A natureza é mesmo um bom remédio. A ciência explica porquê.

Baixar a tensão arterial e melhorar a saúde mental e cognitiva são apenas alguns dos benefícios documentados de passar tempo em espaços “verdes” e “azuis”. Damos-lhe conta de uma série de estudos que sublinham estes ganhos.

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LUCAS FOGLIA

Em Singapura, cascadas verdejantes desdobram-se num hotel de luxo, tranquilizando os hóspedes que se encontram na piscina do terraço e as pessoas que se deslocam na rua lá em baixo.


 

Os médicos não costumam prescrever tempo na natureza aos seus pacientes, mas talvez devessem fazê-lo. Um corpo de investigação robusto mostra que estar em espaços verdes – como parques, bosques, florestas, montanhas e afins – é benéfico para o bem-estar físico e mental das pessoas. As vantagens de passar tempo junto ao mar, lagos e rios são menos conhecidas.
Um relatório intitulado Green and Blue Spaces and Mental Health, publicado pela Organização Mundial da Saúde, mostra que passar tempo na natureza – incluindo em áreas urbanas e periurbanas – melhora o humor, a disposição e a saúde mental. O estudo demonstra que a exposição a florestas, parques, jardins ou orlas costeiras pode até mitigar o impacto psicológico das alterações climáticas, promover a actividade física e criar oportunidades para interacção social em locais “onde pode relaxar e deixar o stress do dia a dia para trás durante algum tempo”.
“Pensar na nossa relação com a natureza recorda-nos que estamos integrados no mundo natural enquanto espécie”, diz Patricia Hasbach, psicoterapeuta e ecopsicóloga em Eugene, no estado de Oregon. “Ir até espaços azuis ou verdes é uma espécie de regresso a casa. Promove uma sensação de pertencermos a algo maior do que nós próprios.”

A natureza é benéfica para a nossa saúde psicológica e física de várias formas. Um estudo recente que examinou mais de 16.000 pessoas em 18 países descobriu que os níveis de bem-estar dos residentes de zonas mais verdes ou costeiras eram, em geral, superiores. Além disso, as pessoas que visitavam frequentemente espaços verdes ou azuis (junto à costa ou no interior) para fins recreativos sentiam-se melhor e sofriam menos distúrbios psicológicos.

Outro estudo publicado no ano passado na Occupational & Environmental Medicine concluiu que as pessoas que visitam espaços verdes cinco ou mais vezes por semana ingerem significativamente menos medicamentos psicotrópicos, anti-hipertensivos e anti-asmáticos do que aquelas que passam menos tempo na natureza. Os benefícios corpo-mente não se ficam por aqui.

Elementos restauradores

Embora os investigadores não tenham feito uma comparação item a item entre as vantagens dos espaços verdes e azuis, há muitas provas dos benefícios proporcionados por ambos para a saúde mental. Os estudos demonstraram, por exemplo, que a prática japonesa de “imersão florestal” (ou Shinrin-yoku) — que envolve caminhar lentamente numa floresta e inalar as substâncias fragrantes denominadas fitoncidas que são libertadas pelas árvores – reduz a tensão arterial, alivia os sintomas depressivos e melhora a saúde mental.
Uma análise publicada no ano passado, baseada num estudo realizado com pessoas de 18 países, concluiu que os adultos com melhor saúde mental têm mais probabilidades de ter passado brincado em zonas aquáticas costeiras ou interiores na infância. Um estudo prévio demonstrou que as pessoas que vivem em casas com vista para espaços azuis na cidade neozelandesa de Wellington tinham níveis inferiores de distúrbios psicológicos do que aquelas cujas casas têm vista para espaços verdes.

Há muitos possíveis mecanismos biológicos por detrás das vantagens da exposição a espaços verdes ou azuis. Uma das explicações é que estes benefícios derivam, provavelmente, daquilo que se chama teoria do restauro da atenção, segundo a qual a exposição à natureza ajuda a aliviar a fadiga mental e melhora a capacidade de foco, explica Marc Berman, neurocientista ambiental e professor associado de psicologia na Universidade de Chicago. “Os seres humanos têm dois tipos de atenção – a atenção direccionada, que é aquela que usamos no trabalho e que nos cansa ou se esgota, e a atenção involuntária, que é automaticamente captada por coisas interessantes no ambiente e não nos cansa”.

Um engenheiro liga-se à natureza na Lost Coast, na Califórnia.
LUCAS FOGLIA

Um engenheiro liga-se à natureza na Lost Coast, na Califórnia.

Efectivamente, um estudo publicado numa edição de 2019 da revista Frontiers in Psychology concluiu que, depois de darem um passeio de 30 minutos num ambiente natural – com campos relvados, terras agrícolas e zonas florestadas – as crianças demonstravam um padrão mais rápido e estável de resposta a uma série de testes relacionados com a atenção do que depois de passearem numa zona urbana.

Além de captar a nossa atenção involuntária, passar tempo na natureza pode suscitar aquilo a que se chama“fascínio suave”, uma experiência inofensiva e agradável que é interessante por não exigir a nossa atenção plena. Desta forma “a nossa mente pode vaguear e podemos pensar noutras coisas em simultâneo”, diz Berman. “Quando as pessoas estão na natureza tendem a pensar em assuntos relacionados com a espiritualidade e a sua jornada pessoal”.

Outra explicação para o efeito quase medicinal da natureza na mente e no corpo é a chamada hipótese da biofilia, segundo a qual os seres humanos têm um desejo inato de se ligarem à natureza e a outras formas de vida.

Os cheiros, as vistas e os sons acalmam os nossos sentidos

Num ambiente natural, não são apenas as cores azul e verde que nos acalmam. As formas dos objectos também podem ser reconfortantes, observa Berman. Por exemplo, estudos descobriram que observar fractais naturais — padrões complexos que se repetem a várias escalas de tamanho na natureza (fetos, flores, montanhas ou ondas do mar) – induzem mais actividade das ondas alfa no cérebro (medidas através de electroencefalogramas, EEG), que está associada a um estado de espírito relaxado, mas desperto, e à atenção internalizada.
“Quando estamos na natureza, costumamos funcionar a um ritmo diferente”, diz Hasbach, autor de Grounded: A Guided Journal to Help You Reconnect with the Power of Nature—and Yourself. “Isto permite o estímulo sensorial, que nos deixa absorver aquilo que vemos, ouvimos, cheiramos e sentimos. Ajuda-nos a estar inteiramente presentes.”
Além disso, “nós associamos vistas e sons naturais a recursos essenciais – e existe uma base evolutiva para tal”, diz Amber Pearson, geógrafa da saúde e professora associada do departamento de saúde pública da Michigan State University. “O silêncio das aves costuma ser um sinal de perigo. Talvez o detectemos.”
O outro lado é igualmente verdade: as pessoas encontram conforto em muitos sons da natureza. Uma meta-análise publicada em 2021, que contou com a participação de Pearson, examinou os benefícios para a saúde da exposição a sons naturais – aves e animais, vento e água – em parques nacionais e concluiu que estavam associados a redução do stress e da irritabilidade, diminuição das dores e melhorias do humor. 
Outro aspecto de passar tempo na natureza digno de nota é aquilo que não está lá: trânsito e ruído. Uma análise de estudos publicada no ano passado na Environmental Research examinou o papel desempenhado pela exposição a espaços verdes na prevenção da ansiedade e depressão em adolescentes e jovens adultos com idades compreendidas entre os 14 e os 24 anos. A conclusão mais surpreendente? A ausência de ruído e as qualidades restauradoras dos espaços verdes promovem a atenção plena e interrompem a ruminação mental nociva. Por sua vez, a exposição reduz o risco de distúrbios de ansiedade e depressão.

Caminhantes fazem uma pausa numa zona florestal na Coreia.
LUCAS FOGLIA

Caminhantes fazem uma pausa numa zona florestal na Coreia. Inalar compostos naturais como limoneno e pineno enquanto se passeia numa floresta pode diminuir a fadiga mental, induzir o relaxamento e melhorar o desempenho cognitivo e o humor.

A outro nível sensorial, os investigadores descobriram que inalar compostos orgânicos voláteis como limoneno e pineno numa floresta pode diminuir a fadiga mental, induzir o relaxamento e melhorar o desempenho cognitivo e o humor.

Quando passam tempo ao ar livre, as pessoas costumam estar a caminhar, correr, andar de bicicleta ou a fazer jardinagem. Nestes casos, a combinação do movimento e do cenário natural pode duplicar os benefícios. Por exemplo, um estudo publicado numa edição de 2020 da revista Environmental Research concluiu que se os trabalhadores de um escritório caminhassem 20 minutos por dia num espaço azul sentiriam melhorias significativas do seu humor e sensação de bem-estar – em comparação com caminhar durante o mesmo tempo num espaço urbano.

Prescrição: natureza

Embora os estudos recomendem passar pelo menos duas horas por semana em espaços verdes e azuis, “até poucos minutos passados no exterior podem melhorar o humor e a função cognitiva”, diz Eileen Anderson, antropóloga médica e psicológica e professora de bioética na Case Western Reserve University School of Medicine, em Cleveland. “Lembre-se de que aproveitar as pequenas oportunidades e absorver tempos mais longos, sempre que possível, pode ajudar a sua mente, corpo e espírito.”
Para este fim, é boa ideia fazer “pausas na natureza” para organizar as ideias e refrescar a mente – caminhando até um parque ou jardim durante a hora de almoço, por exemplo. Enquanto lá estiver, concentre-se nas vistas, sons, aromas e outras experiências sensoriais. “Se conseguir encontrar ambientes que não exijam a sua atenção directa e que estimulem a sua atenção indirecta, poderá restaurar a sua atenção e energia mental”, diz Berman. “Quanto mais pausas fizer na natureza, melhor”.
Se não puder sair, poderá ser bom para si trazer elementos de espaços verdes e azuis para a sua casa, colhendo benefícios semelhantes, diz Hasbach. Pode incorporar plantas verdes e fractais (um vaso de flores ou uma tigela com pinhas, por exemplo) e trazer aromas do mundo natural para dentro de casa com flores fragrantes ou óleos essenciais como lavanda, rosa, limão ou alecrim.
Se viver perto de uma zona florestada, de um parque, jardim ou do mar, experimente abrir as janelas e deixar entrar os sons repousantes do canto das aves ou das ondas. Se não, pode utilizar uma app para trazer os sons das aves, da chuva, do oceano ou de outros elementos da natureza para sua casa, sugerem os peritos.
“Aquilo que é especialmente promissor é a força dinâmica do impacto do ar livre nos nossos cérebros”, diz Anderson. “Mesmo que a natureza não tenha sido parte da vida de uma pessoa, nunca é demasiado tarde para acrescentar experiências naturais à sua vida para melhorar o seu bem-estar", conclui.