Uma doença causada por parasitas unicelulares do género Plasmodium, a malária causa mais de 230 milhões de casos e 600 mil mortes por ano. Destas, uma esmagadora parte ocorre em África – em 2021, 95% de casos e 96% de óbitos dos números globais aconteceram neste continente, de acordo com o World Malaria Report 2022 da Organização Mundial de Saúde.
Um recente estudo publicado na Nature, levado a cabo por profissionais de diversas instituições de vários países africanos, revela agora que há pelo menos uma de duas espécies de Anopheles – mais comummente vectores da malária em África, nomeadamente A. gambiae e A. funestus – que resiste ao insecticida chlorfenapyr, um dos principais compostos usado para combater a malária.
Em países onde a malária foi eliminada, como é o caso de Portugal, mantêm-se populações consideráveis de mosquitos capazes de transmitir esta doença noutras geografias.
Foram recolhidas, no âmbito desta investigação, amostras de indivíduos destas espécies em zonas agrícolas de cinco países africanos, tendo sido expostas ao chlorfenapyr.
Embora todos os indivíduos de A. funestus tenham sucumbido, o mesmo não se verificou com todos os indivíduos de A. gambiae, tendo indivíduos provenientes de populações na República Democrática do Congo, no Gana e nos Camarões sobrevivido a esta exposição. Esta tendência indicia alguma predisposição desta espécie para desenvolver resistência ao insecticida. A que se deve, afinal, esta tenacidade? Pode estar ligada, de acordo com os investigadores, ao uso de pesticidas agrícolas, uma vez que as amostras que demonstraram resistência eram oriundas de áreas de grande actividade neste sector.
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A BOA NOTÍCIA É QUE...
Confirmou-se também neste estudo que as populações de mosquitos com resistência a piretróides (compostos químicos sintéticos comuns em insecticidas domésticos e repelentes para insectos) apresentam maior susceptibilidade ao chlorfenapyr.
Em consequência destes resultados, um dos autores do estudo, Charles Wondji, pede que haja mudanças nos processos de monitorização da malária nestes países, a fim de incluírem monitorização de parâmetros fenotípicos e genómicos. Nesse sentido, e a fim de desenvolverem uma estratégia conjunta, vários grupos de trabalho têm-se reunido no continente desde Março, aproveitando o know-how obtido durante a pandemia de COVID-19. No entanto, tanto o genoma dos Plasmodium como dos Anopheles é bem maior do que o do SARS-CoV-2, o que significa que as ferramentas desenvolvidas para este último dificilmente serão directamente transponíveis para esta situação.
AS SOLUÇÕES JÁ EXISTENTES
No que diz respeito à malária, a infecção em humanos é na maior parte dos casos causada por fêmeas de mosquitos do género Anopheles, amplamente distribuído.
Além de medicamentos preventivos que são por vezes difíceis de adquirir, transportar e administrar em grande escala para países com infra-estruturas incipientes, como é o caso de alguns dos mais afectados, é muito comum o uso de redes anti-mosquito, com as que contém o insecticida chlorfenapyr a terem consistentemente melhores resultados que as restantes.
Este composto foi introduzido em resposta a alertas vindos de 60 países que detectaram resistência aos insecticidas anteriormente usados, da classe dos piretróides. Este composto age impedindo a produção de energia ao nível das mitocôndrias, acabando por levar à morte dos mosquitos.
Em países onde a malária foi eliminada, como é o caso de Portugal, mantêm-se populações consideráveis de mosquitos capazes de transmitir esta doença noutras geografias.