei. Acontece que este produto da minha genética e dos meus desvelos amorosos, voara pela auto-estrada a 182 quilómetros por hora.
“Isso é ligeiramente mais do que ‘um bocadinho depressa’”, observei.
Concordou. Com efeito, a voz dele soava cabisbaixa e contrita. Nada objectou quando lhe disse que teria de pagar as multas e, provavelmente, os honorários de um advogado. Não rebateu quando lhe fiz notar que se algum imprevisto acontece a essa velocidade – um cão na estrada, um pneu rebentado, um espirro –, ele pode morrer. Na ocasião, mostrou-se de facto quase irritantemente razoável. Foi ao ponto de afirmar que o polícia tivera toda a razão ao mandá-lo parar, porque, nas suas palavras, “não pode andar toda a gente à toa a 182km/h”.

“Imprudente’ soa como se eu não fosse a prestar atenção. Mas ia."

Contudo, levantou uma objecção. Não gostou que uma das acusações formalizadas pelas autoridades referisse a condução imprudente. “Não é correcto”, juntou calmamente. “‘Imprudente’ soa como se eu não fosse a prestar atenção. Mas ia. Fiz questão de acelerar num troço vazio e seco de uma auto-estrada interestadual, em plena luz do dia, com boas marcações na estrada e sem trânsito. É isso que eu quero que saiba. Se o fizer sentir-se melhor, eu ia totalmente concentrado.”Na verdade, até me senti melhor ao ouvi-lo. 
E isso incomodou-me porque não percebi porquê. Agora já percebo.

TEENAGERS 1

Reflectida no retrovisor do camião dos pais, Amy Olsen, aluna do 12.º ano, aguarda que a luz do semáforo mude em Austin, no Texas.

A aventura de alta velocidade do meu filho suscita a pergunta há muito levantada pelos investigadores que dedicam o seu estudo a essa classe de seres humanos a que chamamos adolescentes: o que pode explicar este tipo de comportamento? Esta forma de interrogação parece ser outra maneira de manifestar surpresa: o que há de errado com estes miúdos? Porque agem desta maneira? Ao longo das eras, a maior parte das respostas remetia para forças ocultas que apenas afectavam os adolescentes. Há mais de 2.300 anos, Aristóteles concluiu que “os jovens são aquecidos pela natureza tal como os ébrios pelo vinho”. Em “Conto de Inverno”, de William Shakespeare, um pastor anseia por que “não houvesse idade entre os 16 e os 23 anos ou que os jovens a passassem a dormir, pois nada mais há nesse tempo do que fazer filhos em donzelas, enganar os mais velhos, roubar, lutar”.

O que há de errado com estes miúdos? Porque agem desta maneira?

Os seus lamentos tingem igualmente a maior parte da investigação contemporânea. G. Stanley Hall, que iniciou o estudo formal dos adolescentes, acreditava que este período reproduzia etapas menos civilizadas do desenvolvimento humano. Freud encarou a adolescência como expressão de um torturado conflito psicossexual; Erik Erikson considerou-
-a a mais tumultuosa das diversas crises de identidade da vida. Em resumo, a adolescência foi sempre encarada como um problema.

TEENAGERS GRELHA 1

Decisões, decisões, decisões  Carros e festas, primeiros cigarros e namoros, responsabilidade escolar e tempo livre: os adolescentes defrontam-se com riscos pequenos e grandes todos os dias e, por vezes, as suas escolhas podem ser intrigantes. O melhor é pensar nelas como uma equação, afirma o psicólogo Laurence Steinberg. Nessa equação, não é atribuída às consequências a importância que deveriam ter.

TEENAGERS GRELHA 2

Esta forma de pensar prolongou-se até finais do século XX, período em que investigadores desenvolveram tecnologia de imagiologia capaz de visualizar o cérebro adolescente de maneira tão pormenorizada que permitia acompanhar o desenvolvimento físico do cérebro e os seus padrões de actividade. Estas ferramentas de imagiologia revelaram que os nossos cérebros demoram mais a amadurecer do que se pensava. Esta revelação sugeriu uma explicação simplista e pouco lisonjeira para o comportamento exasperante dos adolescentes, bem como uma explicação afirmativa e mais complexa.

O projecto demonstrou que o cérebro é sujeito a uma reorganização maciça entre os 12 e os 25 anos.

A primeira série completa de imagens digitalizadas do cérebro adolescente em desenvolvimento foi produzida no âmbito de um projecto do Instituto de Saúde dos EUA (NIH) que estudou mais de cem jovens à medida que eles cresciam durante a década de 1990. O projecto demonstrou que o nosso cérebro é sujeito a uma reorganização maciça entre os 12 e os 25 anos. 
O cérebro propriamente dito não cresce muito neste período. Já atingiu 90% da sua dimensão total aos 6 anos e o espessamento da parede craniana é responsável pela maior parte do crescimento posterior da cabeça. Mas passa então por uma remodelação generalizada, semelhante a uma actualização da rede e das ligações.


 

TEENAGERS 7

Se fizeres, eu também faço! Taylor Dicristofalo (à direita) diz que provavelmente não teria colocado um piercing na língua se a sua melhor amiga não a tivesse arrastado para uma “aventura excitante e de meter medo” na baixa de Austin. Ela tentou esconder o piercing dos pais, mas eles perceberam. Meses mais tarde, retirou a tacha durante uma noite. O buraco fechou. O pai agradecido comparou a remoção da tacha a um presente antecipado de Natal.

Para começar, os axónios (as fibras nervosas compridas utilizadas pelos neurónios para transmitir sinais a outros neurónios) vão-se tornando progressivamente mais isolados devido à deposição em camada de uma substância gorda denominada mielina (a matéria branca do cérebro), acabando por reforçar a velocidade de transmissão dos axónios em cerca de cem vezes. Nesse intervalo de tempo, as dendrites, projeccões utilizadas pelos neurónios para receber sinais dos axónios vizinhos, ramificam-se ainda mais, e as sinapses químicas (pontos em que os neurónios trocam informacões através da libertação de neurotransmissores) mais intensamente utilizadas tornam-se mais fortes. Ao mesmo tempo, as sinapses com pouco uso começam a fenecer. Esta “poda sináptica”, como por vezes é chamada, leva o córtex cerebral (a camada exterior de matéria cinzenta onde desenvolvemos grande parte do nosso pensamento consciente e complexo) a tornar-se mais fino, mas mais eficiente. Em conjunto, estas alterações transformam o cérebro num órgão muito mais rápido e mais sofisticado.

A parvoíce e a precipitação não 
são características definidoras da 
adolescência. Reparamos mais nelas porque nos incomodam ou põem em perigo os nossos filhos.

Este processo de amadurecimento prolonga-se pela adolescência. A imagiologia demonstrou que estas alterações físicas se deslocam em onda lenta, da região posterior para a região anterior do cérebro, partindo das zonas mais próximas do tronco cerebral, responsáveis pelas funções mais antigas e mais básicas em termos comportamentais – por exemplo, a visão, o movimento e o processamento fundamental – e atingindo as zonas mais recentes em termos evolutivos e do raciocínio mais complexo, na parte frontal. O corpo caloso, que une os hemisférios esquerdo e direito do cérebro e transporta a informação essencial para muitas funções cerebrais avançadas, torna-se paulatina-
mente mais espesso. 
Desenvolvem-se igualmente ligações mais fortes entre o hipocampo, uma espécie de directório da memória, e as regiões frontais que definem objectivos e ponderam diversas prioridades. Resultado: aperfeiçoamos a capacidade para integrar a memória e a experiência nas decisões tomadas. Ao mesmo tempo, as regiões frontais desenvolvem ligações mais ricas e velozes, permitindo-nos gerar e ponderar um número de variáveis e prioridades superior ao anterior.

TEENAGERS 5

Contar anedotas faz parte da comunicação entre Deborah Kipp e a sua filha, Anastassia. A jovem, de 18 anos, considera a mãe um exemplo a seguir, por estar sempre presente e nunca ser mandona. A neurocientista B. J. Casey observa: “A última coisa que se deve dizer a um filho adolescente é que certa coisa tem interesse, porque então ele fugirá dela a sete pés.” E não há nada de errado quando o adolescente questiona as convicções dos seus progenitores. 
É normal e saudável: ajuda-o a desenvolver uma noção de identidade.

Quando este desenvolvimento se processa na normalidade, melhoramos em matéria de ponderação equilibrada de impulsos, desejos, objectivos, interesse próprio, regras, ética e, até, altruísmo, gerando comportamentos mais complicados e, pelo menos ocasionalmente, mais sensatos. Mas por vezes, em especial a princípio, o cérebro faz o seu trabalho desajeitadamente. 
É difícil conseguir que todas estas áreas e sistemas em mudança se entreteçam numa rede.
Beatriz Luna, professora de psiquiatria da Universidade de Pitsburgo, recorre à neuroimagiologia para estudar o cérebro dos adolescentes e utilizou um teste simples que exemplifica esta curva de aprendizagem. Obteve imagens digitalizadas dos cérebros de crianças, adolescentes e jovens adultos com pouco mais de 20 anos, ao mesmo tempo que desempenhavam uma tarefa anti-sacádica, uma espécie de jogo de vídeo apenas para visualização, no qual a pessoa tem de impedir-se a si mesma de olhar para uma luz que aparece repentinamente. Para ser bem sucedida, é preciso resistir ao impulso normal que faz atender à informação nova e à curiosidade despertada por qualquer coisa proibida.

Em termos científicos, os adolescentes podem ser uma dor de cabeça. Mas 
são os seres humanos mais adaptáveis que existem.

As crianças de 10 anos obtêm resultados péssimos no teste, fracassando numa percentagem de cerca de 45%. Os adolescentes apresentam um desempenho muito melhor. Com efeito, aos 15 anos conseguem alcançar pontuações idênticas às dos adultos se estiverem motivados, resistindo à tentação em 70 a 80% das vezes. As descobertas mais interessantes de Beatriz Luna, contudo, não foram as pontuações. Foram as imagens cerebrais digitalizadas dos indivíduos que participaram no teste. Comparados com os adultos, os adolescentes tendem a dar menos uso às regiões do cérebro responsáveis por monitorizar o desempenho, identificar erros, planear e manter a concentração, zonas que os adultos pareciam utilizar automaticamente. Isto permite aos adultos recorrer a muitos recursos cerebrais e resistir melhor à tentação.

TEENAGERS 6

A novidade, a excitação, o risco e a procura da companhia dos iguais são características marcantes nos adolescentes, e parecem manifestar-se em quase todas as culturas.

No entanto, quando lhes era oferecido um incentivo suplementar, os adolescentes mostravam ser capazes de pôr essas regiões executivas do cérebro a trabalhar com mais afinco, melhorando as pontuações. E aos 20 anos os seus cérebros apresentam um desempenho muito semelhante ao dos adultos. Beatriz Luna suspeita que esta melhoria se deve à maior eficácia da região executiva do cérebro, resultante do enriquecimento das redes e da maior velocidade das ligações.

Adoráveis ao pequeno-almoço, insuportáveis ao jantar, brilhantes à segunda-feira, sonâmbulos ao sábado.

Estes estudos ajudam a explicar por que razão os adolescentes se comportam com uma incoerência tão frustrante: adoráveis ao pequeno-almoço, insuportáveis ao jantar, brilhantes à segunda-feira, sonâmbulos ao sábado. Além de normalmente não possuírem experiência, ainda estão a aprender a utilizar as novas redes dos seus cérebros. Stress, fadiga ou novos desafios podem perturbar as suas funções cerebrais. Abigail Baird, psicóloga da Faculdade Vassar que estuda os adolescentes, classifica este comportamento como desarticulação neuronal, equivalente à desarticulação física por vezes mostrada pelos adolescentes ao tentarem dominar os seus corpos em crescimento.
A curva de desenvolvimento lento e irregular revelada por estes estudos de imagiologia proporciona uma explicação tentadoramente concisa para a questão que atormenta os progenitores. Eles agem assim porque os seus cérebros ainda não estão completamente desenvolvidos!


 

TEENAGERS 2

Apoiado no tornozelo distendido que o empurrou para a reabilitação, Connor Sheehan, co-capitão dos Trojans, tinha uma opção: correr o risco de agravar a lesão ou ser suplente durante o jogo decisivo para o liceu Anderson, em Austin, a cidade onde a National Geographic acompanhou a vida de vários adolescentes no Outono de 2010. Connor jogou e lesionou-se de novo. A investigação sugere que os adolescentes valorizam mais a recompensa do que a consequência.

Nesta perspectiva, como se deduz dos títulos dos artigos editados em revistas científicas e publicações de divulgação sobre o funcionamento do “cérebro adolescente”, os adolescentes são apresentados como “uma tarefa em curso” e os seus “cérebros imaturos” levam a formular a seguinte pergunta: será que eles se encontram num estado “próximo do atraso mental”?
Porém, esta reportagem propõe-se contar uma história diferente do cérebro adolescente. Desde 2006, ao mesmo tempo que a hipótese da “tarefa-em-curso” se enraizava na nossa cultura, alguns investigadores começaram a ponderar as conclusões recentes dos estudos do cérebro e da genética a uma luz mais esclarecedora e mais positiva, claramente explicada pela teoria da evolução. A explicação daí resultante sobre o cérebro adolescente, à qual chamaremos teoria do adolescente adaptativo, apresenta os jovens não tanto como peças em bruto mas sobretudo como criaturas requintadamente sensíveis e altamente adaptáveis, quase perfeitamente equipadas para a tarefa de abandonar a segurança do lar e entrar no complexo mundo exterior. Este ponto de vista adapta-se melhor à descrição dos adolescentes. Mais importante: adapta-se melhor ao princípio mais essencial da biologia, que é o da selecção natural. A selecção é altamente destrutiva para as características disfuncionais da pessoa. Se um adolescente fosse, no essencial, um amontoado dessas características (ansiedade, parvoíce e precipitação; impulsividade, egoísmo e comportamento temerário), como teriam sobrevivido essas características à selecção? Não poderiam.

A teoria do adolescente adaptativo, apresenta os jovens não tanto como peças em bruto mas sobretudo como criaturas requintadamente sensíveis e altamente adaptáveis.

Na verdade, essas características perturbadoras não são exactamente identificadoras da adolescência. Reparamos mais nelas porque nos incomodam ou põem em perigo os nossos filhos. A neurocientista B. J. Casey exprime-se nos seguintes termos: “Quanto mais aprendemos sobre o que torna este período tão único, mais a adolescência se vai configurando aos nossos olhos como um período altamente funcional, senão mesmo adaptativo. O cérebro adolescente está perfeitamente adaptado para desenvolver as tarefas que é chamado então a desempenhar.”
Para conseguirmos ver para lá do adolescente distraído e desajeitado e perceber o jovem adaptativo que existe dentro dele, precisamos de analisar não certos comportamentos específicos e por vezes assustadores, mas as características mais amplas subjacentes a esses actos.
Comecemos pela paixão dos adolescentes pelas experiências excitantes. Todos gostamos de coisas novas e entusiasmantes, mas é durante a adolescência que lhes damos mais valor. É nessa época que atingimos o auge da procura de sensações muito vibrantes e do choque emocional do inusitado ou do imprevisto.
A busca de emoções fortes não é necessariamente impulsiva. Um indivíduo pode planear uma experiência de busca de emoções, como um salto de pára-quedas ou a condução a alta velocidade. Normalmente a impulsividade abranda ao longo da vida, começando aos 10 anos, mas esta atracção pelas emoções fortes atinge o auge perto dos 15 anos. Embora a procura de emoções fortes possa conduzir a comportamentos perigosos, também pode gerar comportamentos positivos: a necessidade urgente de conhecer muitas pessoas, por exemplo, pode criar um círculo de amigos mais amplo, o que em geral nos torna mais saudáveis, mais felizes, mais seguros e mais bem sucedidos.

Quando somos adolescentes, mais do que em qualquer outra época da vida, procuramos avidamente o risco.

Este lado optimista explica a razão pela qual a abertura à novidade continua a ser uma das características predominantes da adolescência. O amor pelo que é novo conduz à experimentação útil. Em termos mais abrangentes, a busca de sensações novas proporciona a inspiração necessária para entrar em terrenos por desbravar.
Outra característica acentuada durante a adolescência é a predisposição para correr riscos. Quando somos adolescentes, mais do que em qualquer outra época da vida, procuramos avidamente o risco. Esta hipótese é demonstrada em laboratório, onde os adolescentes correm mais riscos em estudos controlados sobre qualquer matéria e também o é na vida real, onde o período que medeia entre os 15 e os 25 anos marca o apogeu de todos os tipos de aventuras arriscadas e resultados nefastos. Neste grupo etário, a morte por acidente de quase todo o género (excepto acidentes de trabalho) ocorre a taxas mais elevadas. A maior parte dos casos de consumo excessivo de drogas ou álcool começa na adolescência e até as pessoas que, mais tarde, bebem de maneira responsável bebiam frequentemente de mais quando eram adolescentes.

TEENAGERS 8

Sem cotovelos, sem joelhos. O seu “clube de combate” tinha regras. Pelo menos uma sexta-feira por mês, os rapazes reuniam-se após as aulas no quintal das traseiras de Bryan Campbell (último à esquerda) para praticar luta e boxe. 
A mãe de Bryan consentia, desde que mantivessem o combate seguro: um nariz a sangrar foi a pior lesão sofrida. Os rapazes usavam os telemóveis para filmar os combates, publicando os vídeos num grupo privado do Facebook. Os combates proporcionavam-lhes momentos excitantes e recompensas sociais.

Mas afinal os miúdos andam todos estúpidos? Essa é a explicação convencional, alimentada pela acusação de que não raciocinam ou os seus cérebros em desenvolvimento não os ajudam.
Estas explicações não são sustentáveis. Como observa o psicólogo do desenvolvimento Laurence Steinberg, até os adolescentes de 14 a 17 anos (os que mais riscos correm) fazem uso das mesmas estratégias cognitivas de base utilizadas pelos adultos e normalmente resolvem os problemas raciocinando tão bem como os adultos. Ao contrário do que vulgarmente se acredita, eles também têm plena consciência de que são mortais. E, tal como os adultos, “os adolescentes costumam mesmo fazer uma avaliação exagerada do risco”, acrescenta Laurence.
Então, se os adolescentes raciocinam tão bem como os adultos e reconhecem o risco com igual eficiência, porque correm mais riscos? Não é por não compreenderem os perigos que os adolescentes correm mais riscos, mas sim porque fazem uma ponderação diferente entre riscos e benefícios (ver tabela, página 15): nas situações em que o risco pode proporcionar algo desejado, valorizam o benefício mais do que os adultos.

Quando os adolescentes fazem o percurso sozinhos, correm riscos aproximadamente idênticos aos dos adultos.

Laurence Steinberg utiliza um jogo de vídeo para exprimir esta tese. O jogador tenta atravessar a cidade no mínimo tempo possível. Ao longo do percurso passa por semáforos. Tal como na vida real, a luz dos semáforos por vezes muda de verde para amarelo quando nos aproximamos, obrigando a uma decisão rápida. Poupa-se tempo e ganham-se mais pontos ao passar antes de a luz ficar vermelha. Mas se o jogador tentar passar e não conseguir, perde mais tempo do que se tivesse parado. Assim, o jogo recompensa a tomada de alguns riscos, mas castiga o risco excessivo.
Quando os adolescentes fazem o percurso sozinhos, correm riscos aproximadamente idênticos aos dos adultos. Porém, se for acrescentado algum factor da predilecção dos jovens, a situação altera-se. Neste caso, o investigador acrescentou amigos: quando trazia os amigos do jovem para assistir, ele corria o dobro dos riscos, tentando passar a correr por semáforos que antes respeitara. Em comparação, os adultos não alteravam a sua condução com um amigo a assistir.
Para Laurence Steinberg, este comportamento demonstra com clareza que a tomada de riscos não está associada a uma capacidade de raciocínio inferior, mas a uma maior importância atribuída ao benefício. “Eles não se expuseram mais só porque, de repente, passaram a dar menos importância ao risco”, explica. “Fizeram-no porque deram mais importância à recompensa.”
Investigadores como Laurence Steinberg e B. J. Casey acreditam que a ponderação arriscada do custo-benefício foi escolhida porque, ao longo do curso da evolução humana, a disposição para correr riscos durante este período da vida proporcionava vantagens competitivas. O sucesso implica frequentemente sair de casa dos pais e procurar situações menos seguras. “Quanto mais se procura a novidade e mais riscos se corre, maior é o sucesso”, acrescenta Abigail Baird.

TEENAGERS GRELHA 3

Os adultos podem ser orientadores, treinadores e incentivadores. Mas têm de saber o momento de se retirar para deixarem o adolescente fazer o seu trabalho, diz a neurocientista B. J. Casey.

TEENAGERS GRELHA 4


Como sugere o jogo de condução, os adolescentes reagem positivamente às recompensas sociais. Quer a fisiologia quer a teoria da evolução apresentam explicações para esta tendência. Em termos fisiológicos, a adolescência desencadeia no cérebro um pico de sensibilidade à dopamina, um neurotransmissor envolvido no circuito de recompensa, contribuindo para os padrões de aprendizagem e a tomada de decisões. Isto explica a rapidez de aprendizagem dos adolescentes e a sua extraordinária receptividade à recompensa e também a sua intensa, por vezes melodramática, reacção ao sucesso e à derrota.
O cérebro dos adolescentes encontra-se, também, particularmente sensível à acção neuromoduladora da oxitocina, uma hormona que torna as ligações sociais mais compensadoras. Existe uma forte sobreposição entre as redes e a dinâmica neuronais geralmente associadas à recompensa e às interacções sociais. Quando as primeiras são activadas, as segundas também o são e vice-versa. Se forem activadas durante a adolescência, é como acender uma fogueira.

Os adolescentes gravitam em torno dos seus iguais por outra razão: nasceram num mundo construído pelos pais, mas viverão a maior parte da vida e prosperarão (ou não) num mundo dirigido pelos seus iguais.

Isto ajuda a compreender outra característica que marca a adolescência. Os adolescentes preferem a companhia das pessoas da sua idade, mas essa atracção pelos iguais da mesma idade limita-se a exprimir, no domínio social, a atracção geral dos adolescentes pela novidade: os jovens proporcionam aos jovens mais novidade do que a velha família que bem conhecem.
No entanto, os adolescentes gravitam em torno dos seus iguais por outra razão: nasceram num mundo construído pelos pais, mas viverão a maior parte da vida e prosperarão (ou não) num mundo dirigido pelos seus iguais. Saber, compreender e construir relações com eles repercute-se de maneira decisiva sobre o sucesso. Os ratos ou os macacos socialmente empenhados, por exemplo, costumam conseguir os melhores territórios de nidificação, as maiores quantidades de alimentos e de água, mais aliados e mais relações sexuais com parceiros melhores e fisicamente mais aptos. E nenhuma outra espécie é mais articulada e profundamente social do que os seres humanos.
Esta característica eminentemente humana transforma as relações entre iguais no espectáculo principal. Alguns estudos baseados em imagiologia cerebral, de facto, indicam que o cérebro reage à exclusão dos pares da mesma maneira que reage às ameaças à saúde física ou ao fornecimento de alimentos. A nível neuronal, interpretamos a rejeição social como uma ameaça à existência. O reconhecimento desta hipótese pode tornar mais fácil compreender o ar trágico de um jovem de 15 anos que não foi convidado para uma festa.


 

TEENAGERS 10

A vaga de desenvolvimento que transforma o ser humano parece ser uma adaptação exclusiva da nossa espécie e só está terminada por volta dos 25 anos.

Excitação, novidade, risco, companhia dos iguais. Estas características definidoras da adolescência tornam-nos mais adaptáveis como indivíduos e como espécie. É sem dúvida por isso que estas características parecem manifestar-se em quase todas as culturas humanas, modernas ou tribais. Os antropólogos descobriram que praticamente todas as culturas do mundo reconhecem a adolescência como um período singular, durante o qual os adolescentes preferem a novidade, as coisas excitantes e os seus iguais. Este reconhecimento quase universal contradiz o conceito segundo o qual se trata de uma invenção cultural e não de uma etapa genética da vida.
A cultura não pode inventar a adolescência. A singularidade deste período emerge da genética e de processos de desenvolvimento 
seleccionados ao longo de milhares de gerações, por desempenharem um papel de maior relevo durante este importante período de transição: gerar uma criatura idealmente capacitada para abandonar um lar seguro e passar a movimentar-se em território desconhecido.

A cultura não pode inventar a adolescência. A singularidade deste período emerge da genética e de processos de desenvolvimento 
seleccionados ao longo de milhares de gerações.

A saída de casa dos pais é a tarefa mais difícil que enfrentam os humanos e também a mais decisiva para uma espécie que tem demonstrado aptidão para se adaptar a novos ambientes com grandes desafios. Em termos científicos, os adolescentes podem ser uma dor de cabeça. Mas serão os seres humanos mais completa e decisivamente adaptáveis que existem. Sem eles, a humanidade poderia não ter sido capaz de se disseminar tão rapidamente por todo o planeta.  

Esta ideia da adolescência adaptável, embora correcta, pode ser difícil de aceitar, sobretudo para os pais que lidam com os adolescentes nos seus momentos mais difíceis, confrontadores ou assustadores. As exigências da selecção natural podem ser fatais e os momentos mais desleixados de um adolescente podem produzir consequências trágicas. As drogas, a bebida, a condução e o crime provocam mortes. O meu filho vive sem carro, na universidade. No entanto, alguns colegas de liceu morreram em aventuras na estrada.
Como é evidente, os pais também tropeçam, ao tentarem percorrer a fronteira pouco nítida que existe entre ajudar e atrapalhar os filhos que se adaptam à vida adulta. E contudo podem ajudá-los. Podem afastar alguns dos piores perigos e guiá-los de forma a reagirem de maneira adequada aos restantes. Há estudos comprovativos de que quando os pais comunicam bem com os filhos e os orientam com mão leve mas firme, mantendo-se ligados mas permitindo a independência, os filhos costumam ter melhores resultados na vida. Os adolescentes querem aprender essencialmente, mas não exclusivamente, com os seus amigos. A certo nível e em certas alturas, o adolescente reconhece que o progenitor pode proporcionar-lhe lições de sabedoria, um conhecimento valorizado por provir das lições aprendidas pelo próprio progenitor ao tentar perceber como o mundo funciona.

TEENAGERS 9

No rancho nos arredores de Austin onde ele e o pai planeavam uma caçada, Spencer O’Loughlin observa outros caçadores a limpar um veado. Os adolescentes podem preferir saídas com os seus pares, mas as interacções estruturadas com os pais e outros adultos são decisivas. Spencer regressou de mãos vazias, após quatro dias de espera com arco e flecha numa minúscula tenda, onde o mínimo movimento bastava para espantar a caça. Para ele, a viagem foi um exercício de paciência. Os psicólogos poderiam chamar-lhe rito de passagem.

Entretanto, os pais podem inspirar-se numa das características distintivas do cérebro adolescente, a peça-chave para compreender o seu lado desajeitado e a sua adaptabilidade. Refiro-me à prolongada plasticidade das regiões frontais de desenvolvimento tardio, à medida que vão amadurecendo. Como já anteriormente se observou, estas regiões são as últimas a criar e instalar a camada gorda de mielina que acelera a transmissão. À primeira vista, isto parece um aspecto negativo: se precisamos dessas regiões para desempenhar a complexa tarefa de entrar no mundo, então por que razão não funcionam em plena velocidade quando os desafios são mais sérios?

Pode parecer um pouco louco que não sejamos mais sensatos numa fase precoce da nossa vida. Mas se ficássemos mais espertos mais cedo, acabaríamos por ficar mais estúpidos.

No entanto, a velocidade aparece à custa da flexibilidade. Ao mesmo tempo que a bainha de mielina aumenta a largura de banda do axónio, ela também reduz o crescimento de novas ramificações a partir do axónio. O horizonte temporal em que a experiência consegue aperfeiçoar melhor essas ligações é altamente específico de cada região do cérebro. Assim, as áreas cerebrais responsáveis pela linguagem adquirem a sua protecção isoladora mais intensamente nos 13 primeiros anos, enquanto a criança aprende a sua língua. O isolamento completo consolida essas aquisições, mas torna as aquisições posteriores mais difíceis de concretizar.
O mesmo se passa com a mielinização da região anterior do cérebro perto dos 20 anos. Esta finalização retardada aumenta a flexibilidade, no momento preciso em que nos confrontamos com o mundo em que viveremos na idade adulta e nos preparamos para entrar nele.
Finalizada por volta dos 25 anos,  esta vaga de desenvolvimento parece ser uma adaptação exclusiva dos seres humanos. E talvez seja aquela que tem consequências mais importantes para nós. Pode parecer um pouco louco que não sejamos mais sensatos numa fase precoce da nossa vida. Mas se ficássemos mais espertos mais cedo, acabaríamos por ficar mais estúpidos. 

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